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João Cony: Revolução

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Eu não vou parar nas páginas policiais.



Eu não sou um direitista neoliberal.



Diariamente eu vejo homens e mulheres trabalhadores no impasse irregular de seus subempregos.



Diariamente eu vejo nas ruas a sangria nas expressões das crianças que pedem, pedem, pedem e perdem.



E eu vou pegar em armas se me derem motivos pra isso.



Todos os dias raros de arte, cultura e lazer eu vejo a massa sofrer.



Todos os dias as mazelas carregadas em nossos peitos ofegantes do desprazer.



Sem a fraternidade nos abraços, me vingo com a fúria no cumprimento do meu não-olhar.



Sem a fraternidade de quem se sabe desigual, eu luto pelo ideal de um mundo menos animal.



E eu vou pegar em armas se me derem motivos pra isso.



Calados, seremos milhões de desunidos.



Gritando, seremos ex-desvalidos.



Famílias desfeitas, doenças, adolescentes com raiva da falta de oportunidades presos todos os dias por cavalos sobre cavalos que nos arrastam das calçadas para dentro de suas celas.



Caos e redenção se fundem.



Rebeldia e apatia rimam.



A internet nos distancia do aroma da mulher amada.



E apesar da cruel liberdade cega, surda e muda, eu ainda sonho em criar meus filhos sobre este solo que nunca muda.



E eu vou pegar em armas se me derem motivos pra isso.


 


João Cony, gaúcho, nasceu 1978, é estudante de letras, músico e escritor. Teve textos classificados na 5ª Bienal da UNE. Publicou: “Criaturas de você mesmo”, poemas e contos.