As ameaças à Constituição

Constituição

A Constituição de 1988, promulgada há exatos 32 anos, apesar das mutilações a que foi vítima ao longo do tempo, continua a ser um grande trunfo da nação brasileira. Essa importância se eleva nas circunstâncias de um governo de extrema direita, inimigo da democracia, traidor da pátria e carrasco do povo.

A Constituição é a viga mestre do regime democrático. É o fator de contenção ao projeto de Bolsonaro que visa a liquidação do regime democrático. Mesmo perdendo alguns dos traços que garantiram um relativamente longo ciclo de democracia, ela permanece como esteio do ideal republicano, alicerce da soberania nacional e dos direitos políticos e civis, a base do progresso social e dos fundamentos da nação.

Tudo isso está sob ameaça no governo Bolsonaro. Mas o que mais se sobressai, no sentido de desfigurar o caráter progressista da Constituição, é a emenda Constitucional 95, conhecida como “emenda do teto de gastos”. O objetivo explícito é criar uma fronteira instransponível entre o que o Estado pode fazer para cumprir a sua função precípua – como investimentos em saúde, educação e infraestrutura, além de fomentar o desenvolvimento nacional – e a garantia de que o circuito rentista não será interrompido, mesmo com o agravamento das crises econômica e sanitária.

É relevante constatar que para a sua aprovação foi necessário um golpe de Estado, a fraude do impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff. Por esse caminho, o Estado passou a ser domado pela Emenda Constitucional 95, no seu aspecto econômico, levando o país para impasses econômicos e para o arrocho orçamentário que castiga de forma perversa sobretudo os mais pobres.

A conta dessa irresponsabilidade social pode ser vista no recorde de desempregados, na recessão profunda, nos cortes de verbas do Sistema Único de Saúde (SUS) e nas investidas contra as verbas da educação. Há mais: com ela, o Estado perde a capacidade de funcionar como ente indutor do desenvolvimento soberano do país, por ficar impossibilitando de fazer os necessários investimentos públicos.

Já se falou inclusive em “descarimbar” as vinculações constitucionais estabelecidas, como no caso dos orçamentos da saúde e da educação. Não bastou a reforma da Previdência Social, que já está drenando uma dinheirama do Estado para o circuito rentista, que sempre serviu ao custeio da seguridade social e das aposentadorias.

Um exercício aritmético elementar conclui que esse modelo se opõe desenvolvimento social e ao progresso social, que deveriam ser a meta de qualquer programa para a economia brasileira – especialmente nesses tempos de crises. Ou seja: essa receita o Brasil conhece bem. Sua forma ultraliberal e seu conteúdo explicitamente neocolonial compõem um enredo que no passado levou o governo a viver de chapéu na mão em busca de ajuda externa para fechar suas contas, enquanto povo arcava com o peso da crise.

Agora, essa receita tem o componente político autoritário, com as ameaças constantes de Bolsonaro de liquidar o que resta de democrático e progressista da Constituição. Fica claro que a luta para a revogação da Emenda Constitucional 95 e a defesa da Constituição é o ponto de convergência de amplos setores democráticos e de oposição a este governo que representa uma ameaça explícita à legalidade democrática do país.