Voto nulo é traição ao povo

No primeiro turno das eleições brasileiras várias correntes e personalidades de esquerda optaram pelo voto na candidatura de Heloísa Helena. Uma opção que, embora considere incorreta, deve ser respeitada pelos apoiadores de Lula. Afinal, a existência d

A nossa critica tem se dirigido, fundamentalmente, contra a estratégia política adotada. A candidata do PSOL, confundindo os campos em disputa, colocou no centro de sua campanha o ataque ao governo Lula e, praticamente, desconsiderou a existência da candidatura liberal-conservadora de Alckmin. Diria mesmo que, por razões diversas e inconscientemente, acabou se estabelecendo uma aliança tácita entre os dois extremos do espectro político brasileiro, para os quais interessava uma derrota político-eleitoral do governo Lula. Uma aliança na qual a grande (e única) favorecida foram as forças de direita. As festas que ocorreram na Casa-grande, após o anúncio do segundo turno, são provas incontestáveis disso.



A candidatura HH, incorreu no mesmo erro que se apontou nas outras concorrentes: não apresentou um claro programa para a sociedade e, como a oposição conservadora, concentrou-se numa retórica moralista pequeno-burguesa. O chamado “cretinismo parlamentar” expressou-se de maneira evidente no transcurso de toda campanha. Ou seja, procurou-se falar apenas o que a classe média queria ouvir e não ofender a consciência conservadora deste eleitorado. A campanha acabou sendo pautada pelos temas e ritmo impostos pela grande imprensa do Capital.
 


Aquela postura poderá, ainda, trazer conseqüências políticas nefastas, além de contribuir para maior despolitização das massas populares. Levará, entre outras coisas, que parte do seu eleitorado migre para a candidatura anti-Lula. Acredito que muitos eleitores já tenham feito este movimento na véspera da votação, o que explicaria o crescimento do número de votos do candidato tucano e certo esvaziamento nos do PSOL.



Se os erros políticos cometidos no primeiro turno foram graves, os que se anunciam para o segundo turno parecem ser de outra natureza e, por isso, devem ser condenados com maior firmeza. Diria mesmo que eles fogem do terreno do simples erro político e escorregam perigosamente para o da traição aos interesses do país e dos trabalhadores.



A campanha que se iniciou esta semana não comporta neutralidade e arroubos de independência diante das forças políticas e sociais em luta.


Ela só oferece duas alternativas: apoio à coligação representada pela candidatura Lula ou à de Alckmin. Objetivamente, uma posição de neutralidade significa tomar partido da segunda.



Nas primeiras declarações públicas após as eleições, Heloísa Helena parece não ter se dado conta do novo quadro que se abriu com a conquista pela direita de um segundo turno nas eleições brasileiras e continua na mesma toada, como se nada tivesse acontecido.



A senadora alagoana, entre outras coisas, disse que esta eleição representou a vitória do “banditismo político, da roubalheira, da corrupção, de tudo isso que aconteceu no Brasil”. Na sua retórica agressiva – e politicamente vazia – chegou a comparar Lula à Collor. “Talvez o povo de Alagoas tenha feito um protesto porque Lula roubou tanto ou mais do que ele e permaneceu no Palácio do Planalto”, disse ela.  Aqui as posições de HH, novamente, coincidem com as da direita golpista que queria fazer com Lula o que a esquerda fez com Collor em 2002.



Por fim, ela disse que votará nulo e, sem nenhuma consulta democrática, que seu partido não apoiará nem Lula nem Alckmin. Concluiu que votar em Lula “seria rasgar 12 anos de história e confronto político (…) contra a gangue partidária que virou o governo. Nossos eleitores são homens e mulheres livres. Não precisam da nossa indicação para escolher em quem votar”. Qual a conseqüência desta diretiva de liberar o voto, após dizer que Lula e o PT formam uma quadrilha? 



A direção do PSTU foi pelo mesmo caminho, não liberou o voto atacando Lula, mas conclamou a chamada Frente de Esquerda a se pronunciar e fazer campanha de massas pelo voto nulo. Este partido, em 2002, chegou a indicar o voto ao presidente Lula no segundo turno.



Não precisamos ser nenhum cientista político para saber a quem serve esta retórica pseudo-radical e moralista. Ela levará mais água ao moinho do principal inimigo do povo brasileiro na atualidade: a direita tucano-pefelista. Tais declarações receberão destaque na grande imprensa, especialmente nas de São Paulo.



Ao contrário do que tenta nos fazer crer, uma vitória de Alckmin não é uma coisa menor – uma simples mudança de governo, uma troca de “seis por meia dúzia”. Ela representará um acontecimento gravíssimo que terá impacto negativo na atual correlação de forças na América Latina e no mundo.



Alckmin vitorioso retomará o projeto da Alça, congelado no governo Lula, e contribuirá para o desmantelamento do mercosul; estabelecerá vínculos mais estreitos com a diplomacia do dólar, contribuindo para o isolamento político e econômico dos governos de Cuba, Venezuela e Bolívia. Com uma vitória tucano-pefelista estes países perderão um aliado e ganharão um adversário poderoso. Qual seria, por exemplo, a posição de um eventual governo Alckmin diante da reafirmação da soberania boliviana?



Alckmin retomará, em escala ampliada, o projeto de privatizações de nossas estatais e dos serviços públicos. Na mira dos tucanos já estão a Petrobrás, a Caixa Econômica Federal e a autonomia do Banco Central. Estas medidas privatistas anti-nacionais já foram defendidas pelos seus principais assessores.



A vitória tucano-pefelista representará um revés no processo de democratização da sociedade brasileira. Serão retomadas as tentativas de criminalização dos movimentos sociais, especialmente do MST, e se aprofundarão as reformas político-eleitorais conservadoras. Graças as reformas realizadas por FHC, a esquerda (PCdoB, PSOL, PSTU, PCB) não terão mais acesso ao tempo de televisão, ao fundo partidário, a possibilidade de constituir bancada e participar de comissões no parlamento. Medidas que somente poderão ser revertidas nos marcos de um governo democrático.



Para os trabalhadores estas coisas não são secundárias e justificavam plenamente o voto em Lula. Por isto, acredito, que parte considerável da esquerda democrática e socialista que caminhou com a candidatura de Heloísa Helena não será solidária com posições politicamente e socialmente irresponsáveis. Se depender dos comunistas e destes setores mais conseqüentes, no dia 29 de outubro, não haverá festança na Casa-grande e nem na Casa Branca.


 


“Em tempo: segundo a imprensa, ao contrário de HH, vários dirigentes do PSOL dizem que apoiariam Lula no segundo turno desde que ele assuma publicamente alguns compromissos, como o de arquivar os projetos de reforma trabalhista e sindical, garantia de que não haverá privatização da Petrobrás, do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal e nem será dada autonomia ao Banco Central. Outros ainda incluem no rol de reivindicação a não realização de uma reforma na previdência que prejudique os trabalhadores. Esta, me parece, são reivindicações justas que merecem ser estudadas pela coordenação da campanha de Lula e que deveria receber apoio da coligação A força do povo”.  

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