O papel das religiões na opressão da mulher (1)

Este texto não tem como finalidade a crítica pura e simples sobre as diversas religiões ou sobre quem as professa, muito menos o questionamento da fé. Em determinados momentos da história, religiosos progressistas cumpriram e cumprem papéis importantes na

Deus, à imagem e semelhançado homem?


 


 


Para Mary Daly, a complexidade das representações do divino das religiões monoteístas (judaísmo,cristianismo e islamismo) tem sua origem no poder unilateral androcêntrico (centrado no masculino). Portanto, a mediação com o sagrado, o sacerdócio, passa a ser exercido exclusivamente pelo homem. Se as mulheres não são suficientemente capazes para a mediação com o divino, está legitimada a opressão e a desigualdade nas relações de gênero. No livro “Beyond Deus, o Pai”, a autora diz: “Uma vez declaradas “não aptas” para o sagrado, ficam numa posição de sofrerem sob o sagrado. Esta prática está coerente com a compreensão do sagrado como masculino. Deus é projetado como homem nestas religiões, que, por sua vez, legitima a centralidade no macho na sociedade: o sacerdote é homem, o rei é homem, os profetas são homens, os salvadores são homens… “Enquanto Deus é homem, os homens serão deuses””.


 


 


Uma das principais características de qualquer doutrina religiosa é exercer forte influência nos padrões de comportamento moral e social na população que pratica a sua fé. Desde que os primeiros hominídeos associaram fenômenos da natureza a “entidades” sobrenaturais para poder entendê-los, criaram também normas de conduta que imaginavam poder agradar a estas entidades. Quanto mais assimétricas se tornam as relações de poder entre os membros de uma sociedade, mais esta sociedade usará do artifício religioso para impor diferenças entre seus membros. E notadamente, sobre a mulher. Desta forma, quanto mais “evoluídas” as relações sociais, mais as religiões buscam regras e leis visando enquadrar a mulher nos papéis convenientes para a sociedade. E nada melhor para justificar este convencimento do que a vontade divina. A concepção de Deus muda segundo a concepção da humanidade a respeito de si própria. O que a observação nos demonstra é que inicialmentea ideia de Deus era feminina, já que associada à concepção e geração. Isto até a humanidade entender que a geração de bebês era conseqüência do ato sexual. Conforme mudam as percepções do homem sobre si mesmo, mudam também suas ideias sobre Deus. Ou o homem muda sua concepção sobre Deus, que ele concebe à sua própria imagem e semelhança.


 


 


Como a maioria dos brasileiros criados e educados à sombra de valores morais do cristianismo, as mulheres têm sua primeira relação com o divino em uma figura masculina. Um único Deus homem, severo, vingativo, que tudo vê e que condena a maioria das coisas interessantes, entre elas sexo, diversão, prazer e iniciativas. E para entender o papel da mulher para as diversas, correntes religiosas que o Brasil conheceu e conhece em sua história, é preciso entender cada momento político vivido e as necessidades da sociedade deste momento.


 


 


Duas correntes religiosas influenciaram majoritariamente a formação do povo brasileiro: a católico-cristã e a africana, uma vez que a população indígena foi parte dizimada, parte aculturada através da catequese. A miscigenação étnica e cultural da população provocou o fenômeno que conhecemos por sincretismo religioso. Exemplo maior deste caldo é a umbanda, doutrina genuinamente brasileira, com pouco mais de um século de existência, que mistura elementos esotéricos, católicos, espíritas kardecistas, das pajelanças indígenas, e do yorubá. Mais fiel a suas raízes, as chamadas religiões afro-brasileiras conservaram não só seus elementos originais mas também os valores morais dos grupos que aqui aportaram escravizados para servir de força de trabalho durante o Brasil colônia. Hoje, segundo o Babalaô Clóvis do Aganjú, de Nação Oió, “O Brasil é o país com o maior número de católicos praticantes das religiões afro, atualmente freqüentando as sessões de descarrego das igrejas evangélicas.” Eis aí a explicação para os milhões de católicos auto-declarados nos censos e igrejas católicas vazias em seus cultos dominicais.


 


 


(continua)

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