Maria Teresa: Malas, fraldas e mamadeiras rumo a São Vicente

Quando recebi o convite, decidi: Eu vou, mesmo sabendo que com criança tudo fica mais complexo. Era domingo. Sol num céu que só São Paulo tem – quando não está debaixo d água – limpo e azul. Com os sorrisos de um infante sem compromisso, fomos nós, malas, fraldas e mamadeiras rumo a São Vicente.

Meu pensamento desceu a serra caminhando em elucubrações pertinentes ao momento: qual o significado de estar ali, as pessoas iriam me reconhecer como parte do processo, o que escrevi representaria os presentes, o que falar se preciso fosse?

Sinceramente, não sei. Voltei e procurei me concentrar no ali, agora. Naqueles jovens, meninos e meninas de bermudas na altura dos joelhos, drads nos cabelos, uma plenária impar e uníssona. Na cadência e no embalo dos bambas, nas rimas e nas batidas do rap: movimento hip-hop.

Entre os presentes gente de peso, alguns forjados nas lutas do movimento social, outros nos embates institucionais, ainda aqueles que formulam as leis e claro muitos da cena hip-hop.

Intimidada em meio à unidade, sim a palavra é essa UNIDADE, compartilhada e compactuada debaixo da tenda quente. Num mundo que carece de transformações “como o rio que desemboca no mar”, avassaladores eles avançam, em nome da liberdade que dá asas e permissão pra quem tem coragem de lutar. É ali o lugar em que as possibilidades vão ganhando forma e os caminhos vão se desenhando com a clareza de quem sabe aonde quer chegar. Conclamados pela voz firme e forte de Aliado G a fazer reverberar nos corações e ouvidos que não puderam estar lá às idéias discutidas e as ações propostas nesses dois dias.

Quando das falas, um parênteses para Célio Turino, Secretário Nacional da Cidadania Cultural do Ministério da Cultura e idealizador dos Pontos de Cultura. Titulo que intimidaria, não fosse à simplicidade do sorriso aberto e franco debaixo do chapéu de panamá. Em rápidos 10 minutos ele falou de cultura, cidadania, valores, identidade e o significado dessa nova forma de intervenção social como o movimento hip-hop, comunidades quilombolas, indígena, carimbó e outras manifestações populares para a construção dos novos conceitos e parâmetros que vem sendo estabelecidos para a cultura brasileira.

Falou da importância das raízes desses movimentos, sobretudo por serem atores que detêm os “saberes e os fazeres” da cultura popular e também porque serão responsáveis por retratar, desenhar, pintar ou escrever uma nova forma de viver a cultura, além da preservação e construção de uma nova “Terra Brasilis”.

O lançamento do Livro Hip-Hop a Lápis – A Literatura do Oprimido, dentro do 3º Encontro Nacional da Nação Hip Hop Brasil, vem dar voz, vez e maior visibilidade a um movimento que cresce e se organiza a cada dia, que se expressa ao mundo e para o mundo, a partir da força de suas peculiaridades, agora, como bem disse Nuno Mendes, fazendo uso do 5º Elemento – a Escrita – como “arma em punho” – Toni C. – apontada na direção de discutir e ocupar os espaços antes silenciados pela falsa impressão de minoria, um livro que diz em alto e bom som “ Mano, se segura, nós viemos e é pra FICAR”.

Obrigado por me permitir fazer parte desse momento.

Maria Teresa Ferreira – uma das autoras do livro Hip-Hop a Lápis – Literatura do Oprimido.

Leia também:
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