Não somos gringos

Minha atuação na vida pública tem me levado a ambientes diversos. Um aspecto que se evidencia de forma gritante, confirmando algo que eu já apontava na minha antiga função de jornalista, é a total ausência de negros em alguns espaços de poder, seja ele econômico ou político, desmascarando a farsa da democracia racial brasileira.

Recentemente, estive em um evento que premiou as maiores empresas e os principais empresários deste país. Como idealizador do fórum de desenvolvimento econômico inclusivo ‘São Paulo Diverso’ e Secretário de Promoção da Igualdade Racial da cidade de São Paulo fui acomodado na mesa das autoridades.

Sentei de frente para o governador Geraldo Alckmin e do Presidente Interino da República, Michel Temer porque a presidenta Dilma estava em Nova York. Nesta mesa também estavam o Ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e, ao meu lado, o presidente do Bradesco, Luís Carlos Trabuco, e o presidente executivo da Editora Três, Caco Alzugaray, além de outros dez ou quinze pesos pesados da economia nacional.

Daquela mesa, eu era o único negro. Em todo o jantar, servido para mais de duzentas pessoas, contei somente mais um negro, o jornalista econômico Rosenildo Gomes Ferreira. Ou seja, após mais de um século da libertação dos escravizados, os espaços de poder econômico neste país continuam como nos tempos da colônia, hegemonicamente brancos.

O que mais me chama atenção é o “pseudo” clima de normalidade que paira sobre esses ambientes. É como se tudo fosse normal, aliás a normalidade só é interrompida pela expressão de espanto, quando abro a boca e começo a conversar e as pessoas percebem que não tenho sotaque inglês, portanto não sou gringo, sou alguém que apenas representa a metade da população deste país.

A democracia se faz com inclusão e com reconhecimento. Por isso, as ações afirmativas e as cotas raciais são tão importantes e necessárias para que em médio e longo prazo alterem a cor e a lógica colonial desses espaços de poder e, por ora, disfarce um pouco mais nossa profunda e vergonhosa desigualdade racial.

 

 
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