A BH possível, a dos nossos sonhos: amiga das mulheres

O eixo dos debates de uma eleiçãomunicipal é a cidade que temos, a que queremos e a que sonhamos. Ou seja, temosde colocar na mesa sonhos mais focados nas questões cruciais da cidade, aquiloque emperra a cidadania. Nem mais, nem menos.

Portanto, o meu repúdio aofundamentalismo religioso, expresso nas palavras do secretário geral da CNBB:"Aborto também deve ser tema de eleição municipal", uma tentativaespúria de desvirtuar o sentido das eleições municipais, servindo na bandeja oque não pertence a nenhuma religião: os corpos e as vidas das mulheres. Quererimpor tal pauta tem nome: é desprezo por gente concreta, "nascida",aviltamento da cidadania. "Xô, tirem seus rosários dos nossosovários!".

É hora de revisitar a cidade quetemos, indagar por que "ela é assim e não assada", pois cidade não éapenas um território, mas o conjunto de bens públicos disponíveis -equipamentos educacionais, como berçários, creches e escolas de diferentesníveis; serviços de saúde, de transporte e de mobilidade de modo geral; desegurança; e de lazer. Isto é, um conjunto de bens materiais e imateriais quetraduzem direitos de cidadania.

O que temos é suficiente para todos? Éde boa qualidade? Neles gente recebe tratamento que não degrada a dignidadehumana? Atende às necessidades imediatas e não desconsidera as necessidadesestratégicas de gênero? É uma cidade inclusiva ou excludente para as mulheres,enquanto usuárias e elaboradoras de projetos urbanos? Tais questões podemparecer supérfluas, já que historicamente as cidades não são pensadas para asmulheres, como se todas estivessem encerradas nos gineceus das casas dos ricosda Grécia antiga e andassem de palanquim.

São aspectos de uma velha questão, aexclusão das mulheres das cidades, e conformam o debate contemporâneo sobre umanova filosofia para as cidades, de planificação e planejamento territorial, emque o recorte e a dimensão de gênero sejam indispensáveis para garantir odireito das mulheres à cidade a partir do horizonte que "pensar eremodelar a cidade através do olhar das mulheres aporta um novo equilíbrio euma outra dimensão". Isso consta na "Carta europeia das mulheres nacidade – Rumo ao direito à cidade para as mulheres", um conjunto deproposições sobre a cidade, a cidadania e o gênero, "uma nova malha de leiturasda cidade", que explicita que o cotidiano de mulheres e o de homenspossuem necessidades diferentes às quais cabe ao poder público municipalresponder.

Para o urbanista norte-americano MikeDavis, autor de "Planeta Favela", "é preciso priorizar a abundânciapública, não a riqueza privada. Para ele, a abundância pública é representadapor grandes parques urbanos, museus gratuitos, bibliotecas e inúmeraspossibilidades de interação humana", logo, "a prioridade é construircomplexos culturais, educacionais e esportivos que funcionem como centroscívicos para bairros e distritos suburbanos, mesmo que para isso seja precisosuspender os investimentos no centro da cidade, e as maravilhas do centro devemse tornar mais acessíveis para todos, por meio de passagens mais baratas eentradas gratuitas".

Na hora de escolher o novo prefeito deBelo Horizonte, é importante lembrar que a cidade precisa de um cuidador comolhos voltados para a cidadania – mais para quem precisa mais! – e comprometidocom a abundância pública vincada por uma dimensão de gênero capaz de fazer deBH uma cidade amiga das mulheres.

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