Ser comunista é questão de classe, não de idade

O presidente Lula acha que, quem chega aos 60, vai da esquerda para o centro político, ou da direita para o centro político. E que esse é o melhor caminho para o país. Ledo engano. Para citar vivos: Bornhausen continua direitista aos 69 anos. Niemeyer é d

Na noite de segunda-feira, 11 de dezembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse achar que faz parte da “evolução da espécie humana” as pessoas assumirem uma postura centrista, conforme envelhecem. Como é de seu costume, não teve papas na língua: ''Se você conhecer uma pessoa muito idosa e esquerdista, é porque ele está com problema. Se acontecer de conhecer uma pessoa muito nova de direita, também está com problema. Então, quando a gente tem 60 anos é a idade do ponto de equilíbrio. Porque a gente não é nem um nem outro. A gente se transforma no caminho do meio. Aquele caminho que precisa ser seguido pela sociedade''. Para ele, assim como quem é de direita, com o passar dos anos, “vai ficando mais de centro. Quem é mais de esquerda vai ficando social-democrata, menos à esquerda. E as coisas vão confluindo de acordo com a quantidade de cabelos brancos, de acordo com a responsabilidade que você tem. Não tem outro jeito''


 



Após ter sido eleito presidente da República pela primeira vez, em 2002, Lula disse que nunca foi de esquerda. Agora, diz, ou ao menos insinua, que foi de esquerda e que caminhou para o centro político. É seu direito. Somente a oposição de direita caracterizou seu governo e suas candidaturas como esquerdistas. Mesmos os comunistas nunca a trataram assim. Sempre advogaram que se trata de candidatura (e administração) democrática, de cunho popular, que envolve vários setores da sociedade, inclusive a esquerda e o PCdoB.


 


Mas há também que se discordar do sr. presidente da República. Tem outro jeito, sim, Lula. Karl Marx, o fundador do socialismo científico, morreu aos 63 anos, coerentemente de esquerda. Friedrich Engels que, com o autor de O Capital, estabeleceu as bases do materialismo histórico e dialético, e escreveu, quando jovem (menos de 30 anos, os dois) o Manifesto do Partido Comunista, faleceu aos 75 anos, ainda atuante como conselheiro e dirigente dos socialistas da Europa. Já não jovens de idade, aí estão Fidel Castro, aos 80 anos, e Oscar Niemeyer, que completa 99 anos neste dia 15 de dezembro, sempre reafirmando suas convicções de esquerda. Assim como João Amazonas, que se mantinha na Presidência de Honra do PCdoB, para orgulho dos militantes do Partido, jovens e velhos, quando morreu aos 90 anos, em maio de 2002 – e Lula publicamente agradeceu o papel por ele desempenhado na sua vitória na campanha presidencial, poucos meses depois. Ou ainda Apolônio de Carvalho, que expirou em 2005, aos 93 anos, fiel ao seu ideário. Ele ingressou no Partido Comunista nos anos 1930 e, com quase 70 anos, foi um dos fundadores do PT, partido no qual militava quando morreu.


 


Não são pessoas que estão “com problema”. Na verdade, o problema é outro, e foi publicamente explicitado por Vladimir Ilitch Lenin, o dirigente da Revolução Socialista da Rússia (este, morreu aos 54 anos – não chegou aos fatídicos 60 do “ponto de equilíbrio” lulista), que disse que é necessário se guiar por uma teoria revolucionária para não perder o rumo no desenrolar da luta de classes. E a questão é de concepção de classe e não de idade. Não de origem de classe somente – pois Lula tem sua origem nas classes trabalhadoras e sua vida profissional se deu como metalúrgico. Concepção, ideologia de classe. O que significa dominar a ciência social mais avançada, o marxismo. “Desde que o socialismo se tornou ciência, tem que ser tratado como ciência, isto é, tem que ser estudado”, ensinou o velho Engels.


 


Daí não se temerá fazer alianças com o ex-ministro da ditadura militar (Fazenda e Agricultura), Antônio Delfim Netto, por exemplo, de quem Lula disse: ''Eu agora sou amigo do Delfim Netto. Passei 20 e tantos anos criticando o Delfim Netto, e agora ele é meu amigo, e eu sou amigo dele”. Amizade, a pessoa faz com quem quiser, com quem lhe atrair a simpatia; mas, objetivando o socialismo, Lenin, em política, defendia não “renunciar a acordos e compromissos com possíveis aliados (ainda que provisórios, inconsistentes, vacilantes, condicionais)”. E, neste sentido, a realização de um governo de coalizão, envolvendo os mais variados setores em torno de um projeto de desenvolvimento do país, com soberania, distribuição de renda e aprofundamento da democracia, é perseguida por todas as classes e setores progressistas. E por comunistas de todas as idades.

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