José Pimentel:”É absurdo o que o Banco Central fez”

Na primeira da série de entrevistas realizadas pelo projeto “O Povo Quer Saber”, o deputado federal José Pimentel (PT) respondeu a questões desde reforma tributária e alta dos juros à viagem do governador Cid Gomes (PSB) à Europa no carnaval. Sobre est

Relator geral do Orçamento da União de 2008, o deputado disse que não “se justifica” em nenhum setor da economia, o aumento de juros realizado pelo Banco Central, afirmando que o real motivo para tal aumento, seria o barateamento nos serviços bancários.


 


Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista, que contou com a apresentação do jornalista Erick Guimarães, e participação, como entrevistadores, dos jornalistas Guálter George, Érico Firmo, Ana Cristina Cavalcante e Jocélio Leal.



 


Queria começar o programa perguntando sobre o reajuste das verbas de gabinete da Câmara dos Deputados, reajustada em 15%. Este reajuste, deputado, era necessário?
Veja, o último reajuste de servidores da Câmara Federal que assessoram diretamente os 513 deputados federais foi em 2005. Enquanto isso, nós tínhamos lá em 2005, também aprovado, para os servidores de carreira da Câmara, do Senado e também do Poder Judiciário e do Tribunal de Contas da União, o Plano de Cargos e Carreira – e vai até 2009. Ou seja, 2006, 2007, 2008 e 2009. O que se está fazendo ali é uma reposição do poder de compra e é bom registrar que os servidores civis da União tiveram, nos primeiros quatro anos do Governo Lula, o reajuste mínimo de 30% e máximo de 417%. Exatamente por isso, a folha da União, que somava R$ 75 bilhões em 2003, em 2007 somou 128 bilhões e está indo para R$ 137 bilhões em 2008. Ou seja, uma folha que sai de R$ 75 bilhões e vai para R$ 137 bilhões, isso demonstra que o reajuste foi significativo em todos os setores do serviço público, seja do Poder Judiciário, do Poder Legislativo e do Poder Executivo.


 


Houve uma crítica ao Governo Federal que diz respeito aos chamados gastos públicos. Em que medida o Governo está sendo pouco rigoroso nestes gastos públicos?
Os dados que estão liberados, dentro do sistema Siape da CGU, dos vários sistemas de controle e da Secretaria do Controle Nacional, demonstram de que esses gastos continuam proporcionais ao PIB. Por exemplo, em 1995, a folha representava 5,7% do Produto Interno Bruto. Em 2008, ela representa 5,72%. Num período muito longo, percentualmente se mantém o mesmo perfil. Ao lado disso, nós tínhamos um processo de terceirização muito forte do aparelho do Estado. Este pagamento sobre terceirizados acabava aparecendo sobre outras despesas. O Governo Lula está fazendo a política de substituição de terceirizados por servidores públicos. Por exemplo, nos primeiros quatro anos, foi dada posse a 82 mil servidores públicos federais. Desses, 30.011 eram terceirizados e foram substituídos. Nesse 2008, está autorizado a contratar 56 mil servidores públicos federais nos três poderes. Desses, 16 mil são terceirizados.


 


O senhor falou em reposição da inflação e a gente vive um momento no País, onde existem programas de transferência de renda, ampliação do crédito – o que tem movimentado a economia – mas não se vê claramente nenhuma política que sinalize avanço na elevação da renda que não seja transferida, como Bolsa Família. O senhor não acha que a gente já está pronto para dar esse passo à frente?
O primeiro registro de que um dos setores que alavanca o mercado nacional e, conseqüentemente, transfere renda e agrega valor à nossa economia é a micro e pequena empresa. Em 2003, nós aprovamos a reforma tributária – que é a Emenda Constitucional 42 – ali determinamos que as pequenas e micro-empresas teriam todo um ordenamento diferenciado por lei complementar para que pudéssemos legislar em nome dos municípios, dos Estados e da União. Aprovamos a Lei Complementar 123, em dezembro de 2006. Ali, nós tínhamos 1 milhão e 337 mil micro e pequenos empreendedores, inscritos no Simples Federal. Agora, no dia 28 de fevereiro, quando nós encerramos o primeiro ciclo, tivemos 3 milhões 420 mil micros e pequenos empresários pedindo a sua inscrição no Simples. Foram homologados 2 milhões e 920 mil e temos aí em torno de 500 mil micros e pequenos empreendedores que foram negados, levando em consideração três fatores básicos: o primeiro deles é quanto à localização em que funciona esse micro e pequeno empreendedor. De um modo geral, são terras não regularizadas nas Regiões Metropolitanas. No segundo grande grupo é que nós colocamos um erro, colocando que para se inscrever no Simples Nacional precisava estar em dia com todos os tributos municipais, estaduais e federais. O terceiro fator é exatamente a dificuldade que nós ainda temos na integração do Cadastro Único.


 


O senhor não teme que isso possa gerar uma falência das famílias por conta do excesso de créditos, não teme que isso possa gerar uma crise no futuro?
Todas as economias conseguiram se desenvolver e, ao mesmo tempo, criaram mercado nacional, a partir do crédito. Você tem poupança e tem crédito. Em 2003, o crédito do Brasil apresentava 22% do PIB, chegamos a 34% em 2007 e queremos chegar a 50%.


 


O senhor recém-saiu da experiência como relator-geral do Orçamento. Quais ensinamentos tirou para identificar erros e acertos. Que visão o senhor tem hoje desse processo para que ele possa ser melhorado, com menor risco de fraude?
Temos no Ocidente duas grandes experiências de elaboração do Orçamento. Nos países do Direito Consultivo, que é o caso do Brasil, da França, da Itália, da Espanha, da Alemanha, nós temos essa estrutura de comissão permanente para elaboração de três peças básicas – o Plano Plurianual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e o Orçamento Anual da União – que se integram. E temos experiências dos países que se baseiam no Direito costumeiro, no caso dos Estados Unidos e da Inglaterra. Eles não têm comissão permanente do Orçamento e a peça orçamentária é discutida dentro das várias comissões da própria Casa e ali vai à sanção presidencial, no caso, dos Estados Unidos. No Brasil temos um processo de aprimoramento, até 1988 basicamente não se discutia orçamento. Agora em 2007, tomamos uma série de medidas no sentido de aprimorar e fechar alguns ralos, que na nossa leitura, terminavam levando ao desperdício de recurso público. Um deles é exatamente a distribuição da sua feitura em dez grandes grupos temáticos para que tenha mais facilidade de dialogar com o pacto federativo, com os poderes e com a sociedade, a separação do relator de receitas e do relator de despesas e do relator geral. E, ao mesmo tempo, impedir a continuidade dos membros daquela comissão. Ou seja, você tem mandato de um ano e não volta. Nós tínhamos parlamentares ali que estavam há dez, doze, quinze anos na Comissão do Orçamento. Aliás, não sabia fazer outra coisa no Congresso Nacional a não ser cuidar do Orçamento.


 


Mas o orçamento hoje é autorizativo, ou seja, o Congresso diz “pode gastar tanto” e o Executivo gasta se quiser. Nesse contexto, abre-se uma grande brecha que é a possibilidade de você realizar obra e deixar para gastar, segurar o empenho do pagamento, durante muitos meses. Isso deixa porta aberta para a corrupção. Não seria mais fácil se nós tivéssemos um Orçamento impositivo ?
O nosso Orçamento é, 91%, vinculado. É impositivo. Apenas 9% é autorizativo. São imposições, que nem o presidente da República, nem o Congresso Nacional, nem o Poder Judiciário, pode alterar. Exceto se modificar a Constituição brasileira.


 


A gente viu essa semana o retorno de uma polêmica que desde 2005 vinha silenciada que é a disputa entre Banco Central e Ministério da Fazenda em torno da taxa de juros. Veio um aumento maior do que o que se esperava. O senhor acha que havia necessidade de aumentar os juros para conter inflação ou isso vai ser ruim para as contas públicas e para o País como um todo?
Nós votamos, no mês de fevereiro, o Orçamento Geral da União e no Congresso no dia 12 de março. Todas as análises dos mais variados agrupamentos políticos do Congresso Nacional e das audiências públicas que nós fizemos demonstram que a taxa básica Selic pode ser reduzida para 10%. Está no Orçamento 2008! Esse aumento de 11,25% para 11,75% não tem nenhuma sustentação na economia. Colocamos na peça orçamentária de que a inflação média em 2008 é de 4,5%, podendo ter 2 pontos percentuais acima e dois pontos percentuais abaixo. É a chamada banda. Portanto, ela pode chegar a 6,5% e está na previsão orçamentária. E ela está com 4,73%. É um absurdo o que o Banco Central fez.


 


A polêmica do momento nos jornais, na tevê diz respeito a um aliado importante seu, que é o governador Cid Gomes. O governador teve de divulgar, enfim, a lista de passageiros do famoso vôo dele para a Europa durante o carnaval. O senhor se sentiu constrangido em ver um aliado seu tendo essa atitude? Qual foi a sua leitura do episódio?
Em 2002, o presidente Lula foi à China, já como presidente eleito e antes de tomar posse. Foi a convite do governo chinês e o Partido dos Trabalhadores pagou suas passagens. Ele levou a primeira-dama, sua esposa. Nós, quando fomos tesoureiro, pedimos que devolvesse os recursos e ele devolveu. Portanto, se já fiz isso como tesoureiro do partido, não posso ser diferente. Eu entendo que a ida do secretariado, dos gestores e do mandatário está correto. Os demais têm o direito de ir, mas tem obrigação de pagar o preço. Sou favorável que se devolvam os recursos como já fiz com a primeira-dama da Presidência da República.


 


 


 


Fonte: O Povo