Reajustes abaixo da inflação crescem, mas 68% das negociações têm ganho real
Dados do Dieese mostram um possível novo patamar para as negociações coletivas, com mais de 20% dos acordos abaixo do INPC em maio. Sociólogo Luís Ribeiro explica o atual cenário
Publicado 26/06/2025 17:05 | Editado 26/06/2025 18:14

Levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostra que a proporção de reajustes salariais abaixo da inflação subiu para 20,1% em maio. Na data-base de abril, o percentual de negociações coletivas com reajustes inferiores à inflação, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), era de 18,2%.
O quadro trazido pelo boletim “De Olho nas Negociações – nº 57 – Junho de 2025 / Resultados de maio de 2025”, indica que, desde setembro de 2022, os reajustes abaixo do INPC não alcançavam a marca dos 20%.
No total foram computados 815 acordos registrados em maio e 314 em abril. No caso dos reajustes iguais à variação da inflação, o percentual passou de 20,1% para 12% entre abril e maio.

De acordo com o sociólogo Luís Ribeiro, responsável pelo boletim do Dieese e pelo acompanhamento das negociações, houve maiores dificuldades para ganhos reais e reajustes iguais à inflação ao longo do último ano, mas não há uma tendência de arrocho salarial.
Segundo Ribeiro, os aumentos inflacionários dificultaram a negociação por reajustes: “Existem alguns fatores que contribuem para isso. A gente tem visto uma escalada da inflação, ela vinha crescendo nos últimos meses, mas, aparentemente, houve um certo controle, e, talvez, estejamos numa tendência de queda novamente, pelo menos o que a gente observou no último mês”, aponta.
Leia mais: Estudo do Dieese mapeia os maiores centros industriais do Brasil
O técnico do Dieese observa que há incertezas econômicas, nacionais e internacionais, que contribuem para este cenário. “Isso pode estar influindo nas mesas de negociação no sentido de que o lado patronal possa estar endurecendo mais as negociações dadas as circunstâncias”, diz.
Ele também destaca que o aumento da taxa de juros tem influência nas negociações: “Também é possível destacar a questão da taxa de juros. O Banco Central está investindo bastante no aumento da taxa de juros para controle inflacionário. Não sei se essa seria a resposta mais adequada para conter a inflação. Supondo que seja uma inflação de demanda, e é preciso conter essa demanda via aumento da taxa de juros, eu acho que não é uma análise mais adequada. Mas, independentemente disso, a taxa de juros também influencia as projeções de crescimento da economia e, por consequência, influencia as negociações coletivas”, lembra.
Ainda conforme o documento, “o desempenho das negociações de maio pode estar refletindo o aumento da inflação. Nessa data-base, o valor do reajuste necessário para recomposição dos salários foi de 5,32%, o maior no período considerado.” Para junho, “o reajuste necessário será menor, de 5,20%, igual ao observado em abril.”

Ganho real e expectativa para o 2º semestre
Já os acordos que apresentaram ganhos reais, ou seja, acima da inflação, também aumentaram em percentual de 61,8% para 67,9% entre as datas-bases de abril e maio.
Ribeiro explica que é normal que as taxas oscilem e que existem dois fatores intrínsecos nessa variação: a composição das categorias que negociam e fatores conjunturais, que afetam em médio e longo prazo.
Leia mais: 85% das negociações salariais em 2024 garantiram ganhos acima da inflação
Assim, avalia que talvez estejamos entrando em um novo patamar, diferente do que foi visto em meses anteriores ou, pelo menos, desde o começo de 2023 até o final do primeiro trimestre de 2025, em que foram computados, no geral, ganhos em 80% das categorias das amostras e perdas sempre abaixo dos 10%. Apesar disso, pondera que é muito cedo para saber como será esse comportamento.

“É sabido que as negociações de segundo semestre costumam ser mais fortes, porque são negociações de categorias de maior poder de mobilização e com maior tradição de sindicalização. Então, é um cenário que ainda está incerto, mas talvez estejamos em um novo patamar. Esse segundo trimestre de 2025 parece estar consolidado como inferior em relação aos trimestres anteriores em termos de ganhos reais para as categorias”, aponta.
Variação dos reajustes
O boletim também mostra que a variação real média dos reajustes salariais em maio ficou em 0,78%, muito próximo dos valores de abril (0,73%) e março (0,74%). Ao analisar as 164 negociações que ficaram abaixo do INPC, a variação foi de -0,54% (valor médio das perdas reais). Já as 553 negociações com reajustes acima da inflação, a variação média ficou em 1,31% (valor médio dos ganhos reais).

ConformeLuís Ribeiro, estes dados mostram que o ganho das categorias está dentro do patamar médio observado nas negociações do Brasil.
“Há categorias que mantêm esse desempenho positivo, que é padrão das negociações brasileiras, mas há um crescente número de categorias que têm obtido perdas. É por isso que o ganho médio, considerando tanto aquelas categorias que têm reajustes acima do INPC quanto as que têm reajustes abaixo, tem caído, porque aumentou o percentual de categorias que não conseguem sequer repor a inflação” alerta.