Reeleição do presidente Lula: uma crônica anunciada

A perspectiva de reeleição do presidente Lula já era esperada, pelas seguintes razões: i) altos índices de popularidade do presidente e de seu governo, ii) apoio incondicional dos beneficiários do programa Bolsa-Família, iii) ausência de candidatura compe

A surpresa ficou por conta da eleição ter sido decidida em segundo turno, por erros da coordenação de campanha do Governo, entre os quais a não ida do presidente ao primeiro debate na Rede Globo e a divulgação das fotos do dinheiro apreendido, supostamente destinado à compra do dossiê contra os tucanos, fortemente explorados pela mídia. O sentimento predominante era de que, apesar da crise política, das denúncias de incapacidade gerencial e de desvios ético-morais de integrantes da equipe governamental, a eleição seria resolvida em favor do presidente Lula ainda no primeiro turno.


 


A convicção da reeleição em primeiro turno, além das pesquisas eleitorais, decorria de vários fatores, que iam desde a confortável situação econômica do País, passando pelas realizações sociais do governo até o carisma do presidente Lula.


 


Na economia, por exemplo, o Governo do presidente Lula manteve praticamente a mesma política do governo anterior, baseada no controle da inflação, na flutuação do câmbio e na definição de metas de superávits primários, mas também contou com o fator sorte em virtude do aumento do crescimento econômico mundial e da ausência de crises internacionais.


 


Ao contrário de FHC, que enfrentou as crises da Ásia, da Rússia, do México e da Argentina, o Governo do presidente Lula navegou em “céu de brigadeiro”, sem nenhuma crise externa que afetasse a economia nacional. Com isso houve crescimento econômico, expansão das exportações, geração de empregos, diminuição das vulnerabilidades externas, aumento da arrecadação e, no último ano do governo, aceleração da redução das taxas de juros.


 


Na área social, graças à estabilidade econômica, o presidente pôde beneficiar os mais pobres com programas, como o micro-crédito, o crédito à agricultura famíliar, o Prouni, o Estatuto dos Idosos, o Bolsa-Família, entre outros. Para a classe média, além da atualização da tabela do imposto de renda e do dólar baixo, o Governo deu reajuste para os servidores públicos, reduziu as taxas de juros e moderou os aumentos das tarifas públicas.


 


No plano político, além do carisma pessoal, o Presidente contou com as seguintes vantagens: a) foi candidato a sua própria sucessão; b) disputou no exercício do mandato; c) deu perfil técnico à campanha, mostrando as realizações econômicas e sociais do governo, comparando-as às do governo anterior, e evitando temas ético-morais; d) teve apoio incondicional dos beneficiários do Bolsa- Família; e) não foi pessoalmente atingido pela crise ética de seu partido e de parcela do Governo que lidera (conseguiu separar o Governo de sua pessoa); e f) pôde anunciar uma série de medidas de última hora de interesse do setor empresarial e da classe média.


 


Além de explorar os aspectos mencionados, o segundo turno da campanha foi mais criativo, com slogans com forte apelo, como “não troque o certo pelo duvidoso” e, principalmente, o “deixa o homem trabalhar”. Como os programas dos candidatos, exceto no tamanho da maquina pública e no gasto social, eram muito parecidos, os slogans de campanha calaram fundo junto aos eleitores, passando a imagem de que o adversário, além de não trazer novos benefícios à população, estava atrapalhando.


 


O candidato do PSDB, ex-governador Geraldo Alckmin, por sua vez, elegeu como motes de campanha o que considerava vulnerável no Governo Lula e no PT: a) coerência política, b) competência administrativa, e c) honestidade.


 


A campanha tucana limitou-se a três pontos: a) explorar suposta competência gerencial, mostrando as realizações de Alckmin no Governo de São Paulo, b) prometer redução de impostos, corte de gasto, e, principalmente, c) denunciar incoerência e desvios ético-morais do PT e do Governo do presidente Lula.


 


Os programas de governo dos dois candidatos (PSDB e PT) eram coincidentes na área econômica e parecidos na área social, pelo menos no plano retórico. Ambos defendiam: i) estabilidade monetária, com controle da inflação e baixo custo da cesta básica, ii) crescimento econômico, com geração de emprego e renda, iii) inclusão social (programas de transferência de renda), iv) responsabilidade fiscal, e v) redução das vulnerabilidades externas.


 


As vantagens da candidatura de Geraldo Alckmin eram: i) a experiência administrativa, com 12 anos no Governo de São Paulo; b) a desvinculação política do grupo de FHC, já que pertencia ao grupo político de Mário Covas, crítico da política econômica do governo tucano; c) o apoio do setor produtivo e do mercado financeiro; d) um razoável domínio dos problemas nacionais, que tentou apresentar de forma didática, e e) a imagem de  homem simples, tranqüilo e  religioso.


 


Num ambiente político em que a população não estava plenamente satisfeita com o governo do presidente Lula nem sentia saudade do governo do PSDB, a tendência natural do eleitor seria a de analisar os perfis, programas, posturas, comportamentos e, racionalmente, eleger aquele que considerasse o menos pior ou menos prejudicial aos seus interesses. Como as vantagens comparativas do candidato Lula eram maiores, por seu carisma e realizações na área social e na manutenção da estabilidade monetária, o eleitor optou por “não trocar o certo pelo duvidoso”.

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