O celular na sala de aula

É cada vez mais difícil encontrar algum estudante que não tenha consigo um aparelho celular. Assim como a imensa maioria dos brasileiros (já temos uma quantidade muito maior de celulares do que de pessoas no país), quase todo o aluno carrega no bolso ou na bolsa um desses dispositivos de comunicação.

Além de servir para dar telefonemas, o celular é também uma ferramenta para recebimento e envio de mensagens de texto. É uma máquina fotográfica, com qualidade cada vez maior, além de ser um álbum de fotos, permitindo armazenar centenas de imagens ou publicá-las online. Além disso, também é uma filmadora, que possibilita assistir aos filmes feitos nela ou outros online. É um gravador de áudio para anotações e lembretes de voz, gravação de entrevistas, assim como é também um reprodutor de áudio, permitindo ouvir horas e horas de música. Muitos celulares possuem ainda a capacidade de recepção direta de rádio ou de TV.

Agenda de contatos, com os números telefônicos e e-mails, os endereços das pessoas e outras informações, como foto, data de aniversário etc., o celular é ainda um calendário de compromissos, permitindo configurar avisos para os eventos marcados (reuniões, provas, aniversários) com antecedência de minutos, horas ou dias. Bloco de anotações, planilhas eletrônicas, processador de textos, bancos de dados, mapas de sua cidade ou de qualquer recanto do país ou do planeta, com localização por satélite (GPS) são mais algumas de suas funções.

Navegação e pesquisa na web, tradução de idiomas, acesso, leitura e postagem em redes sociais, comunicação instantânea por texto, voz ou vídeo, além, é claro, de jogos de todos os tipos, paciências, desafios lógicos, destreza e ação, bem como simulações e ambientes interativos de construção de mundos – e mesmo várias aplicações de “realidade aumentada” (apresentando conteúdos em emulação tridimensional, seja a partir de imagens num livro didático ou mesmo nas ruas de uma cidade).

Apesar desta longa enumeração, que poderia ser ainda mais completa, pois há cada vez mais aplicativos específicos disponíveis, boa parte gratuitamente, é de espantar como a escola não esteja usando todas estas possibilidades para usos pedagógicos, preferindo, na maioria dos casos, proibir sua utilização por parte dos estudantes.

Quais os argumentos para impedir seu uso? Que o celular, se utilizado para conversar com terceiros durante a aula, pode ser um distrator é realmente um fato que deve levar à proibição desse uso durante a aula, é claro. Porém, lápis e papel (ou mesmo apenas a imaginação em seu cérebro) também podem propiciar muita distração se o aluno não estiver engajado na aula.

A única forma de ferramentas, dispositivos e toda a atenção cognitiva dos estudantes não serem usadas para distraí-los da aula é haver propostas e estratégias pedagógicas para sua utilização.

Pesquisas recentes apontam que a maioria dos alunos entrevistados leva seus celulares para a sala de aula, e boa parte deles já o utilizou para fazer “cola”. Provavelmente, o mesmo tipo de atividade os alunos usavam pequenos papéis ou até partes do corpo para anotações. Claro que o celular, com toda a sua tecnologia, permite “cola” de modo muito mais eficiente. Como combater esse uso inadequado?

Para as utilizações que distraem, como comunicações no “zap” com terceiros, o professor necessita propor um combinado com os alunos, discutindo com eles usos aceitáveis e regras a serem observadas, pactuadas. Afinal, é principalmente na escola que as pessoas devem ser educadas para a cidadania digital, alicerçada no dispositivo de comunicação que todos carregam e que tantas utilizações inadequadas pode propiciar.

Para a questão da cola, deve-se elaborar provas e outras formas de avaliação para as quais não exista copiar-colar que resolva, permitindo até mesmo a consulta a anotações porventura feitas. Suponhamos que, numa prova de ciências, o professor solicite uma redação escrita sobre o comportamento de abelhas, ao invés de solicitar dados e informações facilmente copiáveis, peça uma redação como se fosse escrita, na primeira pessoa, por uma abelha, obrigando a uma reelaboração dos conteúdos e à criação de uma narrativa inovadora.

Estimular os alunos a coletarem dados para subsidiar informações e, assim, construírem seu conhecimento, ensiná-los a pesquisar usando as tecnologias disponíveis, pode fazer com que o celular ao invés de disputar com o professor a atenção dos estudantes seja um importante aliado no ensinar a aprender.

Imaginação pedagógica, envolvimento proativo dos alunos em projetos engajadores de seu interesse, ensino feito com carinho e inovação, troca de experiências com outros professores, avaliação crítica de sua metodologia, tudo isso são condições para que o celular – dispositivo computacional com recursos e capacidade muitas vezes maior do que o computador da Apolo que levou o homem à Lua e que está disponível no bolso de quase todos os alunos – possa ser, cada vez mais, uma ferramenta de aprendizagem na sala de aula.