George Câmara: Zé Saldanha – Cidadão Natalense

José Saldanha Menezes Sobrinho é um sertanejo de raízes fincadas no seio do povo potiguar. Nascido na Fazenda Piató, Município de Santana do Matos, em 23 de fevereiro de 1918, teve o umbigo enterrado sob a porteira do curral para poder ser rico e feliz. C

Ele cresceu como um errante cavaleiro medieval no polígono da poesia popular, escrevendo poemas caboclos entoados ao som da lira, no reino dos cantadores.


 


Ouviu a poesia entoada por mestres da cantoria que interpretavam a cadência rítmica do coração. Sentiu a magia melancólica dominar o povo dos sertões. É do tempo em que os mais sabidos só possuíam 3 tipos de livros: a Bíblia, o Lunário Perpétuo e o Cordel. Seus primeiros best selers foram o Pavão Misterioso, João de Calais, Carlos Magno e os Doze Pares de França, a Imperatriz Porcina e a Donzela Teodora.


 


Zé Saldanha limpou mato, apanhou algodão, foi almocreve, vaqueiro, puxou gado, deu aboios agudos em voz hirta, cheia de floreios e bordões. Vendeu fumo de corda nas feiras livres das cidades sertanejas. Foi sapateiro e minerador.


 


Escreveu seu 1º cordel em 1935 (O Preço do Algodão e o Orgulho do Povo). Não parou nunca mais, e seguindo veio: História do Boi Mandingueiro, O Valente Serapião, O Velho Catimbozeiro, Singéfrida e Ozean, A Sogra Nordestina, O Matador de Onças, O Político e o Povo, etc.


 


Saldanha constrói rimas como quem borda palavras, com as entranhas da alma, em talentosas reflexões cheias de apurada sensualidade. Sua alma sertaneja contém a essência do povo mestiço, em suas crenças, canções e melodias que fazem palpitar corações.


 


Na década de 70, Zé Saldanha travou grande luta pelas abrangências sociais do poeta popular no Nordeste, através de associações congregadas de repentista, embolador de coco, aboiador, glosador, poeta de bancada que escreve folhetos de cordel, etc. Tentou, junto aos políticos, a partir de 1979, o reconhecimento da profissão de poeta popular pelo Ministério do Trabalho, visando à conquista dos direitos trabalhistas de mais de 5.000 nordestinos.


 


Cascudo, o ícone da cultura potiguar, a figura mais ilustre dos últimos séculos, um dos oito maiores folcloristas do século XX, ao escutar um poema de Saldanha, em 1973, disse que “Zé é como o tatu-bola: um animal em extinção.” Saldanha é fundador da Associação Estadual dos Poetas Populares do RN – AEPP (1974) – com sede e fórum em Currais Novos/RN.


 


Ele foi o primeiro xilogravurista do Seridó, ilustrando seus próprios trabalhos desde 1940.


 


Saldanha foi condecorado Cavalheiro Benemérito da Ordem dos Cantadores, diplomado por Rodolfo Coelho Cavalcante, diretor do Jornal Brasil Poético, pelos relevantes serviços prestados à poesia nordestina (Salvador, 1977).


 


Também recebeu o título de Cavaleiro da Ordem dos Poetas Populares do RN, outorgado por uma comissão de parnasianos, de acordo com o estatuto social da AEPP (Associação Estadual de Poetas Populares). Ainda pelo relevante serviço prestado pelo referido menestrel, aos poetas e folcloristas do Estado, o seu nome ficou gravado sob a esfinge de Cavaleiro da Ordem dos Poetas Populares do RN (1979), no livro de Mérito daquela entidade, com gloriosos aplausos.


 


É um dos fundadores da Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço – SBEC (sede em Mossoró/RN). Essa entidade nasceu em 1993 de uma reunião de lampianófilos na residência de Saldanha, em Natal. É um movimento cultural que pesquisa coronelismo, cangaço e cordel. Já foram expedidos diplomas para personalidades como a escritora Rachel de Queiroz, Frederico Pernambucano, Dadá (mulher de Corisco), Jerônimo Rosado, Iaperi Araújo, Gutemberg Costa, Sila (ex-cangaceira), Candeeiro (ex-cangaceiro), etc.


 


Alguém com uma biografia tão rica, tinha que ser homenageado na véspera do Dia Nacional da Poesia, data em que nasceu o grande poeta Castro Alves.


 


 


1 – Trecho da Exposição de Motivos do Projeto de Decreto Legislativo apresentado em 01/09/2004, na Câmara Municipal de Natal, propondo o Título de Cidadão Natalense a Zé Saldanha.


 


 


*George Câmara, petroleiro, advogado e vereador em Natal pelo PCdoB.
georgemetropole@yahoo.com.br