Polêmicas indesejáveis…

Depois do pacote antinacional e antipopular de início do ano, vamos voltar a enfrentar a polêmica que envolve a política econômica (e o poder no Brasil) ou vamos continuar batendo em “cachorro morto”, entre eles o tal Dom Cappio e os “amigos” do São Franc

Mesmo no âmbito da citada polêmica, vamos fazer a propaganda (politicamente correta) da “água para todos” ou vamos deixar claro – contra inclusive certos “movimentos sociais” defensores do retorno a uma agricultura do século XIX – que o nosso objetivo é transformar o Nordeste no maior complexo agro-industrial do mundo, dotado do melhor que a técnica produziu na área, e assim acabar de uma vez por todas com a fome no Brasil e – quiçá – no mundo? Ou vamos continuar a amplificar o discurso (no mínimo desamparado teoricamente) de uma necessária e premente reforma agrária para a solução dos problemas nacionais, em detrimento da necessidade de crescimento econômico acima de 8% ao ano?



Essa é só uma das polêmicas indesejáveis para determinada gama da esquerda brasileira.



Mitigar o modelo



Uma insensata euforia tomou conta de quase a totalidade das esquerdas após o anúncio do crescimento do PIB para 2007 (5,2%). A essência desta euforia transformou-se, em muitos casos, na naturalização do processo de domínio da grande finança sobre nossa República. Ou seja, o país cresceu (sic) mesmo com superávit primário, com repasses da ordem de mais de 30% do orçamento da União para o sistema financeiro, com câmbio tipo pacto colonial etc.



Como historicamente a maior parte esquerda brasileira quase nada elaborou em política econômica, a tendência à naturalização do fenômeno fica mais latente. De modo que não é surpresa o debate sobre os rumos de nossa economia ter saído da pauta quando se vaticinou a “retomada do crescimento” do país em 2007, mostrando que, portanto, as coisas estão corretas. Assim, para muitos, os neoliberais tinham razão; coube ao governo tentar mitigar o modelo com um mínimo de planejamento (PAC) e contar com a capacidade – historicamente comprovada – de nossa burguesia em observar estrategicamente novos campos de investimentos, e assim a panacéia será conquistada. 



Houve até espaço para comemorar o fato de os pedágios de futuras estradas concedidas serem de menor valor aos praticados desde o governo FHC. A mediocridade na análise é tamanha que apenas alguns perceberam que o preço do pedágio está sendo subsidiado não pela concessionária e sim pelo governo. Resumindo a obra, isso só foi possível pelo fato de que 70% dos investimentos iniciais nas estradas concedidas serão cobertos pelo BNDES em prol de um grupo espanhol que já domina o setor na América Latina há algum tempo. Submeter-se a isso em favor de investidores estrangeiros deve ser motivo de vergonha para qualquer governo digno desse nome, ainda mais quando grupos nacionais também têm interesse neste negócio. Moral da história: o governo financiou a entrega de uma estratégica reserva de mercado não a um grupo nacional e sim a investidores metidos até a medula em manipulações políticas em países como a Venezuela e a Nicarágua. Quem quer enfrentar essa refrega em favor do Brasil?



Certos slogans foram criados, parece, com o papel de minimizar governos como o de Getúlio Vargas e JK, colando na subjetividade da massa a idéia de que “esse país passa pelo melhor momento de sua história”, como se tudo tivesse saído de um nada criado por um Messias parido em algum centro industrial do sudeste do Brasil. Evidente que esse jargão deve ter sido criado por um hedge found da vida, pois o momento no país é altamente propício ao investimento de capital com juros negativos tirados de alguma instituição financeira japonesa e em seguida reinvestir em nosso país, com risco quase zero.



Será que essa polêmica não merece mais atenção, ou vamos nos contentar com nosso país ser um verdadeiro motel do capital especulativo desde que tenhamos súbitos de crescimento como no ano passado e uns poucos reais para, de forma justa, distribuir entre famintos?



Está passando da hora da coragem e da fé na verdade acima de quaisquer interesses e mesquinharias se sobreponham à mediocridade e aos interesses pequenos ante os anseios maiores da nacionalidade.


 


A naturalização em si



Em ciências sociais não existem hibridismos e sim elementos dominantes ou não que, dada sua dominância, acabam por exercer o controle do processo, seja ele histórico, político ou econômico. A possibilidade do “híbrido” só é possível em ciências biológicas. Digo isso para demonstrar que em economia o que determina a característica do processo não está na mistura de elementos de planejamento com elementos determinados pelo mercado e sim em quem domina os elementos cruciais para o processo de acumulação, a saber: as taxas de juros e câmbio, o crédito e o sistema financeiro. Para o caso brasileiro, não existem grandes dúvidas de quem comanda neste campo. Está claro que Lula ocupa o governo; os bancos, o poder.



Esta verdade foi clareada com o anúncio do governo de custear os tais R$ 40 bilhões perdidos pela CPMF não com a diminuição do superávit primário e sim com cortes de R$ 20 bilhões nos “gastos” e a arrecadação do restante pelo aumento do Imposto Sobre Operações Financeiras (IOF). Aumento de imposto este que pode “livrar a cara” do Banco Central do desgaste de elevar a taxa de juros em sua próxima reunião, tamanho o obstáculo que esse imposto acarreta sobre o crédito.



Para termos uma idéia da regressão, matéria de capa do caderno de economia de O Globo do último domingo (“Alívio para o BC contra a inflação”) nos traz números assustadores, dando conta de uma verdadeira regressão. Segundo a matéria, como o governo assumiu a tarefa de cortar R$ 20 bilhões nos gastos públicos, chegará (o governo) a um nível de despesas semelhante ao do primeiro ano do governo Lula, onde todos se lembram (ou querem se lembrar) nosso crescimento foi negativo em 0,1%. Evidente que esse cenário de crescimento negativo não vai se repetir, pois uma série de investimentos no PAC estão agendados (apesar do risco de serem proscritos) e a própria iniciativa privada já está tocando determinados projetos.



Tomado forma estas coisas, esqueçam, pois quem verdadeiramente manda nesse país decretou que estão cancelados aumento para servidores, novos concursos e, inclusive, uma nova reforma da previdência está em vias de se tornar realidade. Muita gente continuará morrendo em filas de hospitais públicos por culpa de alguém. Culpa que para a maioria da esquerda é de uma oposição perdida e irresponsável, pois ao votar contra a prorrogação da CPMF votou contra os que dependem de saúde pública. É verdade e acrescento: “bandida”, a pior direita da América Latina. Mas que não escamoteemos a realidade: compatriotas morrem em filas de hospitais enquanto o governo paga em dia os juros da dívida interna.



Será essa a responsabilidade fiscal que o governo e a direita juntos buscam jogar na cara daqueles que não tem consciências entorpecidas e continuam a insistir que esse estado de coisas não vai levar o país a lugar algum e que o poder dos bancos sobre o país (e conseqüentemente sobre esse governo) já está virando uma questão de ordem pública e de desmoralização política para a ampla parcela das esquerdas? 



Enfim, na esteira de um crescimento econômico questionável (o Quênia à beira de uma guerra civil cresceu 6,2% no ano passado) continuar-se-á a naturalizar o pagamento em dia dos juros da dívida interna?



Em época propícia para a discussão de uma reforma tributária e/ou fiscal, não é o caso de começar a dita reforma pela renegociação desta dívida interna? Ou nossos cofres não sangram por conta de tal dívida? Aumentar tributação sobre os ricos e milionários, apesar de justa, iria resolver o problema central sem tocar o dedo na ferida dos lucros auferidos pelos bancos na compra e venda de títulos da dívida?


 


A necessidade de maiores patamares inflacionários



O controle da inflação é a bandeira que os inimigos da pátria tomaram para si no intuito de camuflar seus desejos de perpetuação da lógica agrarista vitoriosa desde a eleição de Collor em 1989. A partir do controle da inflação pela via da manipulação das taxas de juros e câmbio, o caminho natural da desindustrialização foi tomado. Da direita à esquerda, quase todos se gabam pelo “bônus” de quem melhor consegue combater a dita cuja da inflação. Não se lembram, ou nunca leram, que a inflação é inerente tanto a qualquer economia de mercado, quanto a economias (como a brasileira) onde o monopólio/oligopólio são os principais mediadores dos preços ao consumidor. Conviveremos com ela (inflação) seja no capitalismo, seja no socialismo.



Assim, metas surreais são impostas. Os “gastos” não podem ultrapassar determinados limites; o crédito idem, e no final das contas o coitado do trabalhador que financia uma geladeira em 48 vezes numa loja qualquer acaba pagando o pato pela inflação.



Os juros não podem baixar. O câmbio não pode ser determinado por forças de fora do mercado. Alguma quiromancia qualquer determina que o nosso país não pode crescer depois de um certo limite, caso contrário a inflação vem e… tudo vai por água abaixo. O presidente Lula, segundo seu próprio vice-presidente, tem medo da inflação… Todos são tomados pelo medo.



A grande polêmica que deve ser comprada é a da verdade que envolve o fato histórico que nos diz que toda economia em vias de crescimento obrigatoriamente deverá conviver com uma margem de inflação que permita pesados investimentos em novas cadeias produtivas que no médio prazo poderão servir de base ao aumento de demanda, sem acompanhamento da alta de inflação. Temos de ter coragem e provar que nosso país pode muito bem suportar uma taxa de inflação anual de até 12%, de forma que após atingirmos um determinado nível de desenvolvimento das forças produtivas capaz de abarcar uma demanda maior, a inflação volte a patamares como os sonhados pela atual e trágica equipe econômica. Trocando em miúdos, a viabilização de investimentos em formação bruta de capital intensivo é a melhor forma de termos condições de no futuro termos um país desenvolvido e industrializado por um lado e em condições de enfrentar a inflação por outro.



A forma progressista de enfrentar o problema da inflação passa pelo aumento do investimento e não o contrário como propugnam a direita e a esquerda do espectro político. Mas, como o “combate a inflação” envolve mexer em oligopólios internacionais (afinal a demanda brasileira tem sido atendida por importações de empresas sem demanda em seus próprios países), o melhor a se fazer é estudar com profundidade o tema.



Essa é uma polêmica, que talvez seja “a mãe de todas as polêmicas”, pois envolve a espinha dorsal da atual política econômica e a própria decisão do governo de cortar gastos e cancelar investimentos após a perda da CPMF.



Se esta polêmica é desejada, isso é uma outra história, mas ou a enfrentemos ou nosso destino poderá ser o traçado alguns dias atrás pelo New York Times.



Demonstrar júbilo ante os “cinco motivos” enumerados pelo New York Times?
 


Num dia foi a Marina Silva (Ministra do Meio-Ambiente – inimiga do desenvolvimento nacional – chancelada pela Fundação Ford, Greenpeace, WWF, Fundação Rockefeller e outras agências que servem aos interesses do imperialismo na periferia) ser indicada por um dos diários oficiais do decadente imperialismo inglês (The Guardian) como “uma das 50 pessoas que podem salvar o planeta”, no outro o New York Times enumerar os cinco motivos que fazem do Brasil o país do futuro.



Pressuponho que ambas notícias foram recebidas com júbilo e ponta de orgulho por muita gente, inclusive de esquerda. Que vergonha!!! Todos os motivos elencados (terras, matérias-primas, energia, meio ambiente e a China) dão conta de um futuro que ouço falar desde criancinha: “O Brasil vai ser o celeiro do mundo”.



Nenhum motivo elencado dá conta de um país que pode ser uma grande potência industrial, com um capitalismo financeiro desenvolvido e a serviço dos interesses nacionais. Não. Todos os motivos tentam encher de orgulho por termos condições de nos tornarmos uma futura Arábia Saudita das Américas, porém com uma pauta de exportação mais sofisticada: alimentos e minério de ferro para a China e a Índia.



Terá sido a vitória da ultrapassada Teoria das Vantagens Comparativas em pleno Brasil que um dia quase chegou a condição de Japão do Hemisfério Sul do mundo? Será que isso é verdade?



Enfrentaremos a polêmica que envolve o futuro do Brasil ou nos resignaremos a ser uma plataforma de commodities, conforme assim o deseja o nosso Banco Central e a nossa Ministra do Meio-Ambiente, devidamente decantados seja pelo The Guardian, seja pelo New York Times?

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