Jô: CPMI avança em Minas

 

“A presença em Minas Gerais da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do Congresso Nacional que investiga a violência contra a mulher no País apresentou três resultados positivos: a assinatura do protocolo de criação da terceira Vara Especializada de Crimes Contra a Mulher; a garantia de apuração do assassinato de Adenilse Cristina dos Santos, 19, – torturada, violentada e morta com requintes de crueldade, no início do mês na cidade de Carmópolis de Minas –, e a efetiva mobilização dos mineiros para mudar não só o perfil de violência, quanto a fragilidade do aparato institucional na proteção às mulheres”. A avaliação é da presidente do colegiado, deputada federal Jô Moraes (PCdoB/MG) logo após a Audiência Pública da CPMI na Assembléia Legislativa, no final da tarde de sexta-feira (27).

Além de técnicos vieram a Minas para a audiência, a relatora da CPMI, senadora Ana Rita (PT/ES) a vice-presidente, deputada federal Keiko Ota (PSB/SP), e os deputados federais Eduardo Azeredo (PSDB/MG) e Marina Sant’Anna (PT/GO).

Sem acordo

Outra questão que chamou a atenção foi a confissão do presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Cláudio Costa, quando da visita dos integrantes da CPMI.

Ele revelou que inicialmente era favorável a acordos entre mulher agredida e o agressor visando colocar um ponto final no embate. “Fui para casa e fiquei refletindo: depois de um tapa não existe possibilidade de mediação. Violência não é matéria de conciliação. Acordo é o fraco sendo engolido pelo forte. Não dá, refiz minha posição”. Além de se posicionar como parceiro efetivo da CPMI, Cláudio Costa propôs um mutirão de juízes e servidores para dar vazão aos 39 mil 962 processos hoje represados nas duas varas especializadas da Lei Maria da Penha.

O desembargador também defendeu a parceria entre grandes corporações, o empresariado, voltada a proporcionar novas fontes de recursos para a execução das penas. Para ele, o Estado Brasileiro sozinho não suporta arcar com esses gastos. O juiz é um funcionário caro porque vem acompanhado de pessoal especializado. Considero que o Conselho Nacional de Justiça ainda não entendeu isso. Cria despesas, mas não leva em conta nosso orçamento, declarou.
Cláudio Costa se disse surpreendido com o volume de processos nas varas especializadas de crimes contra a mulher, argumento usado para criar a terceira Vara.

Denúncia

Durante o encontro no Tribunal de Justiça, a senadora Ana Rita revelou a existência de denúncia e questionou se havia pressão dos juízes das varas da Lei Maria da Penha para conciliação entre as partes, além de mistura de crença religiosa com o trabalho no âmbito do Direito, da parte desses magistrados. Presentes, tanto o juiz titular da 13ª Vara Criminal, Relbert Chinaidre Verly; quanto o juiz titular da 14ª Vara Criminal, Nilseu Buarque de Lima, negaram as alegações. “Temos, diariamente, de 100 a 120 medidas protetivas em cada Vara. Além disso, 80% das vítimas declaram querer suspender a ação, não tocá-las mais. Mas não existe essa hipótese, nem de a vítima ser orientada a desistir. Basta ver o número de processos. É absurdo porque não há coação. Não há acordo”, reagiu o juiz Relbert Verly.
Inadequado

Os integrantes da CPMI também visitaram a Delegacia de Mulheres, quando constataram a inadequação das dependências e as carências de pessoal e infraestrutura. Uma mulher que horas antes fora agredida pelo companheiro, era atendida na entrada da unidade por dois policiais militares. Trata-se da primeira etapa do atendimento. Seu agressor estava preso numa cela improvisada, num espaço minúsculo, originalmente destinado ao fosso do elevador que nunca foi instalado no local. De onde estava detido, ele podia assistir o trabalho dos servidores e até ler documentos sobre as mesas próximas.

A chefe de Divisão de Proteção à Mulher, Idosos e Deficiente Físico, delegada Margaret Rocha disse que outro problema enfrentado, no âmbito das carências e inadequações é a falta de médico legista no período noturno. Os dois que são plantão na Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher só trabalham durante o dia, à noite o atendimento se dá no Bairro Gameleira.

Na Delegacia são feitos em torno de 50 a 60 atendimentos/dia e, de janeiro até abril, 1.800 inquéritos foram relatados e encaminhados à Justiça. Outras 3 mil medidas protetivas foram recebidas. A presidente da CPMI, deputada Jô Moraes alertou para a enorme carência de delegacias de mulheres, de plantões policiais e de varas especializadas. “Precisamos de equipamentos com material e pessoal capacitado e em número suficiente para atender a demanda. Outro grande desafio a ser superado é recriar a Delegacia de Crimes Sexuais”, disse.

A Defensoria Pública e as Varas Especializadas da Lei Maria da Penha também foram visitas pelos membros da CPMI.
Audiência

Com o plenário lotado, a Audiência Pública da CPMI em Minas também foi destacado pelas presidente e relatora do colegiado, respectivamente J Moraes e Ana Rita, em razão da representatividade e do interesse suscitado. Além de representantes dos três poderes, participaram das discussões, encaminhamentos e apresentação de relatório, membros de entidades da sociedade civil organizada. ^

Apresentaram relatórios sobre a estrutura disponibilizada, o secretário de Estado de Desenvolvimento Social, Cássio Soares, a desembargadora do Tribunal de Justiça, helopisa de Ruiz combat; a titular da Defensoria Pública do Estado, Andrea Abrita Garzon Tonet; a promotora da Procuradoria Geral de Justiça, Nívea Mônica Silva; o secretário adjunto de Defesa social, procurador de Justiça Denílson Feitoza; a coordenadora de Políticas para as Mulheres, Eliana Piola; os deputados estaduais Dalmo Ribeiro(PSDB); Luzia Ferreira (PPS); Maria Tereza Lara (PT); a presidente do Consórcio das Gerais, Márcia Gomes e a presidente do Movimento Popular da Mulher, Maria Izabel Siqueira.

Durante a audiência, a relatora senadora Ana Júlia cobrou respostas dos representantes das instituições às indagações feitas relativas à estrutura, pessoal e funcionamento das unidades e equipamentos destinados ao amparo e proteção das mulheres. Além de acrescentar outros questionamento, ela deu prazo de uma semana para que as questões sejam respondidas.

Os integrantes da CPMI também ouviram Maria das Dores Santos, a mãe da jovem brutalmente torturada e assassinada em Carmópolis de Minas, Adenilse Cristina dos Santos. Ela foi amarrada a uma árvore sofreu sevícias e teve a língua cortada, entre outras violências. A mãe, analfabeta, pobre e negra só conseguia chorar e pedir para não esquecerem sua filha. “Era uma menina boa, estudava e não estava envolvida com nada errado. Ninguém sabe porque fizeram isso com ela. Ninguém dá informação, a polícia não fala nada, parece que não estão investigando”, disse.

A deputada Jô Moraes cobrou explicações das autoridades e o secretário Cássio Soares disse que, embora não pudesse adiantar informações públicas, o caso estava prestes a ser encerrado, pois já sabem quem é o responsável pela barbárie. Ele chegou a mostrar papeis relativos à investigação à relatora da CPMI, Ana Júlia, para comprovar a afirmação.

Na Audiência, a presidente do MPM, Maria Izabel Siqueira apresentou um levantamento de ciclos de crimes de estupros e assassinatos em série de mulheres aos longo dos últimos 40 anos em Minas Gerais. Muitos deles, ainda sem solução.
 

Graça Borges

Foto: Willian Dias/ALMG
Deputado Eduardo Azeredo; senadora Ana Rita; deputada Jô Moraes; deputados estaduais Dalmo Ribeiro; Luzia Ferreira e Maria Tereza Lara; deputadas federais Keiko Ota e Marina Sant’Anna e desembargadora Heloíza de Ruiz Combat