China: desenvolvimento e senso comum (2)

Em primeiro lugar é de ordem primária a historicização da problemática que envolve os “mitos” e as “falsas verdades” e “falsas polêmicas” em torno dos IED`s e do comércio internacional. Desde Adam Smith até Marx e Engels (A Ideologia Alemã, cap. 1, parte

O capital estrangeiro


 


 


Num primeiro momento as manufaturas alavancam uma dita “pré-divisão social do trabalho” inerente a uma única cidade, para o espraiamento da dependência produtiva e de intercambio, primeiro entre cidades e mais tarde (no momento em que as manufaturas ganham ímpeto na Itália e em Flandres, logo traduzindo-se em um maior intercâmbio entre as nações. Ora, estavam dadas as condições objetivas para o a substituição do feudalismo pelo capitalismo.


 


 


Retornando, se abstrairmos tal processo histórico de quase 500 anos de existência, fica-se mais fácil a compreensão segundo o qual pressupõe-se a impossibilidade – na atualidade – qualquer país, seja capitalista ou socialista, que possa dispensar não somente o comércio internacional em si, mas os próprios IED`s inerentes ao processo de acumulação e reprodução de capital. O primeiro motivo mais cabal tem ligação direta com a independência em matéria de política econômica interna com uma política planificada de comércio com o exterior que objetive o acúmulo de divisas estrangeiras.


 


 


Acerca especificamente da China que no geral envolve a própria demonstração do socialismo como algo superior ao capitalismo, tal demonstração não é possível de se dar no âmbito da vontade humana e sim na demonstração de superioridade econômica, o que envolve a internalização de tecnologias somente disponíveis nos países capitalistas centrais. Daí a política chinesa e a importância dedicada, tanto ao comércio internacional quanto aos IED`s.



 


 


As condições criadas pela era Mao


 


 


 


Disseminou a crença onde a atração pelo capital estrangeiro pela China reside em um imenso exército industrial de reserva altamente disciplina e barata. Bem, em primeiro lugar, seria bom repetir o que já havia dito em oportunidade anterior:


 


 


“(…) acreditar que isso é uma determinação nodal é, no mínimo, para não dizer outra coisa, expressão de uma terrível falta de visão de conjunto. Afinal, se todo o problema é a disponibilidade de uma mão-de-obra tendente a ser barata pela existência de um imenso exército industrial de reserva, acho que os capitalistas do mundo deveriam instalar suas fábricas em países como a Botswana, Guiné-Bissau, Djibouti e até na Nigéria e não na China. Aliás, fora o fator trabalho, os custos de transporte de um país como a Nigéria (dada a proximidade geográfica) para centros de consumo como os EUA e a Europa seriam muito mais baratos do que se partindo da China” (1).


 


 


Que existem inúmeros “exércitos industriais de reserva” pelo mundo afora, isso não é novidade. Uma análise criteriosa, séria e desenvolta de ideologismos de qualquer tipo deve buscar compreender qual a razão/motivação que levou a China a se transformar num verdadeiro “imã” de IDE’s.


 


 


Bom, em primeiro lugar é metodologicamente importante dissertar que uma das grandes realizações da era Mao Tsétung na China foi a elevação substancial da qualidade do trabalhador comum chinês em matéria de educação, saúde e capacidade de gerenciamento da produção. Em comparação com um país das mesmas dimensões e cujo processo de independência nacional deu-se no mesmo período histórico da revolução chinesa, a Índia, é muito claro que a China já em 1978 situava-se bem a frente da Índia em qualquer comparação que envolva taxas como o de analfabetismo, expectativa de vida, mortalidade infantil etc. Esse é um lado da história.


 


 


Retomando, o melhoramento sensível das condições de vida na China entre 1949 e 1978 criou condições objetivas a uma expansão rápida das condições de oferta e demanda à mobilização produtiva de seu potencial humano dentro do próprio país. Assim, chega-se a uma primeira e retumbante conclusão. Tais condições expostas não foram criadas pelo capital estrangeiro, mas sim por um processo de combinação dos tentos da Revolução Industrial inglesa com as próprias formas rurais de industrialização. Além disso, são síntese – também – das tradições revolucionárias nascidas das milenares revoltas camponesas como meio de derrubar governos corruptos e decrépitos, sendo que a última grande rebelião camponesa levou o PCCh de Mao Tsétung ao poder em 1949 (2).


 


 


O capital estrangeiro tem sua importância, mas chegou tarde


 


 


Eis uma verdade um tanto quanto inconveniente aos “intelectuais” e “especialistas” de plantão: o capital estrangeiro chegou tarde no processo iniciado em 1978. Dois fatos corroboram esta constatação:


 


 


1) Entre 1978 e 1984, a contribuição do consumo para o crescimento da renda nacional (passou de 65% em 1979 para 70% em 1984) excedeu em muito a contribuição dos demais componentes da demanda (8). Em outras palavras, o alargamento do mercado interno, anterior à admissão de empresas estrangeiras no país foi fator primário ao arranque chinês. O crescimento da variável consumo no conjunto da renda nacional é conseqüência direta do fato de as primeiras reformas terem sido focadas na liberalização do comércio de excedentes da agricultura.


 


 


2) Conclui-se então, que do ponto de vista econômico, a mercantilização dos excedentes foi a responsável pelo surgimento de novos padrões de consumo no campo. Camponeses que em 1978 ainda cortavam o cabelo da mesma forma — pareciam ter cortado com a mesma máquina —, passaram a consumir máquinas de costura, relógios, rádio, bicicleta, vídeo-cassete e ventiladores, originando assim uma explosão de consumo e indução à produção industrial massiva entre os anos de 1984 e 1990 (9).


 


 


3) Interessante notar outro dado relativo ao início das reformas econômicas, mais detidamente entre os anos de 1978 e 1990: até 1990 81% das fontes de divisas estrangeiras pela China foram captadas por exportações, sendo que do total exportado, 72% foram produtos processados nas chamadas Empresas de Cantão e Povoado (ECP`s). E tais empresas são de tipo coletivas e municipais, 100% de capital chinês (10)


 


 


4) Uma análise sucinta do processo histórico em si, no caso a China, leva a tranqüila conclusão segundo a qual o capital estrangeiro aproveitou a oportunidade aberta com o crescimento chinês. O capital estrangeiro não iniciou, muito menos liderou o processo de expansão econômica na China;


 


 


5) Não é de se menosprezar a importância dos IDE’s como fator impulsionador de uma política exportadora encetada na busca de acúmulo de divisas estrangeiras, viabilizando assim uma política de juros internos atraente ao crédito: o fator comércio exterior na composição do PIB chinês passou de 22% em 1992 para a altíssima taxa de 47% em 2006;


 


 


6) Porém é de se discutir a centralidade deste tipo de investimento no atual caso chinês. Segundo demonstram os dados concretos, até 1991 eles permaneceram abaixo de I% do PIB, sendo que até o mesmo ano todo acúmulo de IED`s estavam voltados para o mercado externo e concentrados – de forma elevada – na província sulina de Guangdong; em 1995 os IDE’s passaram a corresponder a 5% do PIB (11);


 


 


7) Base de comparação que leva em consideração o papel dos IED`s à economia chinesa pode ser registrada a partir de relação entre os IED`s e sua participação na Formação Bruta de Capital Intensivo (FBCI): entre 2003 e 2005 tal relação saltou de 8,6% para 9%.



 


Notas:


 


(1) JABBOUR, E.: “A ’superexploração do trabalho’ na China”. In, Portal Vermelho. 28/11/2007. Disponível em: http://www.vermelho.org.br/base.asp?texto=28954


(2) ARRIGHI, G.: Adam Smith em Pequim – origens e fundamentos do século XXI. Boitempo. São Paulo. 2008, págs. 357-358.


 

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
Autor