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Juros mais altos já tiram fôlego do crédito no país

O novo ciclo de alta de juros começa a ter impacto na demanda por crédito e os bancos já começam a detectar uma leve desaceleração das operações. Desde abril, o Banco Central (BC) elevou em um ponto percentual a taxa Selic, mas os juros futuros, que serve

Um exemplo é o financiamento de automóveis, em que o banco capta recursos no curto prazo e empresta para o cliente em operações entre 40 e 60 meses. Para reduzir os riscos, a instituição financeira usa como piso os juros futuros compatíveis com os prazos contratados, mais altos do que a Selic. Estes juros futuros, há um ano, estavam na casa dos 11%. Agora, na mesma conta, a taxa futura supera os 14%.



Em outras palavras, para o tomador do empréstimo, o aumentou foi de pelo menos 3 pontos percentuais. Esse impacto, que é até mesmo anterior ao atual ciclo de aperto monetário (os juros futuros subiram inicialmente por conta da turbulência do mercado de crédito americano), começa a ser sentido na demanda por crédito. Muitos analistas esperam uma perda de fôlego maior já no segundo semestre.



“O impacto das quedas da taxa Selic feitas no ano passado já foi incorporado. Agora, com os aumentos desse ano, as taxas bancárias subiram, mas a desaceleração do crédito deve vir no segundo semestre”, explica o economista-chefe do Banco Schahin, Silvio Campos Neto.



Érico Ferreira, presidente da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), pondera que essa desaceleração não decorre de uma desaquecimento da demanda, mas sim de uma redução natural no ritmo que vinha muito forte. “O crédito cresceu 30% no ano passado, é natural que, com a base menor, a velocidade diminua para cerca de 25% no ano”, afirma. Ele também acredita, no entanto, que “no segundo semestre pode haver uma redução da demanda”.



Segundo análise do economista-chefe do Bradesco, Octavio de Barros, o crédito com recursos livres de pessoa física, com dados deflacionados e a dessazonalizados do estoque, já apresenta sinais de desaceleração. Em relatório, ele afirma que este movimento também pode ser observado nas principais modalidades relacionadas ao consumo: aquisição de veículos e de bens, leasing e crédito pessoal (incluindo o crédito consignado).



Olhando médias móveis de seis meses, os sinais de desaceleração continuaram presentes. “Não podemos esquecer que este movimento está ocorrendo de forma lenta e sutil e que, mesmo desacelerando, se trata de um crescimento bastante robusto”, ressalta.



O Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) também destaca como uma tendência a desaceleração do crescimento do crédito à pessoa física. “Com variação real de 17,6% em abril, o crescimento desse segmento (que alimenta a evolução do consumo), é ainda altamente satisfatório, assegurando o bom desempenho do varejo no país, mas já foi melhor nos meses finais de 2007 quando o crescimento chegou a 20%”.



Ainda de acordo com o Iedi, ao lado de uma desaceleração quase constante do crescimento da modalidade de crédito consignado (22,8% foi a taxa de variação em abril, contra cerca de 30% nos meses finais de 2007), aparentemente também vai perdendo fôlego a trajetória de evolução das demais modalidades de crédito para as famílias que entre maio de 2007 a janeiro de 2008 tiveram expressiva aceleração.



Um ponto positivo, na avaliação do instituto, é que, analisando os dados de abril, é o investimento e não o consumo o fator de aceleração da evolução do crédito no Brasil nesses meses iniciais de 2008.



Ricardo Gelbaum, diretor-executivo financeiro do Banco BMG, pondera, no entanto, que uma “parada técnica do crédito pode ser positiva para reavaliação das carteiras, dos prazos praticados e da qualidade dos empréstimos”. Segundo ele, havia muitas operações com prazos “exagerados”. “À medida que sobem os juros e BC sinaliza que está preocupado com a demanda exacerbada, os prazos tendem a ficar mais conservadores”.



Na quarta-feira, o BC elevou em 0,5 ponto a Selic e o mercado futuro já reagiu elevando os juros futuros mais longos, chamada de “a ponta mais longa da curva”. “Isso mostra que o objetivo do BC foi atingido. A alta da Selic não é o mais importante, mas quantas altas ainda estão por vir”, completa.



Isso significa que o mercado não espera mais um aperto monetário tão curto, afirma Cláudio Coutinho, presidente do Banco CR2. “A direção da curva, positivamente inclinada para cima, mostra que o mercado está preocupado com a inflação e com os dados de demanda, que se mantém aquecida.”



Isso porque, em abril, o BC, ao elevar 0,5 ponto, se posicionou “à frente da curva”, ou seja, se antecipou ao mercado. Agora, ao manter a velocidade em 0,5 ponto por reunião, acompanhou a curva, sinalizando que não está querendo abrir muito o juro real (calculado em relação às expectativas futuras de inflação), mas que vai compensar aumentos de inflação na taxa. “A curva vai acompanhando a inflação, a não ser que inflação surpreenda. Dessa forma, a elevação de 0,5 ponto não altera de forma significativa a tendência de alta dos juros bancários”.



Fonte: Valor Econômico