Al-Jazira: muçulmanos americanos apostam em Obama
Enquanto a cidade americana de Filadélfia se prepara para uma das mais importantes primárias em décadas no Estado, uma parcela siginificativa da população já escolheu seu candidato.
Por Sarah Brown, de Filadélfia para a Al-Jazira
Publicado 22/04/2008 14:20
Os líderes da comunidade islamo-americana, ativistas e eleitores da “cidade do amor fraternal”, como Filadélfia é conhecida, dizem que Barack Obama é, de longe, seu candidato preferido.
A comunidade muçulmana de Filadélfia é uma das mais significativas, em termos de tamanho e importância, de todas as cidades dos EUA.
Há mais de 70 mil pessoas que realizam trabalhos comunitários em 34 mesquitas da cidade, levando a um dos líderes islâmicos local a descrever a cidade como “uma Meca para os muçulmanos dos EUA”.
A comunidade está também aumentando a atividade política, se adiantando às duas cruciais terças-feiras das primárias e à eleição de novembro propriamente diata, com grupos realizando palestras sobre o sistema de eleições primárias, em uma tentativa de educar a comunidade e as mesquitas para aumentar o número de eleitores inscritos e hábeis para votar na eleição de novembro.
Iftekar Hussain, presidente do Conselho de Relações Islamo-Americanas na Pensilvânia, diz que as primárias são uma importante marca para muitos muçulmanos americanos, e por isso a participação deles nelas será, de longe, a maior de todas em anos.
“Uma das principais coisas que eu vi nos muçulmanos da Pensilvânia é que, de quatro a oito anos atrás, eu tive de explicar que as eleições não eram apenas disputadas em novembro”, conta Hussain.
“Desta vez, eu vi a participação de muitos muçulmanos, e nós os veremos nas primárias, em algo que nunca aconteceu antes, demonstrando que houve um grande processo de aprendizado político da comunidade muçulmana local”, avalia.
Novo entusiasmo
Salima Abdullah, uma secretária da Fundação da Educação Islâmica, uma escola religiosa para crianças nos arredores da Filadélfia, gastou as últimas semanas trabalhando na campanha de Obama, arrecadando fundos, registrando novos eleitoreis e convencendo outros da importância da candidatura. Ela diz que está convencida de que o candidato vai fazer com que os EUA assumam um novo rumo caso seja eleito.
“Ele defende a mudança e tem uma nova perspectiva… isso nos dá esperança. Você sente a energia e se sente disposto”, acredita ela.
“Como muçulmana, eu sinteo que ele é o melhor candidato para negociar a paz com as nações árabes, já que respeitará e será respeitado, em um terreno mais elevado, com relação aos muçulmanos que vivem ao redor do planeta”, diz.
Esse é o entusiasmo demonstrado por muitos eleitores, que até mesmo a chegaram a mudar alianças políticas estabelecidas há muito tempo.
A Sociedade Islâmica al-Aqsa da Filadélfia (al-Aqsa Islamic Society) é uma grande mesquita, que tem uma escola cuja quadra está repleta de crianças arremessando bolas de basquete nas cestas das quadras, antes de se retiraram para a oração da tarde na mesquita.
Amin Elarbi, o presidente de sociedade, diz que virou-casaca. De republicano convicto há um mês, hoje mostra com orgulho os símbolos da campanha de Obama, enquanto conta que convenceu seus familiares a aderirem à campanha do senador de Illinois pela indicação à candidatura.
“Tanto Hillary quanto Obama valorizam os direitos civis e humanos das pessoas, e isso é muito importante para nós, já que entendemos que nosso país está envolvido em uma guerra e nossas crianças estão morrendo por algo errado”, diz ele.
“Dito isso, digo que votarei em Obama, mas se a senhora Clinton for a candidata, eu também votarei nela”, vaticinou.
Com as questões sociais, a economia, a ocupação do Iraque e a situação da saúde pública causando preocupações entre muitos muçulmanos americanos, a comunidade está se inclinando cada vez mais em direção a Obama, principalmente por causa de sua origem afro-americana, que por si só já é uma comunidade marcadamente pró Partido Democrata.
Embora a comunidade muçulmana da Filadélfia esteja longe de ser homogênea — seus membros afro-americanos já estão na região há várias gerações — ela também é constituída de pessoas de decendência asiática, árabe e africana, algumas vezes chamadas como “população imigrante muçulmana”.
A comunidade tem também, em termos de identidade eleitoral, vivido uma divisão contrastante desde as controversas eleições de 2000, que levaram Bush à Casa Branca.
Em 2000, a comunidade imigrante muçulmana votou em peso por Bush, principalmente por seus valores conservadores, que se alinhavam aos valores dos árabe-americanos, sendo que esses vestígios, hoje, segundo Hussain, “foram severamente apagados” entre os afro-americanos da cidade.
“Isso criou uma série de discussões na cidade e houve uma divisão nítida, mas então o 11 de setembro aconteceu, Bush fez o que fez e vieram alguns da comunidade afro-americana dizendo “eu não te disse?', a comunidade de imigrantes mudou para o lado dos democratas e vinhamos divididos assim desde então”, afirma ele.
Agora, entretanto, ambos os lados estão a favor de Obama — ele mesmo um afro-americano e filho de um muçulmano, que embora não diga, já insinuaram que seja muçulmano.
Em conversas com membros da União de Muçulmanos Masjid (UMM) no sul da Filadélfia, que reúne ao redor de 150 famílias e administra algumas escolas e empresas, os nomes de Hillary Clinton e John McCain sequer são mencionados, enquanto são feitas referências negativas em relação à posição ou até mesmo aos votos deles em relação à ocupação do Iraque.
A conscientização em relação às eleições está em alta o tempo todo, enquanto muitos membros da comunidade, segundo eles, pela primeira vez doaram dinheiro aos candidatos, ou mudaram de eleitores independentes para democratas apenas para escolher o pré-candidato.
A maior parte das conversas gira em torno de Obama e quanto — ou nada — ele irá mudar o atual sistema político, embora o tom seja cauteloso, particularmente em relação às atitudes do candidato em relação aos islamo-americanos.
“Em relação à política externa nós sabemos muito bem que ele não freqüenta uma mesquita e não tem nenhuma aliança com qualquer figura nacional muçulmana”, diz Qasim Rashad, presidente da UMM.
Rashad diz que, enquanto existir apoio a Obama dentro da comunidade, mesmo assim, a possibilidade de vitória é remota, já que o senador por Illinois poderá sofrer uma “avalanche” de votos contrários na terça-feira, graças às regiões rurais do Estado, muito mais conservadores e que poderão fazer a diferença.
“Mesmo assim, eu acho que a maioria dos muçulmanos e negros vão votar em Obama baseados na sua estratégia eleitoral de esperança, que este cara seja uma mudança para melhor. Depois de tudo que aconteceu, nada pode ser pior”, vaticina Rashad.
Seu colega, Abdul Rahim, diretor de operações da UMM, concorda.
“Eu não acho que alguém procura por um candidato especial, específico, para os muçulmanos, só espera que ele vá agir por todo o país e, assim, nós também seremos beneficiados”, acredita.
“Ninguém está dizendo olhem por nós em particular, nem mesmo a comunidade negra, só desejamos algo como homens e mulheres. Nós merecemos parte do sonho americano, o que quer que seja ele”.