Perpétua busca alternativa para hansenianos

Duzentos portadores do mal de Hansen no Acre são vítimas da burocracia, apesar do direito legal à pensão vitalícia de R$ 600,00.

 

A deputada Perpétua Almeida (PcdoB), reuniu-se no último fim de semana com o secretário estadual de saúde Osvaldo Leal e com a presidência do MORHAN-Movimento de Reintegração das pessoas Atingidas  pela Hanseníase, para viabilizar a forma destes obterem os benefícios da Lei 206/2006 do senado da república.


Essa Lei assegura aos hansenianos  que foram submetidas a isolamento e internação compulsórios em hospitais-colônia, uma  pensão mensal  correspondente a R$ 600 para os que não dispõem de outro benefício como aposentadoria, e metade dessa quantia para os aposentados.



Os hansenianos do Acre, recebem uma pensão do estado equivalente a 1 salário mínimo   desde o governo Iolanda Fleming (1986).


A Lei de autoria do senador Tião Viana se soma à já existente aumentando o valor do benefício, no entanto por causa da burocracia do sistema brasileiro, 1 ano depois de sancionada, dos mais de 200 acreanos que teriam direito ao benefício apenas 4 o obtiveram.


“A Lei é fundamental, o benefício é fundamental porque volta-se específicamente para aquelas pessoas que foram excluídas às vezes até por força policial do convívio social. O que precisamos assegurar agora é que este benefício, esse reconhecimento da discriminação e dos sofrimentos que isso causou chegue à essas pessoas”, disse a deputada comunista.


Para obter o benefício, os hansenianos internados de maneira compulsória devem apresentar provas documentais, que na maioria dos casos no Acre, não existem mais. Esses internamentos à força datam da década de 1930, e a maioria dos documentos foram destruídos voluntariamente ou pela ação do tempo. Apenas o estado de São Paulo mantém documentos relativos a questão desde a 1924, através do processo de microfilmagem.


No Acre as fichas de internamento estão sendo rejeitadas por causa da falta de exatidão. Parte delas não especifica nem a data. Informa apenas o nome e a idade do paciente. Em alguns casos até o nome dos pais foi trocado. O caso de João Jacinto (68), internado pela primeira vez em 1953, quando tinha 9 anos de idade é sintomático.


“Trocaram o nome da minha mãe e quando eu fui tirar meu registro em 1974, deu a maior confusão”, informou ele. João Jacinto é um dos internados compulsóriamnete, por duas vezes. É ele que conta que os horrores de viver confinado em campos cercados por arame farpado com “policiais” fazendo a guarda para evitar que os pacientes fugissem.


“Se um de nós tinha um gato, cachorro, galinha ou porco, e o animal passasse para o outro lado do arame, a gente não tinha nem o direito de ir atrás dele”,conta o homem que sofreu a separação do pai aos 2 anos de idade, quando o pai foi internado à força por estar com hanseníase. Graças a uma estranha coincidência acabou reunindo-se ao pai 7 anos depois, ao ser mandado para a mesma colônia de isolamento.


A confusão dos nomes também gerou outro problema: as respostas do ministérios aos pedidos, acabaram não chegando aos destinatários. Como vinham endereçadas a nomes desconhecidos, os policiais não avisavam as pessoas de vilas como Santa Cecília. Desconhecendo os fatos e muitas vezes incapacitadas de andar por causa de deficiências ou da idade avançada, os beneficiários também não procuravam a correspondência, que assim retornava ao ministério. Por esse motivo muitos foram dados como mortos ou desaparecidos.


O secretário de saúde mostrou-se sensível ao problema, concordando que é preciso encontrar uma solução urgente para o problema. “A alternativa pode ser fazer valer provas testemunhais, como a de um vizinho que tenha presenciado a retirada forçada da pessoa do convívio da família, ou de um médico que o tenha atendido, ou enfermeiro, ou até mesmo a mostra de alguma seqüela. O que não podemos é cruzar os braços e voltar as costas mais uma vez para essas pessoas que já sofreram tanto”, concluiu a deputada Perpétua Almeida.
 
 Histórico


O Brasil é o segundo país com maior número de casos de Hanseníase do mundo, perdendo apenas para a Índia.  As pessoas infectadas eram discriminadas e obrigadas a viver fora da sociedade, além de sofrer as conseqüências da própria doença. Na época sem cura e sem tratamento, a Lepra causava deformidades.


De acordo com o decreto federal 6.168 de 24 de julho de 2007, os pacientes que foram internados compulsoriamente e isolados em hospitais colônias de todo o país até o ano de 1986 terão direito a pensão vitalícia mensal no valor de R$ 750. Para receber o benefício os pacientes precisam apresentar documentos que comprovem a internação compulsória e preencher um requerimento de pensão especialprimeiros leprosários datam da época da colonização, construídos com o intuito de isolar os doentes. Com o passar do tempo esses estabelecimentos tornaram-se verdadeiras cidades, quase que auto-suficientes.


Por outro lado, as assim denominadas colônias ou hospitais-colônia – os leprosários de outrora – situavam-se em locais de difícil acesso, circundadas por cercas e muros altos, com portões permanentemente trancados. Guardas sanitários – alguns armados e parte deles recrutados entre os próprios portadores de hanseníase – tinham a função de capturar fugitivos e novos enfermos. Longe da propaganda oficial, as colônias mostravam o seu lado mais obscuro: um local de reclusão e de isolamento, de dor e de sofrimento, onde a sociedade confinava os doentes que temia.
No final da década de vinte do século passado, havia um clima de pânico social em relação aos doentes. Marginalizados, os portadores de hanseníase não podiam trabalhar e, sem condições de subsistir, mendigavam pelas ruas.


No primeiro governo de Getúlio Vargas (1930-45), o combate à hanseníase foi ainda mais disciplinado e sistematizado. Reforçou-se, então, a política de isolamento compulsório que mantinha os doentes asilados em hospitais-colônia. Quando se concluiu a rede asilar do País, o isolamento forçado ocorreu em massa.


A maior parte dos pacientes dos hospitais-colônia foi capturada ainda na juventude. Foram separados de suas famílias de forma violenta – caçados e laçados como animais – e internados compulsoriamente. Em sua maioria, permaneceram institucionalizados por várias décadas.
Muitos se casaram e tiveram filhos durante o período de internação. Os filhos, ao nascer, eram imediatamente separados dos pais e levados para instituições denominadas “preventórios”. Na maioria dos casos, não tinham quase nenhum contato com os pais.


A disciplina nos preventórios era extremamente rígida, com a aplicação habitual de castigos físicos desmesurados. As crianças eram submetidas a uma espécie de “lavagem cerebral” e induzidas a se esquecerem de seus pais, porquanto a hanseníase era considerada uma “mancha” na família.
Nos hospitais, as fugas eram freqüentes, mas a dificuldade de viver no mundo exterior forçava os pacientes a voltar. O medo de ser punido – pois existiam celas e até solitárias nos hospitais – fazia com que o paciente fugitivo, ao retornar ao sistema, buscasse uma instituição diferente daquela de origem para se abrigar.


Os anos se passaram, e o Brasil, seguindo a tendência mundial, começou a pôr fim ao isolamento compulsório na década de sessenta do século passado, por meio do Decreto nº 968, de 7 de maio de 1962, mantendo um regime de transição semi-aberto até meados da década de setenta
a média de novos casos detectados no Brasil é de 47.400. Destes, 8,4%, em média, são casos em menores de 15 anos.