21 anos e uma roseira vermelha

“Escrevo como um exercício de presença, como se a cada instante estivesse mais próximo da despedida, racionalmente é essa a composição do tempo”

Imagem: banco de imagens google

Mais uma carta. Saiu de moda escrever. Continuo escrevendo. A última ditadura militar no país durou 21 anos e as cartas circularam clandestinamente para registrar a história e alimentar as esperanças. Manifestar sempre fez parte das ações humanas, assim como o amor.

Ainda era criança, pouco entendia sobre o que escrevia, mas eu escrevia para você, como se quisesse dizer:  estou aqui e quando precisar me coloque nas suas mãos. 

Escrevia estando a poucos minutos de distância, já que nossas distâncias nunca foram além dos minutos. 

Escrevo como um exercício de presença, como se a cada instante estivesse mais próximo da despedida, racionalmente é essa a composição do tempo. 

Guarda as cartas, elas não  são amontoados de palavras, estão impregnadas de mim e do mundo. Leia-me,  encontrará versos, jardins e o desejo do pão e da terra dividida. Estarei estampado com algumas marcas, lágrimas e imperfeições, afinal, escrevo para fotografar a nudes da vida.

Um dia você viajou e escreveu em dos seus cadernos que queria que estivesse contigo na praia, nunca estivemos juntos  diante do mar, mas nunca estivemos separados. 

Aonde vou te levo, mesmo você não estando presente. Reside aqui na minha cabeça a sua presença.

Qual sentido faz continuar escrevendo e repetindo quase as mesmas coisas? A gente repete eu te amo, ao longo dos anos e não se cansa, talvez isso seja para reafirmar o que não cabe só nos sentimentos. 

Esse ano, além do bolo cor derosa e da carta que já é tradição, receberá uma roseira vermelha. Terá que arranjar tempo, cuidar exige dedicação. 

Há 21 anos tento escrever caminhos de dedicação. Filho, continuemos dedicados. 

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