Combate às drogas 

Autoridades policiais, do Judiciário e de saúde pública de São Paulo iniciaram esta semana nova ofensiva de combate ao uso de drogas químicas, na tentativa de conter a epidemia de crack. Isso, um ano após a fracassada invasão da chamada cracolândia, que apenas dispersou os usuários por outros pontos da capital.

Agora, a ação repressiva prevê a internação compulsória, mesmo sem a concordância das famílias. O método, condenado pela Organização das Nações Unidas (ONU), embora aceito quando a pessoa internada “corre risco de morte”, gera críticas de estudiosos do assunto, que questionam sua eficácia.

Pesquisas por amostragem, em poder do Ministério da Justiça, dizem que a internação compulsória tem resultados positivos (a abstinência) em no máximo 6% dos casos. Já o tratamento espontâneo consegue esse efeito em até 30% dos internados.

De todo jeito, a nova experiência paulista, assim como os das áreas de proteção no Rio de Janeiro, pode até atenuar o problema aqui e acolá, mas nem trisca nas questões centrais das drogas. A começar pela legislação em vigor no Brasil, que é arcaica e rígida em aspectos banais e perniciosa em pontos viscerais.

As cadeias estão cheias de supostos traficantes de maconha, já os meios de comunicação estão repletos de propaganda de bebidas alcoólicas, com a advertência de que fazem mal à saúde. Marchamos contra a maré. Muitos países, como os vizinhos Argentina e Uruguai, liberaram a maconha, mas são duros com outras drogas.

Tampouco adianta internar alguns usuários de cocaína e crack se o grande tráfico dessas drogas seguir comendo solto nos aeroportos, rodovias e portos brasileiros. O crack não é um problema apenas das capitais ou grandes cidades. Está espalhado pelos mais remotos rincões do país, inclusive na zona rural.

Também é enorme sua presença em áreas de grande concentração de trabalhadores, como obras de construção civil e áreas portuárias. Nos portos, estudo do Governo Federal, que pretendia saber as razões do alto índice de acidentes de trabalho entre estivadores, revelou que a maioria deles trabalha chapada, ou seja, sob forte efeito de drogas.

E verdade, esses trabalhadores já não carregam mais sacos nas costas. Sua atividade principal é na locomoção e empilhamento de contêineres, entre os quais alguns repletos de drogas, que passam com documentação falsa e vistas grossas. Assim como nos navios só de passageiros, os cruzeiros, que sequer são vistoriados.

É incalculável o valor de uma tonelada de cocaína. Para se ter uma ideia, vale uma comparação com o caso de um bagrinho que acaba de cumprir dois anos de prisão, no Distrito Federal, por tráfico internacional. A meu pedido, ele fez umas contas que são assustadoras — ou encantadoras, dependendo do ponto de vista.

O pequeno traficante compra um quilo de cocaína na Bolívia por US$ 3.000,00 e o vende na Europa ou Oriente Médio, por exemplo, por US$ 40.000,00. Com esse dinheiro, o cara adquire 500 comprimidos de ecstasy, que é vendido aqui no país a R$ 8,00 cada. Ou seja, tira R$ 400.000,00 num quilo de coca.

Uma pessoa que se dispuser a servir de mula, como são chamadas aquelas que se dispõem a viajar apenas para levar droga, ganha em média US$ 2.000,00 líquidos para uma ida à Europa ou Oriente Médio. Essas são as mais fáceis presas da polícia mundo afora. O grande traficante, no entanto, nem aparece nas quebradas perigosas.

É claro que há enormes diferenças no tratamento dado ao tema em cada região do mundo. Entre os países árabes, por exemplo, há a rigidez da Síria, que até pouco mais de uma década atrás tinha pena de morte aos traficantes, ou da Tunísia, logo ao lado, onde a droga é atração para o turista europeu e o tráfico corre solto.

O controle do consumo é, no fim das contas, uma forma de mostrar serviço. Já pegar o grande traficante envolve operações complexas, que dependem muito mais dos serviços de informações do que de batidas policiais. E carecem, também, de enorme apoio político.

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