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Contragolpe da oposição no Quirguistão: Mudança de clãs

Esta segunda revolução quirguiz não deveria receber o formoso nome de uma flor, em honra às tulipas ou às rosas, pois sua cor é a do sangue e a do resplendor das chamas.

Por Pavel Sviridov, para o Soviétskaia Rossía

Os acontecimentos no Quirguistão se desenvolveram de um modo frenético e imprevisível, da mesma forma que aconteceu a cinco anos — quando chegou ao poder — o derrocado Bakiev foi apeado do governo por uma onda de protestos (muito menos sangrentos e cruéis que os destes dias) .

Em 6 de abril, quando a situação em Talas tornou-se efervescente, ninguém, inclusive os líderes da oposição, poderia imaginar que os protestos desembocariam em um autêntico levante, que conduziria à derrubada do governo.

Acontece que os métodos repressivos não só não são a panaceia como ao contrário, o uso da força contra os descontentes pode conduzir justamente a um resultado totalmente contrário ao desejado.

Se o governo tivesse permitido à oposição celebrar seus "Kurultai" (assembleias), possivelmente as coisas não teriam ido mais além que as costumeiras manifestações e convocações. Embora, naturalmente, o problema não estivesse apenas na proibição de reunir-se e na detenção dos líderes da oposição.

A cinco anos da "revolução das tulipas", a decepção que grassava entre os cidadãos quirguizes transformou-se em indignação e, finalmente, em desespero, capaz de extravasar os limites da paciência.

Bakiev havia prometido democratizar o país, mas poucos dias depois de ser retirado do poder, afirmou que os quirguizes não estão preparados para ela. Bakiev havia assegurado que lutaria contra a corrupção e os clãs, que haviam sido o suporte do governo anterior de Akaiev, derrubado por Bakiev. Entretanto, sob sua batuta, os dois males se reproduziram como nunca.

O clã dos Bakiev — formado pelo caçula Maxim, que dirigia a Agência Central de Desenvolvimento e Investimentos, e que no momento do golpe estava nos Estados Unidos, discutindo detalhes dos investimentos americanos no país; o filho mais velho, Marat, que dirigia um dos departamentos do Comitê de Segurança Nacional, e o irmão Janich, chefe do serviço de segurança do presidente, eram os maiores representantes do clã — pensava somente em seu próprio bem-estar e seu poder.

Enquanto os quirguizes seguiam vivendo na miséria, sem jamais alcançar o PIB que o país tinha em 1990, quando deixou a URSS, a indústria do país era desmontada e não tem perspectivas de reconstruir-se.

Em declarações à agência Regnum, o analista Toktogul Kakcheheyev confessava: "convertemos o país em uma quitanda, vendemos tudo. As antigas fábricas de construção de máquinas Torgmach e Selmach, em consequência dessas políticas privatizantes estão ocupadas agora por mercadinhos. Perdemos muito do que tínhamos e apenas agora começamos a tentar recuperar a indústria e a agricultura". Se o presidente Bakiev, em lugar de repartir cargos entre familiares e se enriquecer, tivesse se ocupado da economia, a situação do povo não seria tão crítica. Mas em lugar disso o que se fez foi privatizar uma série de empresas estratégicas do setor energético.

A primeira coisa que os novos proprietários dessas empresas fizeram foi aumentar os preços da eletricidade. Em cascata, foram aumentados todos os preços dos produtos de primeira necessidade.

Muitos quirguizes que já se afligiam ao pensar como conseguiriam chegar ao fim do mês, vítimas de uma altíssima taxa de desemprego e de aposentadorias miseráveis, se viram de uma hora para a outra lutando literalmente pela sua sobrevivência.

Uma das dirigentes do governo provisório, Otumbáieva, apressou-se a declarar nulos os acordos de venda das empresas de energia, o que, segundo suas palavras, permitirá reduzir as tarifas de luz e das telecomunicações.

Não sabemos se terão aprendido a lição dessa revolução nada aveludada de 2005 e desse levante de abril os antigos líderes da oposição. Ao fim e ao cabo, os nomes desses líderes oposicionistas que "derrubaram o ditador" em 2010, são os mesmos de 2005. Em todos estes anos transcorridos, nos quais foram ministros, porta-vozes parlamentares, deputados, não fizeram nada para o povo.

Suas disputas intestinas os levaram à oposição, para de novo voltar ao poder mediante o horror, o sangue e as vítimas dos dias de hoje.

Só que, agora, a incredulidade e o furor das pessoas são agora muito maiores. Não podem continuar vivendo como até hoje, mas tampouco acreditam que algo vá melhorar. Daí esse nível de violência, quando sua própria vida e a dos demais já se tornou indiferente.

Em 2005 o golpe de Estado foi proveniente do Sul, de onde se originou Bakiev, enquanto que agora veio do norte, pois a maioria dos líderes da oposição são nortistas. A divisão territorial do país entre norte e sul pode acarretar conflitos étnicos e desembocar em guerra civil — na região sul do país vivem muitos uzbeques.

Por enquanto, os habitantes do sul do país, onde muitos ainda consideram Bakiev seu legítimo representante, continuam mantendo uma relativa calma.

Fonte: La Conquista de la Civilización Socialista, a partir de tradução de Josafat Comín, do original em http://www.sovross.ru/modules.php?name=News&file=article&sid=57428