O Espírito das Barricadas

Para os supersticiosos, os brasileiros não fogem a regra, os meses possuem significados que variam dos abençoados aos agourentos. Na História dos povos, há um calendário de acordo com os acontecimentos que marcaram profundamente a trajetória de cada nação

Quando se iniciam os trinta e um dias de agosto, a imprensa, precavida, relembra vários fatos nada agradáveis, incorporados ao nosso itinerário nacional.


 


Mas foi em maio que ocorreram as maiores manifestações estudantis em escala mundial, até os dias atuais. Não se pode dizer que houve uma organização internacional que deflagrou tamanho acontecimento global. Até porque em cada país variavam as plataformas de lutas, conforme o contexto institucional.


 


No Brasil, lutávamos contra o arbítrio e por liberdades democráticas. Surgiram líderes de massas em todos os estados e em nível nacional. Os universitários e os secundaristas tomaram conta das ruas e praças, enfrentando a polícia exigindo democracia e justiça social.


 


Havia sonhos no ar, apesar dos porretes da polícia e das bombas de gás lacrimogêneo. O que é certo é que não é possível compreender o ano de 1968 sem considerá-lo em um contexto bem mais amplo.


 


Lutava-se contra o regime e contra tudo que lembrasse as estruturas caducas da sociedade. Não por acaso dizem que houve uma revolução nos costumes. O mundo mudou, sociologicamente, para sempre, em muitos aspectos. Já Zuenir Ventura diz, em livro, que 1968 nunca terminou.


 


Há alguns dias, assisti a um especial na TV sobre aqueles tempos. O destaque foi Paris e entre os entrevistados, Daniel Cohn-Bendit, o líder, à época, dos estudantes franceses. Em certo momento ele disse, “tenho muito orgulho da participação nas jornadas, nas barricadas daquele período. Aconteceram equívocos, mas não há arrependimentos, não há como refazer a História, nem mudar uma partida de futebol. Em 1968 o futuro nos pertencia”.


 


No Brasil, foram duas ditaduras em uma só. Uma, de 1964 até o fim dos anos sessenta, outra com o advento do AI-5, quando se fecharam as cortinas de maio de 1968 e vieram os tenebrosos anos de chumbos, a 1985. Afinal, não estávamos em Paris. Havia sim, muita luta e imensa confiança no povo brasileiro. Uma tenaz resistência e a esperança, que não nos faltou.

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
Autor