Ministro do Trabalho e CUT já admitem FGTS na compra de ações

Por André Barrocal
Proposta de sindicalistas que receberam dinheiro da Bolsa de Valores teve aceno favorável do ministro Luiz Marinho e do presidente da CUT. Acordo pode liberar R$ 8 bilhões das contas individuais do FGTS para especulação com ações.

O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, e a Central Única dos Trabalhadores (CUT) estão dispostos a ceder à exigência da Força Sindical e da Central Geral dos Trabalhadores (CGT) e aceitar que o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) financie especulação na Bolsa de Valores. Força e CGT, cujos presidentes receberam dinheiro da bolsa na última eleição, defendiam uma regra que liberaria R$ 16 bilhões das contas individuais do FGTS para a compra de ações. A proposta favorita neste momento libera R$ 8 bilhões.


 


O aceno favorável de Marinho, ex-presidente da CUT, e do atual presidente da entidade, Artur Henrique da Silva Santos, à Força e à CGT foi feito nesta segunda-feira (12), durante uma reunião na capital da República. Pela segunda vez, o ministro conversou com as centrais sindicais sobre a proposta do governo de se criar um fundo com R$ 5 bilhões de sobra do FGTS e direcioná-lo para investimentos em estradas, energia, saneamento, ferrovias e portos.


 


Força e CGT foram ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a idéia. Para desistir da ação, querem aval para o trabalhador especular na Bolsa da Valores com o FGTS e garantia de que o patrimônio do Fundo de Garantia não será afetado.


 


Depois da reunião, em entrevista à imprensa, o ministro admitiu publicamente a disposição para ceder. “A valorização do mercado de capitais é bom para o País”, afirmou Marinho. Para reforçar a disposição, ele salientou que a idéia de autorizar trabalhadores a comprar ações com o FGTS já foi defendida pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, quando este presidia o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).


 


Silva Santos admitiu apoiar a proposta, desde que o FGTS financie apenas a compra de ações de empresas que respeitem direitos trabalhistas e a liberdade sindical. A lista das empresas nestas condições seria definida pelas próprias centrais.


 


Depois da primeira reunião com as entidades, no dia 6 deste mês, Marinho tinha deixado claro que era contra o uso do FGTS na bolsa, embora tivesse dito também que encamparia a proposta, caso as centrais fizessem um acordo entre si. Argumentara que compra de ações não gera empregos e só favorece empresas já existentes, que não precisariam de mais apoio.


 


Silva Santos também havia se mostrado contrário. Para ele, o dinheiro do trabalhador não deveria financiar especulação na bolsa, nem era esse o espírito da proposta do governo de usar o FGTS para incentivar o crescimento do país. Dizia ainda estranhar a relação entre a reivindicação e o financiamento eleitoral recebido por dirigentes das centrais rivais.


 


Doações da bolsa e ação judicial
Os presidentes da Força, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, e da CGT, Antonio Carlos dos Reis, o Salim, receberam doações da Bolsa de Valores (Bovespa) no ano passado, quando concorreram a uma vaga de deputado federal. Paulinho ganhou R$ 81 mil e Salim, R$ 112,5 mil.


 


A estratégia dos dois sindicalistas de ir ao Supremo contra a proposta do governo parece ter facilitado a tentativa deles de emplacar a idéia sobre a compra de ações. Marinho, que chegou a dizer que a ação no STF era de “encomenda”, agora nega que haja interferência dos interesses da bolsa nas conversas com os sindicalistas. “Não há nenhuma contaminação deste ambiente”, afirmou.


 


Paulinho voltou a dizer que não há conexão entre os fatos – doação e reivindicação/ação. “Sou defensor do investimento em bolsa, isso socializa o capitalismo. Mas não estou fazendo cavalo de batalha. Se o governo não quiser…”, declarou. Para se defender, Paulinho disse ainda que políticos do PT, principal partido do governo, também receberam doações da bolsa.


 


Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o presidente do PT, deputado federal Ricardo Berzoini (SP), foi agraciado com R$ 40 mil da bolsa e da irmã gêmea dela, a Companhia Brasileira de Liquidação e Custódia (CBLC). A mulher do ministro Paulo Bernardo (Planejamento), Gleisi Hoffmann, que não se elegeu senadora pelo Paraná, ganhou R$ 40 mil da dupla.


 


Apesar do clima agora favorável à idéia sobre o FGTS na Bolsa de Valores, a proposta que será discutida entre as centrais envolve quantias menores do que a reivindicação de Força e CGT. As duas queriam a liberação de 10% das contas individuais do FGTS para a compra de ações, mas agora se fala em 5%.


 


De acordo com o presidente da CUT, a formatação da regra sobre aplicação do FGTS em bolsa será debatida em seminários com a Bolsa de Valores e a Caixa Econômica Federal.


 


Depois do aceno favorável do ministro do Trabalho e da CUT sobre a especulação na bolsa, Paulinho afirmou que vai procurar o ministro do STF encarregado de analisar a ação da Força e da CGT, Celso de Mello. Segundo o deputado, a conversa servirá para informar o relator sobre o andamento das negociações com o governo, gesto que sugere que Força e CGT admitem abandonar a ação.


 


O principal argumento das centrais na ação é o de que não haveria proteção ao patrimônio do FGTS, caso as obras financiadas pelo fundo novo, na área de infra-estrutura, dêem prejuízo. Marinho disse que o governo não pode dar garantias por escrito, porque isso é proibido pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), órgão fiscalizador do funcionamento de fundos de investimento.


 


Apesar de ter tido mais uma reunião com as centrais, em que alguns acordos começam a ser encaminhados, Marinho afirmou que o governo nem precisa de entendimento prévio com elas, porque quem decidirá sobre o assunto será o Congresso. A criação do fundo para infra-estrutura foi feita via medida provisória (MP), que precisa ser votada na Câmara e Senado. “Não há necessidade de diálogo com as centrais. Não estou obrigado a fazer esse acordo com eles. Quem tomará a decisão é o Congresso”, disse.


 


Mesmo enfatizando que a palavra final é do Congresso, o ministro admite que acertos preliminares com as centrais facilitariam a aprovação da MP. Isso porque as centrais influenciam parlamentares. O próprio presidente da Força, Paulinho, é deputado federal (pelo PDT de São Paulo). Ele é um dos vice-líderes do bloco composto por PSB, PCdoB e PDT, partidos aliados do governo que se juntaram para ficar mais fortes em negociações no Congresso.