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Wikileaks: EUA dizem que Nicarágua é financiada por tráfico

O governo dos Estados Unidos estava convicto de que os sandinistas da Nicarágua recebiam dinheiro de traficantes de drogas, de acordo com informações fornecidas sigilosamente pelo embaixador norte-americano em Manágua, Robert J. Callahan, e vazadas agora pelo site Wikileaks.

Segundo o jornal espanhol El País, os despachos da embaixada dos EUA na Nicarágua pintam um quadro de ilegalidade que a Casa Branca estaria desenhando no país da América Central, retratando-o como "um autêntico Estado criminoso financiado há muito por redes internacionais de tráfico de drogas".

Quatro documentos escritos entre 2006 e 2008 e republicados pelo jornal nesta segunda-feira (6) afirmam que, durante a campanha eleitoral de quatro anos atrás, quando o sandinista Daniel Ortega foi eleito, seu partido FSLN (Frente Sandinista de Libertação Nacional) teria recebido financiamento "do narcotráfico internacional" (sem especificar facções) em troca de que "os juízes sandinistas pusessem em liberdade traficantes capturados pela polícia e pelos militares". Três casos são citados, inclusive o de um candidato sandinista, Rigoberto Gonzalez Garbach, acusado por promotores de ter tentado suborná-los com 108,5 mil dólares para obter a libertação de um traficante.

Todas as acusações mencionadas são baseadas em relatos publicados na mídia nicaraguense, de conhecimento aberto, e dizem respeito aos dois períodos de governo sandinista (1979-1989 e de 2007 até hoje).

Na época das eleições, em 2006, o então embaixador (e antecessor de Callahan no cargo), Paul Trivelli, fez declarações públicas contra o então candidato Ortega, chegando mesmo a oferecer dinheiro para políticos de direita que conseguissem montar uma coalizão que impedisse a vitória sandinista. Ele também convenceu o Fundo para os Desafios do Milênio – fundação norte-americana então presidida por seu colega John Danilovich (ex-embaixador no Brasil) – a cortar 175 milhões de dólares a que a Nicarágua teria direito para combater a pobreza.

Elogio à ditadura

No ponto em que as críticas deixam transparecer os interesses que defendem, porém, as cartas diplomáticas – no despacho 63040, ítens 39 e 40 – se queixam de desapropriações feitas pelo governo sandinista na década de 1980 sobre empresas e dinheiro estrangeiro, especialmente "investidores internacionais da Espanha e dos EUA", trecho que o jornal espanhol omite.

Os despachos norte-americanos também trazem elogios às políticas econômicas nicaraguenses na época do ditador Anastasio Somoza, e afirma que a revolução sandinista de 1979 "destruiu o progresso que havia sido feito".

Diplomata ligado a militares nos EUA (atualmente, é conselheiro do Comando Sul), Trivelli tem perfil bem distinto de Callahan, um acadêmico com histórico de cargos como adido cultural e de imprensa nas embaixadas norte-americanas na Costa Rica, em Honduras, na Bolívia e na Grécia. Callahan trabalhou também como editor em editora universitária em Chicago e como catedrático de diplomacia pública na Universidade George Washington.

Venezuela

Os despachos enviados pelos dois embaixadores também trazem afirmações de que Ortega e a FSLN receberiam dinheiro clandestinamente do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, além da ajuda externa declarada e legalizada feita por meio da ALBA (Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América), grupo do qual a Nicarágua faz parte. Baseados em relatos de informantes, os diplomatas mesclam as doações públicas venezuelanas com suposto financiamento ilegal e chegam a se referir a Ortega como o "Mini-Me" de Chávez – uma alusão ao clone miniatura do vilão do filme Austin Powers: o agente Bond cama (despacho 153018, item 8).

"Temos relatos de que funcionários do governo nicaraguense recebem presentes de autoridades venezuelanas durante viagens oficiais a Caracas. Também achamos que Ortega retirou no ano passado sua exigência de que os Conselhos do Poder Popular sejam financiados com verbas públicas devido em parte ao fato de que o dinheiro venezuelano já havia chegado. Vários contatos nos disseram que Ortega utiliza dinheiro do petróleo venezuelano para financiar os Conselhos do Poder Popular e as campanhas das eleições municipais do FSLN", diz o despacho.

Junto às afirmações, os embaixadores dos EUA enviaram observações um tanto curiosas, como a afirmação de que Ortega estaria "completamente louco" e teria virado, ele próprio, "uma ameaça para o país", acreditando que "freiras velhas estão rezando pelo seu assassinato". Em outros despachos divulgados pelo Wikileaks, revelou-se também que o Departamento de Estado tinha solicitado investigações sobre "a saúde mental" da presidente da Argentina, Cristina Kirchner.

Fonte: Opera Mundi