Orgulhosa África, Poderosa África

Várias notícias dão conta, desde maio, de uma reunião ocorrida em meados de abril em Dakar, que tratou de política referente aos países emergentes, e de outros nem tanto. Preocupações com a  África, onde, segundo eles, as perspectivas para o continen

Mas o que poderia ser mais perverso para quem, num único conflito recente teve como saldo um milhão de mortos (Sudão), a mais baixa expectativa de vida do mundo (37 anos, Zimbábue) e segundo a ONU detém os primeiros vinte primeiros lugares da lista de piores países para se viver?


 


 


Diferentes sintomas, mesma doença, igual remédio


 


 


A saída para o neoliberalismo, e o que eles propõem para a África certamente será o mesmo antiquado e azedo remédio que já provou ser ultrapassado. Não deu certo em nenhum país do mundo. Pena que o povo de memória curta, o mesmo que esbravejava contra a intromissão do Estado no mercado, na primeira dor-de-barriga do Deus mercado correu pedindo remédio para o tão ineficaz estado. Eles, os liberais podem. As economias emergentes, não. A GM, os bancos, as corretoras, construtoras, estes todos podem receber auxílio estatal. eles podem ser abençoados por Deus Mercado. Quanto aos emergentes, ponham-se em seu lugar. Este é o pensamento neoliberal. E é  este o pensamento que temos que quebrar. Porque os espoliados, sejam da América Latina, da África, da Ásia, somos nós quem ainda sustentamos os luxos e as excentricidades. Deles, que acham normal existirem cidadãos de classes diferenciadas. Na prática, um tipo um pouco mais disfarçado de escravidão.


 


 


Babel foi pequena perto da África


 


 


A África tem sofrido secularmente. Primeiro, como fornecedora de mão-de-obra escrava. Mesmo antes de o capitalismo nascente aprisionar considerável parte de sua população, outras civilizações já o faziam. A escravidão de africanos por povos árabes e outros, embora sem a crueldade característica ocidental, já era conhecida desde a antiguidade. Mas foi a violência do tráfico negreiro, entretanto, que alterou consideravelmente o panorama geopolítico do continente. Mais tarde, as ocupações “civilizatórias” cristãs, como sempre dispostas a salvar almas, continuaram a destruir o que havia sobrado da rica cultura desenvolvida antes pelos povos africanos e impor a ocidentalização.


 


 


 


Até meados de 1950 estes territórios eram colônias européias: França, Inglaterra, Portugal, Espanha, Itália, Bélgica, Inglaterra, Holanda possuíam seu quinhão de terra. Após espoliar e limitar nos mesmos territórios políticos tribos milenarmente opositoras, num acordo que não levou em consideração as características políticas, culturais e sociais locais, o ocidente percebeu a quase  inesgotável fonte de renda: venda de armamentos para as guerras e guerrilhas que fizeram da África um continente de mutilados. Sem falar na reconstrução do pouco que existe por lá para ser destruído, e das tão propaladas “ajudas humanitárias”. Sem dúvida, o povo ocidental adora divulgar sua índole caridosa.


 


 



Além disto, são cerca de mil idiomas falados no continente, chegando ao ponto de, numa mesma vila, três ou quatro dialetos. E ao destruir os valores éticos da população sem substituí-los por outros (afinal, quais os valores éticos dos mercenários capitalistas profissionalizados para a guerra?), estimulou-se  a cultura do terror, que faz, por exemplo, com que o estupro seja uma das principais e mais temidas armas de guerra utilizada contra as indefesas populações civis de Ruanda, Quênia, Congo e Sudão, principalmente.


 


 


O extermínio pela AIDS: limpeza étnica?


 


 


A contaminação por HIV atinge 22,5 milhões de pessoas. Ou seja, estão na África dois terços do total mundial de infectados. Cerca de nove em cada dez crianças vítimas da doença no mundo estão na África. Quanto mais pobre a região, obviamente, maior o índice de contaminação. Na África subsaariana, já pereceram 11,5 milhões de pessoas desde o início da epidemia. Quatro em cada dez mulheres grávidas de Botsuana está contaminada com o vírus HIV. No Zimbábue, a AIDS é conhecida como ?iyoyo? ? uma coisa misteriosa e sobrenatural, manifestada por definhamento, fraqueza, febre e infecções. Dizem algumas lendas que só homens podem curar-se da iyoyo, e para isto devem estuprar uma virgem. Esta é uma das causas do aumento de transmissão entre mulheres e crianças.


 


 


Segundo levantamento da ONU, a expectativa de vida no Zimbábue caiu, de 66 anos em 1985 para 41 anos em 2005. Mas nem mesmo a África do Sul escapa da epidemia: Em uma década, foram três milhões de casos, atingindo principalmente a população pobre… e negra, claro. A estimativa é que nos grandes centros de mineração, que ficam afastados das cidades entre 15 e 20% dos mineiros estejam contaminados, por freqüentar bordéis próximos, onde as prostitutas estão, em sua maioria, infectadas. Ao retornar para suas cidades de origem, o ciclo está completo. De qualquer forma, entre pobres e nem tão pobres, nestas duas últimas duas décadas, já morreu naquele continente o equivalente 2,5 vezes a população da Suíça, ou ainda 12 vezes a população de uma capital como Porto Alegre, ou seja, 18 milhões de pessoas. As políticas públicas para prevenção são tímidas, os recursos são escassos. Um ponto de apoio decisivo foi a decisão do governo brasileiro de assinar convênios de cooperação visando transferência de tecnologia, controle e fabricação de medicamentos para tratamento e controle da AIDS, apesar dos protestos do cartel da indústria farmacêutica.


 


 


Nem só a escravidão enriqueceu os capitalistas


 


 


Além de braços para a escravidão, política que arrancou da África cerca de 12 milhões de homens e mulheres, o capitalismo encontrou na África muitas outras riquezas. Primeiro o ouro, diamantes e outras gemas preciosas. Depois, o extrativismo animal, que iniciou o extermínio de várias espécies. Desde o estabelecimento dos safáris, a caça “esportiva” abateu por deleite milhares de animais, alterando o equilíbrio ecológico de florestas e regiões do continente. O comércio de couros e peles feito principalmente no Congo, Botsuana, Djibuti, Burkina Fasso; A caça de elefantes para extração de marfim foi responsável pelo quase extermínio desta espécie. Hoje, antigas faixas de caça de caça no leste, centro e sul da África estão vazias. De rinocerontes, elefantes e leões, cujas peles, chifres e marfim tornaram-se materiais afrodisíacos ou enfeites no chamado primeiro mundo.


 


 


Os tesouros arqueológicos, antiguidades e relíquias que foram apropriados pelo Museu Britânico e, em menor número, por outros museus, significaram não só o roubo de riquezas, também da história e da auto-estima destes povos. Mas ao esquadrinhar e saquear quaisquer sítios arqueológicos que encontrassem, certamente estavam cometendo outro crime: A lesa-soberania daqueles povos.


 


 


Atualmente a extração de petróleo e gás natural acontece principalmente na Nigéria, Gabão, Líbia, Argélia e Egito. E minérios como fosfatos no Marrocos, Urânio e Manganês no Gabão e África do Sul e Cobre no Zaire. Só que a exploração destes minérios é feita por empresas européias estadunidenses ou européias, de forma que a população destes países fornece a matéria prima, a mão-de-obra e fim. Ou seja, só mesmo a violência da espoliação capitalista pode explicar a miséria em um continente rico em petróleo, diamantes, minérios, com imensas áreas férteis e um povo que, mesmo abaixo da chibata, construiu a riqueza e deu contribuições fundamentais para a cultura, a arte e outros aspectos em todos os outros países para onde foi levado.


 


 


Agricultura: plantar o que?


 


 


A agricultura na África se desenvolve de duas maneiras: Com as culturas  tradicionais (de forma rotativa), para subsistência planta inhame, milho, batata, sorgo e arroz. Quando, porém, o sistema europeu de “plantation” se instala, impondo a monocultura voltada para o mercado externos surge o esgotamento da terra em dez ou doze  plantios ,necessitando de insumos químicos e defensivos. E sabidamente, plantar para exportação não resolve a questão da fome num continente onde este é um dos maiores problemas da população.


 


 


Não bastasse isto, em várias regiões férteis estão sendo criadas fazendas de eucaliptos. Vastas áreas antes ocupadas para culturas de subsistência, de pequenas propriedades rurais foram adquiridas para plantio de pinus e eucaliptos, ambos modificados geneticamente, exclusivos para fabricação de celulose. Tanto quanto na América Latina, o processo é excludente: Planta-se o eucalipto, que cresce em seis ou sete anos, consome água, nutrientes da terra, contamina o terreno por mais de 20 anos, impede outras culturas, provoca desemprego. Na época do corte tratamento e cloramento, estes processos são feitos na África. A pasta, limpa, pronta para agregar mais valia, é exportada para o primeiro mundo. O processo de purificação e cloramento da celulose é extremamente poluente, e os resíduos, é bom lembrar, ficam todos na região produtora.


 


 


Alguém tem que ser mau, adivinha quem?


 


 


Para o imperialismo, é fundamental a dominação e o lucro. Afinal, se durante o período do tráfico negreiro foi preciso uma Bula Papal garantir que não seria pecado a escravidão, já que os negros não tinham alma, agora é necessário demonizar os africanos de outra maneira. Para os conservadores e neoliberais, o importante é convencer, com uma certa sutileza, a inferioridade racial dos povos que exploram. Desta forma, qualquer reação do povo oprimido é interpretada como ausência de juízo crítico ou moral. E obviamente que a mídia está a serviço desta ideologia. Descrever a África como um continente de pagãos (sem nem saber direito o que é paganismo), criticar os governantes africanos, principalmente os que  desacordam das regras e normas estabelecidas pelo neoliberalismo,  quando o que deveria ser criticado são justamente as posturas capitalistas adotadas por alguns governantes.


 


 


Assim como os piratas somalis, denunciados por  grande parte  da mídia como facínoras mercenários, vagando pelos mares a procura de inocentes vítimas que transportam pasmem “ajuda humanitária” para seu próprio povo. Buenas, em tempos de internet, ao menos para quem procura outros motivos em mídias alternativas, eles aparecem. Como no caso dos somalis do Chifre da África, que atacam os navios que vão para lá despejar lixo tóxico italiano, francês e estadunidense em suas praias, além de outros “civilizados” que não respeitam suas águas e, com seus potentíssimos navios pesqueiros, fazem a “limpa” em sua região de pesca. Agora, vamos supor que fosse um miserável navio somali a invadir as águas territoriais estadunidenses, francesas ou italianas.



 


 


Cabe a nós, agora, não acreditarmos mais nas bulas papais.

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