Publicado 14/01/2013 09:50 | Editado 04/03/2020 16:28
Um leitor me sugeriu que analisasse “os obstáculos encontrados no rumo de soluções eficientes para uma melhor convivência com a seca”. O assunto está na ordem do dia. A seca atinge mais uma vez o Nordeste. Se não de forma tão dramática como antes, de todo modo, tem desorganizado a vida e o meio de vida de muita gente. No Ceará, mais de um milhão de trabalhadores ocupados na agropecuária sofre com a falta d’água, chuva e pasto. E, se tal permanecer em 2013 – benza-o Deus que não –, mais gente, no campo e na cidade, será afetada.
Que impede a eliminação do problema? A pergunta já foi respondida por muitos e respeitados cientistas, mas não me acanho em esboçar o que penso sobre o assunto. Para tanto, recorro, primeiro, a Diatahy Menezes: “A minha posição epistemológica sobre qualquer conhecimento do real implica o fato de que sua construção é histórica, portanto, crítica e processual. Não existem fatos, como afirmava Floro Bartolomeu, na peça de Dias Gomes, mas só versões”.
Pois bem, na minha versão, para as oligarquias agrárias e toda uma rede de interesses, era bom negócio culpar a seca pelo atraso econômico e pela desgraça social, pois, além de se beneficiarem das verbas públicas, tinham a garantia de que, voltando a chover, tudo mudaria para ficar como antes. Não se pode, porém, negar que algumas secas, segundo a conhecida passagem de Capistrano de Abreu, foram “uma grande rasoira, que em poucos meses desbaratava as maiores fortunas”. Mas isso não impedia que, do tormento, brotassem novas fortunas.
Mesmo os estudos da Ifocs, hoje Dnocs, sem a conexão com o socioeconômico – mais adiante, Guimarães Duque levantou a questão, mas… foi muito pouco ouvido –, encaravam a seca como fenômeno físico. Era bastante consertar a natureza, com as obras de engenharia, e pronto. Consertar a natureza, sim, como também a economia e a sociedade. E é aqui que reside o X da questão.
A engenharia é capaz de vencer os desafios técnicos, e o Ceará tem demonstrado isso. Contudo, parte expressiva da economia é de baixa produtividade e de alta vulnerabilidade ao clima. Além disso, os governos alegam que se torna oneroso suprir d’água uma população espalhada pelo território; só não explicam por que existem várias comunidades às margens do São Francisco e de grandes açudes sem sistema regular de abastecimento.
Arrojado Lisboa, o primeiro inspetor-geral do Dnocs, então IOCS, afirmava em 1913 que “o mais grave de todos os problemas” era o educacional. Mas a riqueza (terra e água) em poucas mãos e, daí, o poder oligárquico, que se opunha à educação da massa rural, era tão ou mais grave ainda.
A grande barreira, enfim, é de cunho político, embora hoje atenuada, visto que os governos buscam superá-la. No entanto, o fazem em ritmo lento, no compasso da submissa pressão que os atingidos pela seca exercem sobre eles, esse mesmo povo, aliás, que, há séculos, disperso, perambula pelo semiárido nordestino. E só ele pode acelerar o processo. Essa é que é a verdade. Fora disso, é propaganda enganosa.
*Cláudio Ferreira Lima é economista
Fonte: O Povo