Stairway to Heaven e a Dama do Paraíso

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Há uma mulher que acredita que tudo o que brilha é ouro. E ela vai comprar uma escadaria para o paraíso, e quando chegar lá, ela sabe que se as lojas estiverem fechadas, com uma só palavra ela conseguirá o que foi buscar.

Essa é a apresentação da misteriosa figura feminina que percorre toda a narrativa da letra de “Stairway to heaven”, escrita por Robert Plant em sua casa de campo, perto das montanhas galesas, Inglaterra, no começo da década de 70.


Naqueles psicodélicos anos em que muitas composições se estruturavam em conceitos filosóficos de alquimia, de mundos abstratos e seres imagináveis, Plant tinha um livro de predileção, “Artes Mágicas na Inglaterra Céltica”, de Lewis Spence, um escocês nascido no final do século 19, jornalista e estudioso de ocultismo. Sua obra, de mais de trinta títulos, explora temas ligados a mitologia, lendas, mistérios da Grã-Bretanha antiga, evidências da Atlântida e outros mundos perdidos.


Escrito em 1905, o livro foi inspiração para o vocalista do Led Zeppelin, que teve a letra musicada por Jimmy Page, em uma perfeita química – ou alquimia – entre enredo e melodia, formatada em uma introdução acústica, um andamento renascentista com violão e flauta, e a sequência com instrumentos elétricos, em riffs operísticos de guitarra e baixo de rock progressista que completam os 8 minutos e 2 segundos de duração.

Page era igualmente fascinado por magias, ocultismo, tinha até uma livraria dedicada ao tema, The Equinox Booksellers and Publishers, em Londres.


Apesar da demonstração preambular da fascinante imagem feminina, a letra não segue uma descrição linear, nem sequer identifica quem seja a personagem, se uma fada, ou deusa, ou bruxa, apenas deixa claro, nos versos que se fragmentam em expressões e símbolos, sua capacidade de vencer qualquer obstáculo (“if there’s a bustle in your hedgerow”), seu interesse de união, paz (“don’t be alarmed now”), a pretensão de extrair o mal entre os seres (“it’s just a spring clean”), e para realizar seu intento compraria uma escada para chegar ao paraíso (“she’s buying a stairway to heaven”). A certa altura da letra, Robert Plant cita May Queen, e sem aprofundar, remete como pontuação e referência a personificação da rainha ligada ao culto das árvores, celebrada na primavera, uma tradição da Inglaterra da Idade Média.


É a última canção do lado A do álbum “Led Zeppelin IV”, um clássico do rock e um dos mais vendidos da banda. A batida pesada de “Black dog”, é a abertura perfeita do estilo marcante do grupo que se esmerou em melodias fundindo o que alguns chamam de jazz-rock com a eletricidade do gênero, expondo nas faixas seguintes as variações sobre um mesmo tema que o rock proporciona.

“Stairway to heaven” teve dezenas de versões, da balada rhythm and blues de Pat Boone ao rock clássico-concreto de Frank Zappa, passando pelo elétrico jazz fusion de Stanley Jordan.

No começo de 2014, com a música já consagrada na história do rock, Mark Andes, baixista da extinta banda psicodélica norte-americana Spirit, acusou Led Zeppelin de plágio, apontando que a melodia inicial de “Stairway to heaven” foi copiada da canção “Taurus”, composta pelo guitarrista Randy California, gravada na faixa de abertura do primeiro disco, de 1968. O caso se arrastou pelos tribunais até 2016, quando o juiz determinou que as similaridades da sequência de acordes não configuravam apropriação.

A composição de Plant e Page é a única que tem a extensa letra no encarte do disco, que hoje completa 49 anos do lançamento. “And if you listen very hard / the tune will come to you, at last”, como sugere o eremita no desenho de Barrington Colby, lado inferior esquerdo, sobre as intenções da misteriosa dama.

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