Direitos trabalhistas e previdenciários em risco

A revista exame de fevereiro, edição 887, com a chamada “O Congresso quer as reformas”, traz o resultado de uma pesquisa feita com 533 dos 594 parlamentares (513 deputados e 81 senadores) sobre a necessidade das reformas trabalhista, previdenciária e trib

Aparentemente, o Congresso que tomou posse em 1º fevereiro, que realmente é mais liberal do ponto de vista econômico e conservador do ponto de vista social, apoiaria a agenda de reformas do mercado, de um lado para reduzir ou eliminar direitos e de outro, diminuir a carga tributária.


 


Entretanto, quando se detalha o conteúdo das reformas, além da indução das perguntas, ficam evidentes as divergências nas três reformas, em ordem decrescente. A maior discordância é na previdência, seguida da trabalhista e da tributária.


 


A reforma da previdência, pela complexidade e alcance social, é a que registra a maior divergência. Embora 78% considerem a reforma necessária, apenas 32% concordam que o novo modelo alcance os atuais segurados, enquanto 47% entendem que as novas regras devem ser aplicadas aos futuros segurados.


 


Sobre o modelo único e universal , que incluiria a todos, inclusive as situações especiais – mulheres, professores, servidores militares, policiais e trabalhadores rurais – também não há acordo. 47% defendem a continuidade das situações especiais, enquanto apenas 31% desejam a unificação dos critérios para concessão de benefícios.


 


Quanto ao critério de idade, se se mantêm as atuais diferenciações em razão da atividade profissional, ou se cria um critério único de idade, independentemente da atividade, também não há convergência. 44% aprovam a idade mínima e única para todos, enquanto 37% concordam com o atual sistema, que considera a insalubridade e a periculosidade da atividade do trabalhador.


 


Especificamente sobre a reforma trabalhista as perguntas são astuciosas porque apresentam uma suposta neutralidade em relação à perda de direito, quando seu objetivo é exatamente esse. A primeira pergunta é se o parlamentar concorda com a redução da alíquota do FGTS para as micro e pequenas empresas, quando deveria perguntar se ele está de acordo que o empregado / trabalhador dessas empresas recebessem menos FGTS do que o das grandes. Com esse nível de indução, 72% dos entrevistados foram favoráveis e apenas 18% contrários.


 


A segunda indagação, sobre FGTS, deixa evidente o propósito de prejudicar o trabalhador. A pergunta é se o parlamentar concordaria que o FGTS fosse negociado entre empregado e empregador. A pergunta é duplamente cretina. Em primeiro lugar porque não diz que se trata de um direito irrenunciável e segundo porque sequer fala em negociação entre o sindicato de trabalhadores e a empresa, mas diretamente  entre patrão e empregado. Apesar disto, 45% foram contrários à negociação e 44% a favor.


 


A terceira pergunta também propõe negociação direta em substituição à lei. A indagação diz respeito à negociação entre patrões e empregados do tamanho da jornada de trabalho, excetuando-se apenas algumas profissões específicas. Não se trata de redução de jornada, mas da definição da jornada, que poderia passar de oito para 10, 12, 16, o que o operário suportasse. 69% dos parlamentares, talvez não tendo idéia do que efetivamente estavam respondendo, disseram sim, enquanto apenas 24% foram contrários.


 


A última pergunta sobre reforma trabalhista, igualmente perversa, trata da redução do prazo prescricional, ou seja, do prazo que o empregado demitido tem para reclamar direitos não quitados. Atualmente, o trabalhador pode reclamar direitos lesados até dois anos após o término da relação de trabalho. Como ninguém é louco para reclamar o acessório (direito lesado) no curso da relação de trabalho, porque  perde o principal, o emprego, esse prazo é indispensável para que o empregado possa buscar judicialmente os direitos não pagos. Mesmo assim, 47% dos congressistas disseram sim e 43%, não.


 


Até na reforma tributária, há pontos que dizem respeito às relações de trabalho e previdência. Trata-se da pergunta sobre a redução da alíquota do INSS, destinada a custear os benefícios previdenciários. 70% dos parlamentares são favoráveis e apenas 21% contrários. Não se trata da substituição da folha pelo faturamento ou receita, mas da redução pura e simples dessa fonte da previdência.


 


Sobre o novo desenho do sistema tributário, com a mudança de nome e unificação de trabalho, o nível de consenso foi maior. 78% dos parlamentares disseram aprovar a substituição das 27 leis de ICMS em apenas uma federal e a unificação das atuais 44 alíquotas em cinco, além disto, 80% também manifestaram concordância com a criação do imposto sobre valor agregado (IVA), que incorporaria o IPI, o ICMS, o PIS e COFINS e ISS.


 


A iniciativa da pesquisa demonstra o interesse no tema e o resultado indica o risco efetivo de retrocesso nos direitos trabalhistas e previdenciários. Há consenso sobre a necessidade da reforma, mas nenhum acordo em relação ao seu conteúdo. Enquanto os trabalhadores desejam recuperar direitos suprimidos e incorporar outros, como a redução da jornada sem redução do salário, os agentes do mercado defendem uma reforma para reduzir ainda mais os direitos dos trabalhadores, com a conseqüente transferência para eles da já pequena parcela que o salário possui na renda nacional. Fiquemos atentos.

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