O reformismo entre nós

Desatar esse nó é derrotar o imperialismo e seus sócios internos: o latifúndio multicentenário e a oligarquia financeira parasitária

Foto: Anamul Rezwan/Pexels

Dia desses, estava esse que vos tecla num seminário. A mesa versava sobre a alternativa socialista na atualidade. Lá pelas tantas, um dos debatedores diz: “Não existe proletariado no Brasil”.

Ato contínuo, ligo prum camarada amigo meu, peão de metalúrgica, e pergunto:

– Fulano, você existe?

De dentro da fábrica, hora do intervalo do turno, o cidadão devolve:

– Que pergunta maluca é essa, sujeito?!

Para não passar por doido, relato o que acabara de ouvir. Rindo, ele riposta:

– Vai ver, sou um robô e não sei.

O decreto do da mesa – de que inexiste proletariado em terras pindorâmicas – veio a propósito do debate sobre o sujeito histórico da alternativa socialista na atualidade. Debate que não é novo. À vera, desde que o comunismo virou espectro na Europa, ele existe e se repõe.

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Quando Marx e Engels premiram os pingos nos is de toda uma época histórica – a “Era do Capital” –, o acento tônico caiu justamente no sujeito que a história escolheu para cumprir as tarefas que as contradições desta época histórica até hoje reclamam como soluções necessárias: a contradição básica entre produção social e apropriação privada no capitalismo expressa-se no antagonismo entre proletários, donos da força de trabalho, e burgueses, donos dos meios de produção – ou seja, as contradições econômicas e sociais objetivas ganham expressão concreta no antagonismo entre sujeitos históricos.

Em cada nação do orbe, marcada cada uma por sempiternas transformações, esse antagonismo de classe ganha conformações próprias. No Brasil hodierno, a guerra entre burgueses e proletários expressa-se na contradição entre imperialismo e nação – contradição que articula outras muitas contradições: democracia contra antidemocracia, opulência versus pobreza, mínima inclusão em face de máxima exclusão social.

Sabem os proletas conscientes que, para começar a solucionar as inúmeras contradições que assolam o Brasil, é preciso desatar o nó de nossa condição colonial ainda não superada. E desatar esse nó é derrotar o imperialismo e seus sócios internos: o latifúndio multicentenário e a oligarquia financeira parasitária. Ora, sabemos que numa guerra de classes, como em qualquer guerra, é necessário isolar o inimigo principal e acumular força no campo de cá. No Brasil deste instante, isso significa uma coalizão entre trabalhadores, pequenos e médios proprietários, setores médios da sociedade e setores destacados da grande produção.

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Bueno… logo se vê que, assim considerada, a bandeira nacional é um estandarte revolucionário.

Provavelmente, a mesa do seminário concordará com todo o dito até aqui, mas acontece que… “o proletariado não existe”. E se não existe, não pode ele, inexistente que é no Brasil, comandar a luta antimperialista e a tarefas nacionais e democráticas a ela inerentes.

Tá… mas, se não é o inexistente proletariado brasileiro que comandará a coalizão de classes chamada a derrotar o imperialismo, quem poderá nos salvar?

Uns dirão, cautelosos (alguns, tímidos; outros, pomposos):

– As circunstâncias históricas é que geram o sujeito histórico.

Antes que o preclaro leitor e a digníssima leitora possa soltar um irônico “não diga!”, saltará ao proscênio outro mesário que soltará, como quem nada quer, a expressão “burguesia nacional”, ponderando que, “lógico que os trabalhadores têm papel central”, etc, etc, etc, mas… não esqueçamos da “burguesia nacional”, porque, se as tarefas que se apresentam ao Brasil na quadra atual são nacionais e democráticas, bem… precisa ver aí a “burguesia nacional”.

Camaradas e camarados meus: esse que vos enfara não terá tempo agora para tratar com apuro, digamos… conceitual, de “circunstâncias históricas”, “sujeitos históricos”, “proletariado” e “burguesia nacional”. O que fica deste imbróglio opinativo é que, quando ressurge entre nós a tese de que o proletariado não é necessariamente o sujeito histórico vanguardeiro da luta contra o imperialismo e em favor de um projeto nacional soberano, e de que, “quem sabe, veja bem , ó só, data vênia, então… a ‘burguesia nacional’ tem aí o seu papel e tals e bola”… minha gente, o reformismo anda armando barraca no terreiro!… Prestenção!…

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