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Grito da Terra: ruralistas não falam pela agricultura familiar

“CNA não dá para comparar, quem alimenta essa nação é a agricultura familiar”. Foi esse o mote da 17a edição do Grito da Terra Brasil 2010, que reuniu, nesta quarta-feira (12), em Brasília, delegações de trabalhadores e trabalhadoras rurais de todo o país. A Confederação dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), que organiza o evento, concentrou a manifestação em frente ao Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), alvo dos ruralistas que querem acabar com o ministério.

Grito da Terra - Contag

“Não somos iguais aos ruralistas, somos os que plantam para alimentar o campo e a cidade. A CNA só produz grão para exportação, não se preocupa com a segurança e soberania alimentar”, disseram os líderes sindicais, afirmando ainda que “a CNA faz campanha para que o capital estrangeiro compre terras no Brasil e nós trabalhamos no sentido contrário”.

Os dirigentes sindicais denunciam a presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), senadora Kátia Abreu (DEM-TO), de querer falara em nome da agricultura familiar. A vice-presidente da Contag, Alexandra Lunas, disse que a senadora Kátia Abreu deve respeitar a Contag que tem 50 anos de existência e que a agricultura familiar é nossa bandeira de luta. E acrescentou que todas as conquistas dos trabalhadores rurais foram resultado de luta da categoria, inclusive a criação do Ministério do Desenvolvimento Agrário.

A mística que encerrou o ato demonstrava a situação atual da investida do agronegócio contra a agricultura familiar. Pessoas vestidas de preto, inscritas com palavras que caracterizam o agronegócio – trabalho escravo, monocultura, propriedade improdutiva, degradação ambiental, agrotóxico etc – investiram contra aqueles que representavam a agricultura familiar que segurava uma grande lona preta em forma de círculo. Ao empurrá-los para debaixo da lona, eles saíram de lá com frutas nas mãos – abóbora, abacaxi, melancia – que caracterizam a agricultura familiar.

Solidários X exploradores

“Nós trabalhamos com o princípio da solidariedade e não da exploração da mão de obra”, disse Lunas, afastando com veemência a tentativa da CNA de querer assumir a defesa dos interesses da agricultura familiar. Ela disse que a Contag luta contra a exploração, que vem desde o tempo indígena, e pelas leis de Deus, que diz que a terra é de todos.

Willian Matias, secretário de Política Agrária da Contag, também rechaçou as manobras dos ruralistas para acabarem com o MDA e concentrar todas as atividades no Ministério da Agricultura. “De lá nós já viemos e para lá não voltamos”, disse, lembrando que “esse ministério aqui existe a duras penas, pela morte dos nossos companheiros, que tombaram no Eldorado de Carajás, padre Josino, Raimundinho do Pará, Dorothy Stang, e que fortalece a existência do MDA e da reforma agrária”.

À tarde, nova manifestação foi feita em frente ao prédio do Ministério do Trabalho. Os trabalhadores, acampados ao lado do Teatro Nacional, saíram novamente em passeata pela Esplanada do Ministério, desta vez para denunciar a tentativa de criação de entidade sindical paralela de representação sindical. A Contag, que tem 50 anos de atuação na área, avalia que o divisionismo sindical no campo, encabeçada por uma representação do Centro Oeste, vai enfraquecer a luta.

Após a manifestação em frente ao Ministério do Trabalho, os trabalhadores e trabalhadoras rurais vão seguir em passeata até o Congresso Nacional. Os manifestantes vão cobrar dos parlamentares a aprovação de projetos importantes como a PEC contra o trabalho escravo e os que tratam da remuneração pela prestação de serviços ambientais, do enquadramento sindical, entre outros.

O encerramento das manifestações está previsto para às 18 horas, com ato político em frente ao Congresso Nacional, quando serão apresentadas as respostas do governo federal às reivindicações do Grito da Terra Brasil.

Falta assistência

No chão, os manifestantes repetiam o que as lideranças diziam no microfone no alto do carro de som. Possidônio Barbosa, 57 anos, agricultor no município de Muritiba (BA), que pela segunda vez participa do Grito da Terra, acredita que a manifestação ajuda muito no encaminhamentos das reivindicações do homem do campo. “Ajuda porque une todas as federações e sindicatos e dá força para pressionar”, afirma.

Ele manifesta preocupação principalmente com a solução para a falta de sistema de irrigação na sua região, queixando-se do agricultor ficar à mercê da natureza. Por isso, reclama uma maior atuação do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).

Outra manifestante, Maria José de Jesus Mota, 51 anos, presidente do Projeto de Assentamento (PA) Eloi Ferreira da Silva, em Diarinos (MG), também queixou-se de falta de assistência por parte do Incra. Ela, que está na área desde 2002, diz que o assentamento não possui infraestrutura. “As pessoas são obrigadas a andar quatro quilômetros até o centro urbano mais próximo porque o ônibus não passa na área porque não existe estrada”, exemplifica.

Em busca de resposta

Enquanto os trabalhadores se manifestavam nas ruas, as lideranças se reuniam com o Presidente Lula e os ministros Luis Dulci, da Secretaria-Geral da Presidência da República, e Guilherme Cassel, do Desenvolvimento Agrário. Eles foram receber a resposta do governo federal à pauta de reivindicações do movimento.

Os trabalhadores rurais reivindicam o atendimento de uma pauta de 223 itens que tratam de problemas emergenciais e estruturais no meio rural. Durante os últimos 10 dias, a categoria negociou com 18 ministérios, o que sinalizam para grandes avanços.

Na pauta de negociações, as prioridades são a liberação de R$13 milhões para investimento e custeio do Plano Safra 2004/2005; aprovação do projeto de previdência rural; políticas de combate à violência no campo, além do assentamento de 115 mil famílias por meio de reforma agrária até 2006.

Para o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Manoel Santos, a pauta "é uma espécie de projeto de desenvolvimento social para o campo, que precisa ser cumprido pelo Governo".

Ele já reafirmou o apoio ao presidente, mas lembra que a Contag não deixará de cumprir o seu papel. "Governo foi feito para governar e o movimento sindical para lutar. E isso nós não vamos deixar de fazer".

De Brasília
Márcia Xavier