Secretarias de cultura entre a imobilidade, o produto e a transversal

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A crise pandêmica e econômica provocada pelo Coronavírus coloca na centralidade do debate a sobrevivência. Esse deve ser o norteamento das políticas públicas para garantir o direito à vida em contraposição a lógica da produção de mercado.  No campo da cultura, é colocado um desafio para as secretarias municipais e estaduais de cultura para esse momento atípico que é ampliar a luta pela defesa da Lei de Emergência Cultural que vem sendo discutida no Congresso Nacional com amplo apoio dos diversos segmentos de trabalhadores e trabalhadoras da cultura e ao mesmo fortalecer uma compreensão da transversalidade da cultura, alinhada a proteção social e aos direitos humanos.

A imobilidade e a morosidade não deve ser regra quando existem humanos precisando sobreviver. Alternativas de enfrentamento vem sendo apresentadas em alguns municípios e estados para minimizar os impactos provocados na economia da cultura e a maioria dos municípios estão paralisados diante da crise.

Neste momento de enfretamento da crise e de subjetividades abaladas,  o diálogo e a escuta dos segmentos de trabalhadores e trabalhadoras da cultura é essencial para encontrar soluções e sentir a temperatura da realidade como instrumento de pensar políticas públicas alinhadas a necessidade dos segmentos do setor cultural e artístico.

A atipicidade do momento descarta a lógica pré-estabelecida da burocratização e do mercado. O tempo exige agilidade, inclusão, simplificação, prevenção e publicidade como prorrogativa republicana de transparência e acessibilidade.

Não vivenciamos uma normalidade por isso os parâmetros precisam ser sensivelmente diferenciados, o que exige ações intersetoriais e transversais das secretarias de cultura para lidar com a atual conjuntura, em que a proteção social e os direitos humanos sejam o norte da ação política.      

As experiências dos editais propostos até o momento, ainda são carregados de uma compreensão de produto, o que é um elemento excludente e descabível para as condições atuais e para o conjunto das linguagens artísticas e dos segmentos da cultura. O audiovisual por exemplo é linguagem que exige equipamentos, conectividade e conhecimento técnico, portanto não basta propor editais de exibição online como regra universal sem considerar a peculiaridade e a tipicidade do conjunto de trabalhadores e trabalhadores da cultura.

A transferência de renda direta é um dos caminhos, mas é o caminho que mais encontra barreiras na visão achatada de gestores públicos vislumbrados com  necessidade do “produto”. O que acaba sendo um contrassenso a necessidade de possibilitar condições de sobrevivência. O que é mais importante o produto ou a sobrevivência dos trabalhadores e trabalhadoras da cultura?      

Por outro lado, cada trabalhador e trabalhadora da cultura carregam uma narrativa de vida singular e coletiva que por si só já é conteúdo, indiscutivelmente, substancial para ser descoberto, potencializado e considerado como principal e essencial “produto”, enquanto possibilidade de refletir sobre a obra (produto), a partir do contexto sócio, histórico e econômico dos seus pensadores e feitores.

Foi esse por exemplo o viés de potência do Cultura Viva, da política de Estado dos Pontos de Cultura, reconhecer e redescobrir os saberes e fazeres plurais do nosso povo, a partir de uma visão para além do produto e que se insere em diálogos mais amplos de cultura e declaradamente inversa as visões  ultrapassadas,  excludentes e elitizadas  das caixas reducionistas  em que se  baseiam parte de gestores públicos comprometidos viseiras burocratizantes, mercadológicas  e desconectadas da realidade.

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