Em nome da felicidade

Não se pode falar em democracia onde os negros têm a cidadania aviltada e até negada. Diante desse quadro, o direito à felicidade é um sonho.

O 20 e o 25 de novembro são duas datas simbólicas. Ambas refletem lutas pela cidadania plena e concentram perspectivas de mudanças de padrões culturais arcaicos, machistas e racistas rumo à equidade racial/étnica e de gênero, valores essenciais para a justiça social e maior democratização da sociedade.


 


Em suma, são datas que interrogam com veemência padrões culturais patriarcais sexistas e racistas e gritam para o mundo que urge superá-los em nome da felicidade. O 20 de novembro marca o assassinato de Zumbi dos Palmares (1695). Há mais de três décadas, o movimento negro firmou-a como momento de celebração e de denúncia.


 


 


Em quase todo o país, são realizados eventos em memória de Zumbi e de divulgação da luta contra o racismo. Desde 2003, Zumbi dos Palmares integra o panteon dos heróis nacionais e o 20 de novembro foi oficializado pelo Congresso como o Dia Nacional da Consciência Negra. Em 2006, a data é feriado em cerca 300 cidades em 11 Estados.


 


O 25 de novembro é Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher desde 1981, como parte das estratégias de visibilização da violência contra a mulher e de luta por políticas públicas capazes de enfrentá-la em seus diferentes aspectos.


 


Em 2006, com a Lei Maria da Penha a política nacional de atenção integral às mulheres sobreviventes de violência, o Brasil entrou no seleto grupo dos países que compreendem ser a violência contra a mulher uma violação dos direitos humanos e que é dever do Estado prover práticas de prevenção, de contenção e de punição da violência doméstica e sexual, além de garantir cuidados médicos, psicológicos e sociais às mulheres envolvidas em situação de violência.


 


Com a lei, o Brasil cumpre um preceito da Constituição de 1988, o artigo 226, § 8º, que diz que é dever do Estado coibir a violência na família. Gracias, presidente Lula!


 


Uma lei que é a política nacional de combate à violência contra a mulher é valiosa, todavia é preciso esforço redobrado para que ela e a integralidade da política nela contida se tornem realidade no cotidiano das mulheres.


 


A impunidade de práticas criminosas é um estímulo à eternização delas. Cabe ao conjunto da sociedade uma postura vigilante. Além de conhecimento da lei, é óbvio.


 


Uma lei como a Maria da Penha, que ao lado da definição da repressão à violência pela punibilidade possui um potencial pedagógico de não-violência a ser explorado criativamente em diferentes espaços da sociedade, traz também um foco inovador para a sensibilização do Judiciário, cujo padrão cultural conservador, e até machista, necessita mudar para acolher com solidariedade e agilidade as sobreviventes de violência em suas demandas. A Justiça, historicamente, não tem dado a devida atenção a essas demandas, seja pela morosidade ou pela ínfima sensibilidade de alguns magistrados.


 


A Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE, divulgada em 17/11, que verificou o desemprego nas seis maiores regiões metropolitanas do país, constatou que ele atinge de modo mais perverso a população negra.


 


O estarrecedor é que negros e pardos auferem como rendimento médio a metade do que ganham os brancos.


 


A taxa de desemprego para as negras era de 10% em 1992 e passou para 15,8% em 2005 ? crescimento de 58%, conforme relatório da OIT, avaliativo da evolução do emprego no mercado de trabalho e os resultados obtidos com as políticas públicas de conscientização da sociedade e de inclusão social, publicado em 17/11.


 


O combate efetivo ao racismo no Brasil só ocorrerá quando amplos setores da sociedade, por compreensão política, introjetarem que não se pode falar que há democracia onde metade da população, os negros, tem a cidadania aviltada e até negada em todos os setores da vida. Diante de quadro tão dantesco, o direito à felicidade ainda é um sonho.

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