Parte da mídia, como a direita, nunca aceitou a vitória de Lula, diz Renildo Calheiros
Numa breve análise feita antes da batalha final pelo Palácio do Planalto, o deputado federal reeleito em Pernambuco pelo PCdoB, Renildo Calheiros, salienta que a direita brasileira “é sempre atenta a qualquer movimentação no sentido da corrupç
Publicado 27/10/2006 22:20
Nos últimos dias que antecedem a disputa pela presidência da República, ganhou força, especialmente na Internet, o debate sobre a atuação da mídia e da direita durante as eleições deste ano. O fato mais emblemático foi a divulgação, às vésperas do primeiro turno, das fotos do dinheiro apreendido com petistas que supostamente seria usado para a compra do dossiê contra tucanos.
Mas também ganha espaço o debate sobre a reforma política e a cláusula de barreira. Numa breve conversa com o Vermelho, o deputado federal reeleito pelo PCdoB/PE, Renildo Calheiros, que foi líder do partido na Câmara em 2004 e 2005, fala sobre oposição, mídia e reforma política. Confiante na continuidade de Lula frente ao Palácio do Planalto, o parlamentar diz que “no que pese estes ataques, o presidente está tendo uma contundente vitória. O povo, analisando, os fatos tomou um lado: o lado do presidente”. Confira abaixo os principais pontos dessa conversa.
Qual a sua análise sobre o modus operandi da direita brasileira?
Essas forças de direita são muito capazes politicamente quando estão no poder, mas quando estão de fora do governo são muito intolerantes e sempre pegou pesado contra governos dos quais não participou. Foi assim com Getulio, Juscelino, Jango e está sendo com Lula.
Na verdade, eles foram surpreendidos. A oposição achou que o governo ficaria enredado numa incapacidade de gerir o país e que talvez não chegasse ao final. Contrariando estas expectativas, Lula seguiu em frente e fez um bom governo, desenvolveu políticas sociais importantes e o país voltou a crescer ainda que em patamares modestos. O governo conseguiu controlar a inflação, está baixando a taxa de juros, que passou de 25% para 13,75%, uma redução grande embora a taxa ainda esteja alta. Além disso, retomou investimentos importantes no setor público, procurando responder à demanda que o país tem em infra-estrutura, de forma que a oposição não teve como combater o governo. Passaram dois anos atordoados, sem saber o que fazer. Até que surgiram esses fatos que a imprensa batizou de mensalão e que na verdade era um esquema conhecido por eles, que eles operaram, por isso sabiam. A direita brasileira é sempre atenta a qualquer movimentação no sentido da corrupção porque ela é altamente corrupta e conhecedora do sistema. É como diz o ditado popular: quem disso usa, disso cuida.
Mas houve erros de pessoas do PT…
Houve pessoas do PT que revelaram imaturidade, ingenuidade e diria até certa precariedade e acabaram alimentando com fatos esse objetivo da direita, de estruturar um discurso para atacar Lula moralmente já que programaticamente, não havia o que dizer.
Esse desejo da direita juntou-se ao desejo da mídia brasileira, que traz em si dois elementos: o primeiro é a necessidade de dar projeção aos erros do governo;o segundo é enfraquecer o governo porque parte da mídia, como a direita, nunca aceitou a vitória de Lula. Então, na medida em que pessoas do PT cometiam erros e davam o gancho, eles aproveitavam para fazer disso a agenda do país. A nossa imprensa não discute outra coisa a não ser os erros do PT e do governo. Mas a economia, no geral, vai bem e o povo tem sentido grandes melhoras em sua vida. A isso, soma-se a percepção do povo sobre a luta política em curso e a popularidade do presidente. No que pese estes ataques, o presidente está tendo uma contundente vitória. O povo, analisando, os fatos tomou um lado: o lado do presidente.
Com relação à cláusula de barreira, o projeto de lei 6892/06, de sua autoria, propõe que se mantenha apenas um dos índices impostos pela regra que passa a vigorar neste ano. Como está a tramitação desse projeto?
A cláusula é velha e progressiva e os 5% entram em vigor agora. Ela é a combinação desta exigência com o item que exige 2% dos votos em nove estados. Nosso projeto troca o “e” do texto pelo “ou”, de maneira que se considere ou o índice de 5% ou o de 2% em nove estado. Mas, não foi possível votar o projeto neste ano e agora fica mais complicado porque o PV, por exemplo, já não conseguiria se encaixar em nenhum dos índices. O país inteiro aguarda uma reforma, o Congresso quer fazer, os dois candidatos, Lula e Alckmin, falam sobre o assunto. Dentro dessa reforma, devemos remover tudo o que é entulho autoritário como a cláusula. Nós topamos regras e exigências, mas desde que elas não firam o princípio de organização partidária. Entendemos ainda que a cláusula é inconstitucional, e se não encontrarmos caminho na negociação política, vamos ao Supremo. Neste sentido, a eleição de Lula é importante porque colocaria esta discussão na ordem do dia.
Há quem avalie que o voto distrital aproxima eleitores e parlamentares. Como você avalia o voto distrital?
O Brasil já tem uma espécie de voto distrital porque não temos o voto nacional. O voto é dado dentro do estado formando bancadas estaduais dentro do Congresso, ou seja, são 27 distritos. Agora, dentro do distrito, temos o voto proporcional e não majoritário como no distrital clássico e estão tentando fazer com que o voto deixe de ser proporcional. Nossa cultura é de votos proporcionais porque isso torna a Casa mais democrática, de maneira que não apenas o setor majoritário, os senadores, tenha representação, mas também os deputados eleitos proporcionalmente. Hoje temos representantes de segmentos variados e importantes de nossa sociedade, como por exemplo os verdes e os comunistas. Essa maior representatividade é resultado da proporcionalidade. Essa tese de que o voto distrital, que representaria cidades, aproximaria parlamentares e a população não corresponde à realidade. Um exemplo é o cargo de vereador, que em tese é o mais próximo da população que o elege. E não há uma relação direta entre vereador e eleitor simplesmente pela proximidade. O que aproxima é a atuação mais programática do parlamentar e isso se dá com o fortalecimento dos partidos.
De que tipo de reforma política o Brasil necessita para garantir a participação democrática das várias correntes ideológicas brasileiras e, ao mesmo tempo, assegurar o melhor funcionamento político no país?
Acho que nossa reforma precisa trazer mais e não menos democracia. Precisamos acabar com a influência do poder econômico no processo eleitoral, um grave problema que deve ser combatido com o financiamento público exclusivo de campanha. Outro ponto é estabelecer um debate mais programático e isso você faz com a votação em lista. Com essas duas mudanças, de quebra ainda se consegue resolver o problema da fidelidade partidária sem ser autoritário.
De São Paulo,
Priscila Lobregatte