Assentamentos ou Colonização?
Desde a posse em março do governo mais direitista que Israel teve na sua breve história de 61 anos, o governo de Barak Obama vem insistindo em que os assentamentos judaicos sejam “congelados” (sic). Isso parece que passou a ser ponto de honra para os EUA. No entanto, sinais contraditórios têm sido emitidos sobre esse tema, que tratamos esta semana.
Publicado 09/09/2009 21:47
(Cisjordânia Colonizada por Israel)
Congelar ou não congelar, eis a questão?
Os jornais emitiram sinais amplamente contraditórios sobre a questão da expansão dos assentamentos, das colônias judaicas que existem na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental. Ora dão conta de que o governo de Benjamin Netanyahu autorizou mais de 70 mil moradias de judeus em terras palestinas, ora dizem que esse mesmo governo decidiu “congelar’ por nove meses os assentamentos.
Aqui gostaria de esclarecer algumas questões iniciais. A palavra assentamento, em nosso país, é usada pelos trabalhadores rurais sem terra, que lutam pela reforma agrária há mais de 25 anos. Associamos no Brasil esse termo a algo bonito, honrado, de luta, que faz justiça, que reparte terras e concede títulos para que não os tenha. Pelo menos entre nós de esquerda, assentar, após regularizar e dividir a terra tem boa conotação.
No caso da Palestina, as coisas mudam de figura completamente. Não vou me deter no aspecto histórico da questão. Mas, é unânime e todos sabem, que a terra que se chama “Israel” hoje sempre foi Palestina, de forma milenar. Dentro de um projeto colonial, apoiado pelo imperialismo de turno no final do século XIX e início do XX, a liderança nacional judaica arquitetou um plano de tomar essas terras para lá construir um “lar nacional judaico”, que contou com ampla simpatia e apoio dos ingleses, que ocuparam a região por quase 30 anos.
Os primeiro judeus sionistas que chegaram à Palestina, foram comprando algumas terras, montaram seus Kibutzin e foram ampliando sua presença em terras árabes e palestinas. Quando a situação ficou insustentável, criou, por partilha da Palestina, o Estado de Israel. A partir daí, em 1948, o resto é história. Os palestinos não conseguiram criar o seu estado, pois tiveram todas as suas terras ocupadas, ora pelos próprios países árabes ora pelo exército de Israel.
Depois disso, em 1967, Israel resolve ocupar toda a Palestina, expulsando os exércitos árabes e ampliando seu domínio na região. Ocuparam parte da Síria, do Líbano e toda a península do Sinai. Aproveitaram esse momento, para iniciar a colonização em terras que a ONU não havia destinado, em sua fatídica votação de 29/11/1947, aos judeus.
Votou-se de junho de 1967 até hoje dezenas de resoluções contra os judeus e seu estado sionista. De nada adianta. Que força tem uma resolução da ONU contra um estado bandido, como se diz, que tem por detrás de si nada menos do que a maior potência militar da terra? Israel nunca cumpriu nenhuma dessas resoluções. Algumas tomadas com o voto dos EUA. Foram poucas vezes que os EUA votaram contra o seu protegido na ONU. Nem mesmo nessas Israel se dispõe a cumpri-las.
Assim, entre 1967 e 1979, quando o Sinai foi devolvido e até 1983 quando os acordos de Paz de Oslo foram assinados, os sionistas nunca ficaram parados. Aproveitaram para construir dezenas de colônias judaicas na Cisjordânia, em Golã e em Gaza (estas foram desmanteladas, pois eram apenas sete, em 2004 por Sharon). A Cisjordânia hoje mais parece um arquipélago com centenas de pontos no mapa ocupados por colônias judaicas como disse em artigo recente o filósofo Slavoj Zizek.
Nunca saberemos quantos judeus e suas colônias existem na Cisjordânia. Até porque os dados oficiais estatísticos são feitos apenas e tão somente pelo governo de Israel. Sabe-se que são por volta de 300 mil em 200 colônias ditas “legais” (existem ainda as chamadas colônias “ilegais”, feitas á revelia do governo e não aprovadas pelo gabinete). Tais colônias agora são ampliadas para a região de Jerusalém Oriental, que sempre foi árabe e palestina. Famílias palestinas moradoras há décadas nessa região, semanalmente, na calada da noite ou mesmo de dia, vêm sendo retiradas. Há um silêncio de cumplicidade na imprensa ocidental que pouco fala sobre isso.
Um projeto colonial
Não tenho mais dúvida do projeto em curso. A eleição de Netanyahu e suas alianças no campo da extrema direita, com apoio da social democracia dos Trabalhistas é prova disso. O ministério da Habitação ficou com o ultra ortodoxo SHAS, partido que defende a continuidade da colonização e dos assentamentos.
Está em curso na Palestina, no que restou dela, na Cisjordânia, a judaização de toda a região onde moram os palestinos milenarmente. Uns vão sendo expulsos por motivos fúteis, processos “legais”. Outros perdem suas casa que são demolidas sob acusação de quem abrigam “terroristas”. O muro da vergonha, condenado pelos tribunais internacionais, segue sendo construído. De altura de seis metros, separa terras palestinas das tais colônias judaicas. E o que é pior: do lado judaico eles são pintados com imagens de campos verdades e pradarias como se do outro lado da paisagem, onde moram milhares de palestinos, nada existisse, apenas terras desabitadas. É um sinal claro que Israel manda para os judeus que assenta na Palestina que seu projeto é ocupar a região como um todo.
Mas, não só as forças sionistas apoiam a colonização. Partidos de direita e governos reacionários em todo o mundo possuem ampla simpatia com os judeus sionistas. A diplomacia americana, até outro dia, pouco falava e fazia para impedir que os assentamentos continuassem. Resta-nos agora saber se a retórica do presidente Obama resultará em eficaz ação prática e concreta. Resta-nos saber – o que mais importa hoje – é se Obama deterá forças políticas mesmo entre seu Partido, para fazer valer a sua posição de congelar e até de desmantelar alguns desses assentamentos judaicos.
Mesmo entre os judeus que são considerados moradores “ilegais”, estes tem forte argumento para seguirem resistindo e tentando morar nas terras palestinas. Eles argumentam que a sua atitude em nada difere do governo de Israel que tenta instalar assentamentos “legais”, mas que são também ilegais, pelo menos do ponto de vista do direito internacional.
Impasse na paz
Temos insistido que as condições para um acordo global de paz ainda não estão dadas. Por mais que Obama venha falando, tentando com sua fraseologia progressista (para os padrões americanos), não reune ainda forças para fazer valer as suas propostas. A sociedade israelense esta hoje em um campo extremamente conservadora. Podemos dizer que se moveram para a extrema direita. Lembro-me de pesquisas realizadas em janeiro passado, quando do auge dos bombardeios e massacres perpetrados por Israel à Faixa de Gaza, que indicavam que 90% da população de Israel apoiava esses massacres! Apenas 10% os condenavam. Como poderíamos imaginar que nas eleições de fevereiro pudessem vencer partidos mais progressistas que defendem a paz com os palestinos? Impossível. Deu no que deu. O governo mais direitista da história de Israel.
Nesse contexto, a paz é praticamente impossível. Netanyahu andou falando em acordo de paz. Essa palavra ele não usava desde a sua posse. Falou em acordos com os palestinos. No entanto, a correlação de força que vivemos hoje no mundo talvez ainda não seja suficientemente melhor para que possamos fazer dobrar esse governo par que busque a paz. Obama não reune também maioria folgada que lhes garanta força suficiente para dobrar o governo fascista de Israel. Assim, resta-nos um impasse.
Quem mais perde com isso, claro, é o povo palestino. Eles vão vendo esvair a chance de paz, vão perdendo a cada dia mais as suas terras milenares. Vão vivendo as piores condições a quem um povo foi seguidamente submetido de humilhações, privações, massacres como nunca se viu na história recente. E o mais deprimente de tudo isso é que esse sofrimento lhes é imposto por outro povo que viveu o maior drama na história, com o holocausto, que são os judeus. Mas, apenas de tudo e de todos, os palestinos vencerão.