O muro da vergonha nos EUA

Em mais uma iniciativa de natureza fascista, o Senado dos EUA aprovou nesta quarta-feira, 17 de maio, a construção de um muro-triplo de 595 quilômetros na fronteira com o México para impedir o ingresso na  “terra da l

Com folgada maioria, de 83 contra 16 votos, também foi acatada a emenda de dois senadores republicanos que  exclui qualquer anistia a milhares de “imigrantes ilegais” residentes no país e prevê a criação de barreiras para veículos em outros 805 quilômetros na divisa entre os países. Ao mesmo tempo, foram rejeitados os projetos que propunham a limitação do trabalho precarizado dos estrangeiros. Escravos, sim, mas ilegais!

Estas medidas revelam a brutal regressão autoritária em curso no país e desmascaram o discurso da mídia sobre os valores da democracia liberal nos EUA. Dois dias antes, o presidente-terrorista George W. Bush já havia anunciado o envio de 6 mil soldados para a fronteira com o México. A decisão foi encarada como uma “declaração de guerra” pelos setores organizados dos imigrantes e também por lideranças mexicanas, o que obrigou o mentiroso contumaz Baby Bush a utilizar a rede nacional de televisão para negar o óbvio: a “militarização da fronteira”. Estes fatos indicam que a questão migratória se tornou um barril de pólvora nos EUA e que o recurso à violência, com base na famigerada “segurança nacional”, agora é oficial!

Inferno dos migrantes

Segundo estudos de Luiz Bassegio e Luciane Udovic, integrantes da Secretaria Continental do Grito dos Excluídos, dos 87 milhões de migrantes nas Américas e Caribe, 57 milhões residem atualmente nos EUA. A vida deste estrangeiro, principalmente dos 12 milhões que não estão legalizados, é um inferno em todos os estágios: ao tentar ingressar no “primeiro mundo”, iludido com a promessa do paraíso, ele é vítima de perseguições e morte; ao ser obrigado a trabalhar com salários aviltantes, em condições degradantes e sem qualquer proteção social; e ao ser preso e deportado como criminoso. Este drama social já martiriza mais de um milhão de brasileiros, que deixaram o país em busca da falsa miragem de um futuro melhor!
 
A tentativa de ingresso nos EUA é o estágio mais perigoso. O “muro da vergonha”, também chamado de “muro do império”, coloca em risco a vida de milhares de desesperados dos países dependentes. Na parte mexicana, os imigrantes são espoliados por máfias criminosas que cobram até US$ 12 mil para a travessia ilegal. Eles ficam semanas dormindo em barracas de lona, sem qualquer higiene e com frágil alimentação. Já no território estadunidense, eles são perseguidos por 11 mil policiais – e agora por mais 6 mil soldados. Milhares são presos e deportados. Só em abril do ano passado, 4.802 brasileiros foram detidos – na média de 160 ao dia. Mais grave ainda é a ação de empresas paramilitares, como a racista Gatekeeper que presta assessoria para fazendeiros e ricaços interessados em caçar e matar imigrantes num jogo macabro!

Desde janeiro de 2001, quando o presidente mexicano Vicente Fox, ex-executivo da Coca-Cola, e George Bush assinaram um acordo migratório, mais de 2 mil pessoas foram mortas nesta divisa. No ano passado, foram 441 mortes, sendo 15% mulheres. A mídia burguesa, que acusou o famoso Muro de Berlim de ser responsável pela morte de 800 pessoas em 30 anos, pouco fala sobre o “muro da vergonha” que separa o México dos EUA. Pelo projeto aprovado no Senado, o muro expandindo terá detectores de movimentos e iluminação noturna. Seu custo será de US$ 1 milhão de dólares por quilômetro e percorrerá os Estados da Califórnia, Arizona, Novo México e Texas. Como alertou o bispo mexicano Gregório Rosa, ele reforçará a “divisão entre o norte e o sul, entre ricos e pobres. É uma declaração de desprezo a América Latina”.

O estágio seguinte, dos que conseguem escapar do cerco, também é deprimente. Como relata a jornalista Elaine Tavares, “boa parte dessa gente que chegou no país vive como ‘ilegal’. São ninguém, pessoas sem documento e sem cidadania. Até hoje têm conseguido viver em empregos subalternos, passando as piores privações. Por serem ‘ilegais’, os empregadores se acham no direito de explorar ao máximo e eles vão se submetendo”. Além do salário aviltante e do trabalho mais degradante e pesado, o migrante também não tem direito à rede pública de hospitais e escolas. E agora, segundo a jornalista, a tendência é que se agrave também o terceiro estágio, da expulsão humilhante, fechando completamente o cerco contra os migrantes.

“O governo pretende criminalizar a situação de pessoas ilegais e punir quem as emprega. Outra idéia é criar o emprego temporário para o "trabalhador hóspede", válido para os empregos que os estadunidenses não quiserem. A proposta é considerada aviltante e muito propícia para os empresários locais. Terão mão-de-obra barata e não correrão o risco de ter ‘essa gente’ por muito tempo, visto que passado o prazo, eles serão obrigados a voltar para o país de origem”. Ainda segundo a jornalista, “o saco de maldades não fica por aí. Dentre as propostas que pipocam no Congresso está uma que é de espetacular sordidez: cobrar dos próprios imigrantes uma taxa para fazer um muro ainda mais seguro do que o que já existe na fronteira. Também as entidades de direitos humanos ou que prestem ajuda a imigrantes sofrerão as penas da lei”.

Barril de pólvora

A violência contra os imigrantes, porém, tem gerado maior conscientização e resistência das vítimas. Nas comemorações deste 1o de Maio, mais de um milhão e meio de pessoas saíram às ruas em várias cidades dos EUA para protestar contra o endurecimento da legislação migratória e para exigir os direitos sociais e trabalhistas. O protesto, denominado de “um dia sem imigrantes”, revelou a força destes trabalhadores. Alguns símbolos do império, como a McDonald’s e a rede Wall Mart, foram boicotados. A própria mídia burguesa alertou para o risco da paralisação da economia, que depende hoje de milhões de migrantes. Ela constatou que os EUA estão diante de um barril de pólvora, “que pode explodir a qualquer momento”.
 
Para Luiz Bassegio e Luciane Udovic, “fica cada vez mais evidente que não será com muros, fechamento de fronteiras, policiais, cães ou com legislações restritivas que o problema da migração será resolvido. A migração não é um caso de polícia; é sim uma questão social, de justiça. É preciso atacar as causas que provocam tantos e volumosos êxodos. A causa maior é ‘a globalização que não distribui as riquezas; que globaliza os mercados, mas não é solidária; que elimina barreiras comerciais, mas impede a circulação das pessoas; que defende o livre mercado como um direito, mas dificulta o acesso aos direitos básicos’”.

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