George Câmara: O MST e o lema "Lutar não é crime"

Neste mês de abril de 2010, passados 14 anos do massacre de Eldorado de Carajás, no Pará, diante das mobilizações por todo o país promovidas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na jornada de lutas do chamado “Abril Vermelho”, entra em pauta uma importante bandeira para os setores populares e para a democracia: a luta contra a criminalização dos movimentos sociais.

- Sebastião Salgado
A História do Brasil está repleta de exemplos da postura truculenta dos setores conservadores e reacionários frente às justas reivindicações populares. Para justificar a repressão, teve até presidente da “República Velha” como Washington Luís que considerava as lutas sociais como “questão de polícia”. Hoje, não faltam vozes da ultra direita brasileira ressuscitando esse discurso, através de uma manobra supostamente respaldada pelo Poder Judiciário: “judicializar” as lutas sociais com o único propósito de barrar qualquer avanço da sociedade na luta contra a desigualdade social.

Medidas como a decretação da cobrança de absurdas multas aos sindicatos cujas categorias venham a deflagrar uma greve, no exercício de um direito previsto em lei, na defesa de suas legítimas reivindicações, se somam aos interditos proibitórios visando encurralar os trabalhadores e seus sindicatos na deflagração de qualquer movimento grevista, como vem se dando recentemente nas greves de petroleiros.

Na luta em defesa da moradia, diante da voracidade da especulação imobiliária, não faltam decisões judiciais de reintegração de posse nos conflitos dos sem teto pelo país afora, atendendo ao jogo do capital.

Considerar a luta pela Reforma Agrária como mais uma questão de polícia é fechar os olhos para o verdadeiro crime que acontece todos os dias neste país: a fome, a miséria, a exclusão social e a estúpida concentração de terras na mão do latifúndio improdutivo. Como saldar a dívida social sem que os verdadeiros credores cobrem essa dívida?

A palavra de ordem “LUTAR NÃO É CRIME” se entrelaça com a justa reivindicação do assentamento de pelo menos 90 mil famílias que vivem em acampamentos, além de um programa de agroindústrias para os assentamentos, a atualização dos índices de produtividade e a garantia de recursos para a desapropriação de áreas.

A Jornada Nacional de Luta pela Reforma Agrária ainda rememora o massacre de 17 de abril de 1996, que resultou na morte de 19 trabalhadores sem terra. Mais um exemplo de impunidade que envergonha e desmoraliza o país.

O Relatório de Conflitos no Campo no Brasil, da Comissão Pastoral da Terra (CPT) referente ao ano de 2009, lançado na quinta feira, 15/04/10, apresenta crescimento do número de conflitos envolvendo camponeses e trabalhadores do campo, bem como crescimento da violência em relação a 2008.

Realmente, “LUTAR NÃO É CRIME”. Crime é compactuar com as injustiças. Vejamos a relação dos “criminosos” produzidos pela história contada pelas elites no Brasil: o índio Ajuricaba, Zumbi dos Palmares, Tiradentes, Frei Caneca, João Cândido, Zé Rainha, entre tantos outros. Todos eles, dignos heróis do povo brasileiro.

Enquanto isso olhemos para a outra lista, a dos “honestos” que perfilam a favor da criminalização dos movimentos sociais: José Roberto Arruda, Antônio Carlos Magalhães, Paulo Maluf, Roberto Jefferson, integrantes de um rol interminável da fina flor da elite branca brasileira.

Fico muito mais tranquilo e me sinto mais honrado na companhia dos primeiros. Como diz Chico Buarque, numa canção famosa, ridicularizando a ditadura militar fascista: “chamem o ladrão!”

 

por George Câmara, petroleiro, advogado e vereador em Natal pelo PCdoB (22/04/10) www.georgecamara.com.br