Vacina anti-Covid: só 16% das cidades brasileiras têm cobertura ideal

Cidades com a vacinação muito mais lenta que a média nacional são justamente aquelas que têm instalações de saúde pública mais precárias e, por isso, tendem ao descontrole do número de infecções e óbitos com mais facilidade

Arte: Valor Econômico

A desigualdade social e regional na vacinação contra a Covid-19 deve provocar o prolongamento da pandemia do novo coronavírus no Brasil, mesmo com números de casos e mortes rebaixados. A opinião é de pesquisadores ligados à Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), que divulgaram nota técnica publicada nesta semana.

Segundo eles, apenas 16% dos municípios brasileiros – 890 das 5,56 mil cidades do País – vacinaram mais de 80% de suas populações com duas doses, a taxa de cobertura considerada segura para evitar novos surtos da doença. Um dos responsáveis pela nota técnica, o epidemiologista da Fiocruz Diego Xavier alerta que se o baixo percentual de cidades com cobertura vacinal adequada não for observado e corrigido em 2022, haverá surtos pontuais de Covid nas cidades onde a vacinação não engrenou.

A situação seria similar à de cidades europeias cujos países tinham taxas promissoras no agregado nacional, mas assistiram a um recrudescimento da pandemia. No Brasil, diz Xavier, as cidades com a vacinação muito mais lenta que a média nacional são justamente aquelas que têm instalações de saúde pública mais precárias e, por isso, tendem ao descontrole do número de infecções e óbitos com mais facilidade.

Em 8 de dezembro, data de coleta dos dados em que o estudo se baseia, o Brasil tinha 64,7% da sua população imunizada com duas doses. Hoje, cerca de 76% da população está nessa situação, informa a Fiocruz. A cobertura, porém, está longe de ser equânime nos municípios do país.

Ao escrutinarem os dados da vacinação no nível das cidades, os pesquisadores da Fiocruz assinalaram a diferença de desempenho das regiões – com Norte e Nordeste muito atrasados na comparação com o restante do país. Além disso, há disparidade entre as cidades de um mesmo estado.

Municípios com índice de desenvolvimento humano (IDH) considerado “muito alto”, ou seja, superior a 0,71 em escala de zero a 1,0, têm em média taxa de cobertura 20 pontos percentuais superior àquela verificada em municípios com IDH “baixo” – inferior a 0,59.

Com relação à primeira dose, o grupo de municípios com IDH muito alto apresentava percentual de imunização de cerca de 80%. Já no grupo de municípios com IDH baixo, o índice caia para 60%. Para a segunda dose, quando o esquema vacinal é completado, o grupo de municípios com IDH muito alto tinha cerca de 70% da população imunizada, enquanto no grupo de municípios com IDH baixo essa taxa era de apenas 50%. Os técnicos analisaram, ainda, o andamento da dose de reforço: cobertura de 10% para o grupo de cidades com o IDH mais alto e 2,5% para aquelas com IDH baixo.

O estudo se baseia em dados coletados da plataforma MonitoraCovid-19, criada ainda no início da crise pelos pesquisadores do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz) extraído do sistema do Ministério da Saúde. Nas comparações entre municípios, os técnicos da Fiocruz consideram as taxas de cobertura das diferentes doses, o IDH e o tamanho das populações. Para chegar aos percentuais, eles dividiram o país em quatro bandas de IDH – baixo, médio, alto e muito alto – com o mesmo número de cidades.

Xavier observa que o componente longevidade – considerado para o cálculo do IDH, ao lado de escolaridade e renda – pode ter inflacionado o percentual de população coberta em alguns municípios com índices mais altos, sobretudo no início da vacinação. Isso porque os idosos são um grupo proporcionalmente maior nessas cidades e eram prioridade na fila. Mas, passado quase um ano do início da campanha, diz ele, o padrão de desigualdade se repetiu em outras faixas etárias, o que dá força as conclusões do estudo.

Os pesquisadores também desagregaram os resultados por região. Enquanto o Sul e Sudeste apresentam elevado percentual da população imunizada, áreas da região Norte, Nordeste e Centro-Oeste ainda apresentam “bolsões com baixa imunização” para a Covid. Para quaisquer das doses, as diferenças podem ser consideradas alarmantes. No Sul, que lidera o processo sob qualquer ângulo, 30% dos municípios já tem mais de 80% da população vacinada com duas doses, enquanto só 1,1% das cidades do Norte e 2,7% das cidades do Nordeste têm esse desempenho.

Com informações do Valor Econômico