Por um salário mínimo para avançar na recomposição da renda

Como todas as coisas em economia, o debate nem sempre é técnico, mas político. Alias, combina a necessária matemática econômica com a luta de classes, isto é, a exigência dos trabalhadores para terem uma maior parcela no resultado de sua atividade produtiva.

É um confronto que, como as chuvas, tornou-se a marca do mês de janeiro – todo ano há um braço de ferro entre a sovinice da área econômica do governo e exigência das centrais sindicais de cumprimento do acordo feito com o governo em 2007 para garantir a recuperação do valor do salário mínimo e dos benefícios e pensões dos aposentados.

Para cumprir aquilo que é determinado pela Constituição, diz o Dieese, o valor do salário mínimo deveria ser, hoje, de R$ 2.227 – quatro vezes mais do que a proposta do governo para este ano, de R$ 540, ou quase isso (3,8 vezes) se for adotado o valor exigido pelas centrais sindicais, de R$ 580.

O debate ainda não envolveu diretamente a presidente Dilma Rousseff: as centrais querem marcar, na próxima semana, uma audiência com ela para discutir o assunto. Mas já tem os lances que são reiterados a cada início de ano.

Do lado da equipe econômica do governo, os argumentos são os mesmos, fundamentados na ideia neoliberal de “responsabilidade fiscal” e ancorados no respeito dogmático à letra do acordo de 2007. O critério estabelecido então era o de reposição da inflação do ano anterior mais a variação do PIB nos últimos dois anos. Como em 2009, devido à crise econômica mundial e também ao pessimismo de muitos empresários que reagiram a ela cortando investimentos, encomendas e empregos, o PIB brasileiro recuou e o percentual de aumento do mínimo para 2011 ficou assim “prensado” em 5,8%, resultando nos R$ 540 proposto pelo governo. Jogando, assim, sobre os ombros dos trabalhadores o custo de decisões empresariais erradas tomadas em 2008/2009.

Para as lideranças sindicais o aumento proposto é um despropósito inaceitável num período em que o crescimento do PIB beira os 8% e no qual quase a totalidade das categorias profissionais tiveram aumentos reais, acima da inflação, de salário nas negociações coletivas. Chega a ser um insulto: levando em conta medições mais precisas da inflação, há quem sugira mudar o valor para R$ 545! Estes cinco reais a mais não pagam nem mesmo duas passagens de ônibus na cidade de São Paulo.

Se prevalecer a proposta do governo, o risco para os trabalhadores é de perda dos ganhos de 2010. Há notícia de um estudo dos técnicos do governo para um mínimo de R$ 560, através da antecipação do aumento de 2012, outra proposta que também acarreta perdas para os trabalhadores pois já fixaria o mínimo de 2012 em R$ 616; sem a antecipação, esse valor ficaria, estima-se, em R$ 636. Além do mínimo de R$ 580, as centrais querem também o reajuste de 10% os benefícios dos aposentados e pensionistas que superem o valor do mínimo, a correção da tabela do imposto de renda pelo menos pelo índice da inflação.

Isto é, o governo Dilma começa com um embate com os trabalhadores cujo resultado vai fortalecer, ou não, a convicção de que este é um governo que veio para avançar nas mudanças.