Oposição pode quebrar a cara ao apostar em "tropeços" de Dilma
O site do jornal o Estado de S. Paulo divulgou com destaque, nesta sexta-feira (16), que o roteiro de viagens do pré-candidato tucano à Presidência, José Serra, vai obedecer ao critério de priorizar os Estados onde a aliança está acertada e seguir o rastro dos supostos "tropeços" da rival Dilma Rousseff. Com este tipo de informação, o jornal tenta manter vivo um discurso que não tem base nos fatos e revela-se uma mera proclamação de vontade dos oposicionistas.
Publicado 16/04/2010 18:44
"Serra apressará a visita aos locais onde a passagem da petista foi considerada um 'desastre político', na opinião dos tucanos", diz o jornal, sem detalhar o que os tucanos consideram como "desastre político".
O senador Cícero Lucena (PSDB-PB), ouvido pelo jornal, limitou-se a citar as recentes viagens da candidata petista a Minas e ao Ceará como exemplos de visitas "que lhe renderam problemas com aliados". O senador diz que a tática é "criar o contraponto com a visita de Serra", em clima de harmonia com os aliados.
Alianças favorecem Dilma
É bem possível que declarações como esta de Lucena sejam apenas parte da insidiosa campanha midiática da oposição contra Dilma. Infelizmente, isso faz parte do jogo bruto das campanhas eleitorais. Mas se os tucanos estiverem realmente raciocinando assim, é justo supor que as raposas mais astutas do PSDB perderam a capacidade de fazer cálculos políticos.
O esforço que a oposição e a mídia fazem para carimbar como "tropeços" as recentes visitas de Dilma a alguns estados parece muito mais uma proclamação de vontade dos adversários do que propriamente análise racional dos acontecimentos. Para construir o discurso do "tropeço", a mídia precisou lançar mão de sua conhecida tática de distorcer declarações e filtrar as análises dando espaço apenas para que um lado — o da oposição– se manifestasse.
Em Minas, Dilma não pediu que os eleitores votassem nela e no candidato do PSDB ao governo estadual. Ela disse textualmente que "a gente não escolhe a forma pela qual o povo monta as alianças. É possível que ocorra. Como houve o ´Lulécio´, [é possível existir] a ´Dilmasia´". Esta declaração é bem diferente da interpretação apressada da mídia que viu na frase de Dilma um pedido formal de aliança entre ela e o candidato tucano, contrariando o "acordo" de o PT apoiar a candidatura de Hélio Costa ao governo mineiro. Nos bastidores, a ex-ministra é uma das maiores incentivadoras da aliança entre PT e PMDB em Minas. Além disso, uma consulta feita esta semana aos prefeitos das 50 maiores cidades mineiras revelou que a maioria dos prefeitos, de vários partidos, tende a apoiar Dilma. As declarações "ameaçadoras" de Hélio Costa de que poderá bandear-se para o lado de Serra não passam de pressão para que o PT mineiro decida logo o que quer fazer da vida.
No Rio de Janeiro, dizem que o ex-governador Anthony Garotinho (PR) cobrou de Dilma o apoio de outras legendas à sua candidatura ao governo fluminense. Até aí, problema de Garotinho. A campanha de Dilma está muito bem no Rio, onde o PT já sacramentou o apoio à reeleição do governador Sérgio Cabral (PMDB), garantindo um palanque forte para a ex-ministra. Quem está com problemas sérios no Rio é José Serra, que tem na vacilante candidatura de Gabeira –candidato pelo PV de Marina Silva– sua única bóia de salvação, na qual está agarrada também o ex-prefeito Cesar Maia (DEM), para desagrado de Gabeira.
No Ceará — outro estado onde a oposição acredita que Dilma "tropeçou" — a situação é ainda mais tranquila para a candidata petista. O PT já decidiu apoiar a reeleição do governador Cid Gomes. Resta resolver um imbróglio na disputa ao Senado. Mas é um problema que não ameaça o apoio da base aliada a Dilma no Estado. Apenas uma eventual candidatura de Ciro Gomes (PSB) à Presidência poderia minar a preferência de Dilma entre os eleitores cearenses. Já do lado dos tucanos, nem mesmo o ex-presidente do PSDB, Tasso Jereissati, está disposto a grandes sacrifícios para ajudar seu colega José Serra a conseguir votos no Estado.
O presidente nacional do PT, José Eduardo Dutra, foi certeiro na avaliação do que houve no Ceará: "A única manifestação de insatisfação que vi foi a do Tasso Jereissati, que é da oposição. Se a Dilma não for visitar Estado onde há problema, ela vai ficar em Brasília vendo a banda passar", afirmou.
A avaliação foi reforçada pelo ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais): "Ninguém vai segurar a ministra. Ela vai continuar andando, respeitando as diferenças dos Estados", disse.
Fora o RJ, CE e MG, qual foi mesmo o outro suposto "tropeço" que a mídia e a oposição tem para apontar em relação à campanha de Dilma? Não há. E nos três casos citados é evidente que a oposição forçou a mão na análise catastrofista. Até o jornalista da Folha, Kennedy Alencar, reconheceu em artigo que escreveu em seu blog que "Longe de Lula, (Dilma) acertou mais do que errou no primeiro voo solo".
Políticos e analistas experientes sabem que a costura de alianças é sempre uma maratona recheada de atropelos e, no final das contas, sai na frente quem consegue agregar mais apoios de peso nos estados, ainda que as adesões ocorram nos minutos finais. Partindo desta lógica, a situação de Dilma é bem mais confortável que a de seu rival tucano. Ainda que muitos apoios dependam de acertos regionais difíceis de serem costurados –principalmente por causa da teimosia hegemonista do PT– é certo que Dilma irá para a disputa com um leque de alianças maior, mais forte e mais amplo do que seus adversários.
Coligação não favorece Serra
Dizer que Dilma tem dificuldades em 15 estados e Serra só tem problemas em três –como fizeram os jornalões no início desta semana– é um raciocínio tão simplório e tão equivocado quanto afirmar que a candidatura de Marina Silva vive no melhor dos mundos pois terá palanques garantidos em todos os estados já que o PV decidiu lançar candidatos próprios em todos eles.
Uma coisa é ter palanque garantido no estado, outra, bem diferente, é o retorno que este "palanque" vai gerar em termos de apoio político e estrutura partidária colocada à disposição da campanha.
Além do PSDB, Serra conta, hoje, apenas com o apoio do DEM e do PPS. O DEM está com a imagem arranhada depois do sufoco que passou com o escândalo no Distrito Federal e do qual ainda não se livrou totalmente. No Nordeste, onde o DEM sempre foi forte, a crise também abateu-se sobre o partido que agora junta os cacos e precisará de um esforço concentrado para manter o que tem de representação parlamentar, o que pode levar os demos a colocarem a campanha presidencial em segundo plano. Já o PPS é um partido em via de extinção, só não decretou falência e incorporou-se oficialmente ao PSDB até agora por falta de coragem e iniciativa. Muitas lideranças regionais do partido não compactuam com a orientação nacional do presidente Roberto Freire de fazer oposição raivosa ao governo Lula. Na prática, a estrutura partidária que o PPS poderá colocar à disposição da campanha de Serra nos estados é quase nenhuma.
Assim, resta ao ex-governador paulista contar com os apoios oriundos do próprio ninho tucano e de parte minoritária da direita espalhada em outros partidos como PMDB, PP e PTB. Estes apoios não são poucos nem desprezíveis –casos de São Paulo, Minas Gerais e Paraná– mas não são suficientes para dar a Serra a garantia de uma campanha sem sustos nos estados. Vale ressaltar que os governos estaduais do PSDB em Alagoas, Rio Grande do Sul e Roraima são verdadeiros desastres. Salva-se a boa avaliação do tucano Aécio Neves em Minas Gerais, mas não é segredo para ninguém que Aécio ainda não deu demonstrações claras de que irá mesmo trabalhar com afinco pela candidatura de Serra, que o sabotou até não poder mais para se impor como candidato do PSDB ao Planalto.
Pesa ainda contra Serra o fato de ser profundamente identificado com a tradição política hegemonista de São Paulo. E em política, hoje em dia, ser paulista fora de São Paulo é muito mais um defeito do que uma qualidade.
A vantagem que Serra pode apresentar de fato em relação às suas alianças é o apoio que tem da grande mídia monopolista. Agarrada aos destroços do que sobrou de neoliberalismo depois da crise econômica mundial, esta mídia já mostrou que está disposta a lançar ao mar qualquer escrúpulo para colocar de volta no poder central um legítimo representante da elite.
Experiência de quase oito anos ao lado de Lula
E é desta mídia partidarizada que parte a maioria dos ataques contra a ex-ministra Dilma Roousseff. Um dos mais recorrentes é bater na tecla da suposta "falta de traquejo político" de Dilma. Alegam que o fato da pré-candidata petista nunca ter disputado uma eleição a deixa vulnerável frente ao ritmo pesado, melindroso e truculento das campanhas eleitorais.
Os adversários da ministra e até alguns aliados de pensamento preguiçoso esquecem que Dilma foi secretária de Fazenda de Porto Alegre, secretária de Minas e Energia do Rio Grande do Sul, ministra de Minas e Energia, ministra-chefe da Casa Civil e responsável pelos mais vistosos programas do governo Lula, como o PAC e o Minha Casa, Minha Vida. E para cumprir estas tarefas não ficou enclausurada em seu gabinete. Pelo contrário, percorreu o Brasil inteiro, acompanhou Lula em praticamente todas as grandes atividades de governo dentro e fora do país, subiu em centenas de palanques para inauguração de obras, participou de um número incalculável de reuniões com políticos aliados, empresários e representantes de movimentos sociais. Só mesmo um analista obtuso é capaz de achar que esta experiência de quase oito anos no governo federal e mais outros tantos no Rio Grande do Sul não serviu como uma grande aula de política para a ministra.
A própria Dilma falou sobre isso na entrevista que deu à rede RBS ontem (15), em Porto Alegre. "Andei por este país afora sozinha quantas vezes? O pessoal está inventando. Ser governo e decidir todo dia é muito difícil. Eu cuidei do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), de R$ 636 bilhões, da execução, tinha de discutir isso do Oiapoque ao Chuí. O presidente ia para um lado e eu, para o outro", afirmou a ministra.
Mesmo com toda campanha midiática que tenta inventar dificuldades para a campanha de Dilma, alguns analistas mais atentos conseguem se desviar da avalanche de desinformação. Neste sentido, vale destacar a opinião do cientista político Fernando Abrucio, da FGV. Segundo ele, é preciso saber lidar com histórias infladas pela oposição. Para Abrucio, Dilma não chegou, até agora, a produzir grandes problemas para sua pré-campanha: "Ela está aprendendo a fazer campanha antes de a campanha começar. Ela pode errar mais agora, não no segundo semestre. Mas se ela será o Kassab do Lula, ninguém sabe ainda", avalia o cientista, lembrando do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, que conseguiu se reeleger apesar da inexperiência e mesmo depois de um dramático rompimento com o PSDB de Alckmin e de alguns tropeços no cargo, como chamar de "vagabundo" um autônomo que protestava numa unidade de saúde.
Da redação,
Cláudio Gonzalez