Faculdade do Trabalho é pensada por MTE, Dieese e centrais
Criar uma faculdade com foco em desenvolvimento e trabalho, além de um sistema de formação de quadros políticos foi o principal tema do encontro entre o ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi, e o presidente do Departamento Intersindical de Estatísti
Publicado 07/11/2007 19:02
O projeto vem sendo desenvolvido por seis centrais sindicais em parceria com a entidade, e o MTE agora vai estudar a realização de um convênio entre a Secretaria de Política Pública e Emprego (SPPE) e o Dieese para colaborar com o programa. O objetivo é criar uma faculdade aberta ao público, priorizando militantes e dirigentes sindicais, com certificação em nível superior. Para atuar em todos os estados, a faculdade deve firmar convênio com as universidades públicas.
“Considero um projeto muito interessante e que vai ajudar tanto na capacitação política quanto na profissional. O país precisa de instituições como esta”, destacou o ministro.
A presidente da UNE, Lúcia Stumpf, apoiou a iniciativa. “No essencial, todas as medidas que visem a qualificar os trabalhadores por um país com mais desenvolvimento social são sempre bem vindas e positivas. Mas essas medidas não devem substituir, ou se sobrepor, ao papel das universidades brasileiras, que lutamos para que sejam capazes de cumprir essa função: a de garantir pesquisa, ensino e extensão a serviço das soluções dos grandes dilemas por que passa o povo brasileiro, inclusive essa necessidade de termos maior qualificação profissional para os trabalhadores”, disse ela ao Vermelho.
A propósito deste tema, leia os artigos abaixo ''Qualificação'', de João Guilherme Vargas Netto, e ''Qualificação e remuneração'', de José Pastore.
Qualificação
Por João Guilherme Vargas Netto*
O jornal O Globo começou a publicar no domingo, dia 28, uma série de reportagens e materiais com o título provocativo “Apagão de mão-de-obra”.
Assim começa a série: “somos 183 milhões de brasileiros. Em idade para trabalhar, 125 milhões e, por incrível que pareça, falta gente para o país crescer. Depois de duas décadas com a economia rateando, bastaram três anos de crescimento forte e contínuo para as empresas esbarrarem na dificuldade de encontrar profissionais qualificados”.
Qualificação, esta é a palavra chave.
É preciso qualificar os trabalhadores com educação formal (escolar) e educação profissional. Um grande esforço deve ser feito para, juntamente com a luta pelas reivindicações salariais e pela melhoria das condições de trabalho, obter-se a qualificação da mão-de-obra.
É incompreensível, por exemplo, o corte indiscriminado de recursos do governo federal para o treinamento e qualificação de trabalhadores. Ao contrário de serem cortados, estes recursos devem aumentar e serem colocados a serviço de amplos programas de formação, de treinamento e de qualificação.
Se isto é verdade, no que se refere à economia e à situação dos trabalhadores, é mais verdade ainda quando nos referimos ao próprio movimento sindical.
Em uma conjuntura favorável, com bandeiras de luta que vão se concretizando na prática, o diferencial para o movimento, ou seja, aquilo que determinará o alcance das vitórias é a própria qualificação dos ativistas e dos dirigentes.
Este deve ser o tripé no qual o movimento sindical se apóia: unidade de ação, mobilização de base e qualificação profissional e sindical.
(*) João Guilherme Vargas Netto é membro do corpo técnico do DIAP e consultor sindical de diversas entidades de trabalhadores em São Paulo.
Qualificação e remuneração
Por José Pastore*
Com o aquecimento da economia global, nota-se um aumento de salários de pessoal qualificado em quase todas as regiões do mundo.
Entre 2006 e 2007, os salários do pessoal qualificado subiram 8% na China e 6% na Índia, descontada a inflação (''Salary growth'', The Economist, 31/3/07).
Os salários nos países mais avançados também subiram, mas de forma moderada. Esse é o caso do Japão (2%), Inglaterra (1,8%), França e Itália (1,7%) e Alemanha (1,5%).
Teria chegado então a esperada convergência salarial entre os países emergentes e os avançados? Os bens e serviços dos primeiros ficarão mais caros? É o fim do ''dumping social''?
As vantagens comparativas dos emergentes não decorrem apenas de salários e sim de tributação, juros e subsídios favoráveis. Antes de se concluir pela chegada da convergência convém lembrar que a base sobre a qual os aumentos incidem é muito baixa. O salário médio na indústria da China é cerca de US$ 0,64 por hora, em média.
Para o pessoal qualificado é de aproximadamente US$ 1,50. Na Índia dá-se o mesmo. Um contador que processa milhares de declarações de imposto de renda de americanos por meio da Internet, ganha cerca de US$ 400 mensais.
Esses salários estão muito longe dos praticados nos países ricos. No Japão, o salário médio na indústria é de cerca de US$ 18,00 por hora; nos Estados Unidos, US$ 21,00 e na Alemanha, US$ 30,00. No caso de profissionais especializados, esses salários são ainda mais altos. Nos Estados Unidos, o contador da Índia ganharia cerca de US$ 3.000 mensais. São diferenças enormes que, mesmo com os aumentos registrados, levarão muito tempo para convergirem.
No Leste Europeu, em especial, na Polônia, Hungria, Bulgária e Romênia os salários de 2007 também subiram. No setor da construção da Bulgária, por exemplo, a elevação foi de 20% (''Eastern Europe hit by shortage of workers'', Financial Times, 5/6/2007). Mas, lá também, a base é muito baixa. O salário médio na indústria da Polônia, Estônia e Eslováquia é de aproximadamente US$ 3,80 por hora. Na Lituânia é de US$ 3,00.
Convergência salarial
Em outras palavras, serão necessários muitos anos para se chegar à esperada convergência salarial. A China acaba de fazer uma pseudo-reforma trabalhista que pode, eventualmente, elevar o custo do trabalho. Digamos que ele dobre, passando de US$ 0,64 para US$ 1,30. Isso continua muito longe da situação do Japão, América do Norte e União Européia.
O Brasil também apresentou um expressivo crescimento dos salários no primeiro semestre de 2007. Neste caso, o aumento decorreu de uma combinação perversa da falta de mão-de-obra qualificada com a valorização do real.
O rendimento médio mensal em fevereiro de 2007 foi de R$ 1.096 – cerca de 6,6% superior ao verificado no mesmo período de 2006 (IBGE, ''Pesquisa Mensal de Emprego'', março de 2007). Transformado em dólar, o salário médio foi de US$ 523. Levando-se em conta o comportamento da taxa de cambio, o aumento em dólares entre 2006 e 2007 foi de 10,7%. No caso do pessoal especializado, a média salarial na indústria é de R$ 2.020 mensais, ou seja, US$ 1.000 o que dá cerca de US$ 4,83 por hora.
Isso mostra que o custo do trabalho do Brasil está bem abaixo dos países desenvolvidos e bem acima dos países emergentes. É exatamente com eles que se dá a competição feroz nos setores de calçados, tecidos, confecções e mobiliário, onde o Brasil perde espaço no comércio internacional.
O salário médio de US$ 0,64 por hora da China está muito longe dos US$ 4,83 praticados no Brasil. Há casos ainda mais graves. O Vietnã tem um salário médio industrial de US$ 0,28 por hora! Com isso, aquele país está atraindo investidores e entrando no comercio internacional de forma acelerada, em especial, em confecções, sapatos e tênis.
Não há porque propor uma redução do salário nominal no Brasil. Para o nosso custo de vida, a média dos salários é baixa. Assim sendo, convém pensar em preservar o salário (e até aumentá-lo) e reduzir as despesas de contratação que chegam a 103%.
Um Simples Trabalhista poderia ajudar muito nesse campo, em especial as empresas de pequeno porte que mais sofrem nos setores de confecções, calçados e mobiliário. Seria melhor do que o sistema de subsídios recém adotado pelo governo federal.
*Sociólogo, especialista em relações do trabalho e desenvolvimento institucional, professor (aposentado) da Faculdade de Economia e Administração da USP. É membro efetivo da Academia Paulista de Letras.