O cinema precisa de indústria

O tipo de indústria que é o cinema e outras artes não se afirmará nunca em um país, se não tiver uma pesada ajuda governamental.

Cinema indiano tem uma produção em nível industrial

Todo mundo já sabe disso, desde mesmo o filósofo alemão Walter Benjamin, que desde os anos 20 na França já lançou uma espécie de manifesto, criando expectativa e teorizando sobre o cinema. O maior teórico do cinema, embora naqueles anos os intelectuais em geral não davam a menor importância para essa arte, que servia mesmo para os grandes comerciantes norte-americanos se afirmarem.

Eu só estou repetindo que o cinema precisa de indústria porque, apesar de ter mais de 100 anos, o cinema ainda continua sendo uma arte da indústria norte-americana de Hollywood. Talvez lá para os anos 2045 a China, que está pretendendo ser o mais desenvolvido país do mundo, lá para esse ano ela esteja também como uma grande indústria. O que parece é que agora, depois de Hollywood, a maior produção de cinema esteja mesmo na Índia. Hoje mesmo eu estava procurando um filme na Netflix, e me deparei entre os indicados ‘pelos críticos’ com uma produção indiana de três horas de duração e cinco minutos. Um filme de aventuras e com personagens do mundo histórico indiano. Isso mostra que lá na Índia já temos uma indústria e com equipagem para produzir grandes realizações. A maior produção indiana é mesmo dedicada ao público local, senão teríamos produções de lá no mercado latino-americano.

Em nosso país, só mesmo um governo marginal como o que conseguimos ver sair da Presidência, e já começando a ser preso, poderia ter deixado mais um período administrativo do cinema fora de ajuda. O tipo de indústria que é o cinema e outras artes não se afirmará nunca em um país, se não tiver uma pesada ajuda governamental. Sempre, desde antes da ditadura de 64, que o cinema brasileiro estava para crescer, e então precisava ser apoiado fortemente, mas veio então aquela gente. E depois de um bom período democrático, terminaram deixando tudo nas mãos do bandido.

A cultura voltou a ter um Ministério e certamente teremos agora um período de positividade e ação. Mas o cinema realmente precisa que haja uns cinco períodos seguidos, para que tenhamos várias indústrias cinematográficas se organizando. Cinema como indústria e assim como cultura.

Olinda, 15. 01. 23

Um drama romântico que se chama Atlântico

Trata-se de um drama sofisticado como se fosse de um Marcel Proust, mas foi realizado pela cineasta senegalesa Mati Diop e se chama “Atlantique”. Mati Diop é do Senegal, mas como a minha filha Isabela Lins há trinta anos, mora na França.

O importante de se observar nesse filme “Atlantique” é que ele tem muitos fatores para ser um filme senegalês, mas tem também muitos outros fatores para ser uma obra cinematográfica sofisticada. O principal aspecto é que Mati Diop criou uma narrativa que nos seus principais momentos se apoia, para contar a sua estória, na palavra. Sem dúvida, ele tem uma narrativa fotográfica muito plástica, e nesse aspecto o filme deve ter contado principalmente com a luz solar africana, e assim nesse aspecto ganha uma dimensão muito conhecida de nós brasileiros, que é essa forma de iluminação. No decorrer da contação da estória, ele tem um ritmo que se esquece da própria imagem e se aproxima da narrativa vocabular. É o som da palavra que ganha mais expressão. É dessa forma que Mati Diop foge principalmente de fazer um filme – seu primeiro longa-metragem – que não fosse totalmente ligado ao Senegal. Senão me parece que teria se ligado mais à imagem e à imagem expressamente senegalesa.

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“Atlantique”, apesar de primeiro filme longa dirigido por Mati Diop,  já ganhou vários prêmios, não só pela fotografia, quanto pelo roteiro, e ainda pela direção. O roteiro conta uma estória simples de uma moça que é dada em casamento a um homem rico, mas que ama mesmo a um jovem pobre. Tudo gira em torno de uma busca da solução pelo próprio jovem, mas com ele agindo quase sem aparecer. Sem dúvida, temos que frisar nesse caminho de diálogo com muita presença do vocabular.

“Atlantique” está em exibição na Netflix, que também apoiou a produção. As pessoas são todas negras e também falam uolofe, língua do Senegal. Assim temos um filme africano certamente, mas com um incrível ritmo parisiense.

Assista o trailer de Atlantique

Olinda, 15. 01. 23

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