Artigo: Um projeto para os bairros centrais da cidade de SP

No Seminário Rumos e Desafios para a cidade de São Paulo do PCdoB, realizado no dia 2/04 na Capital, apresentamos quatro projetos para superar problemas crônicos da cidade e que podem contribuir para o crescimento econômico e desenvolvimento urbano bem como o desenvolvimento humano de grandes parcelas da população paulistana. Neste artigo apresentamos o primeiro deles e algumas diretrizes para o seu enfrentamento.

*Por Rosana Helena Miranda

O eixo da antiga ferrovia São Paulo Railway, hoje da CPTM, construída pelos ingleses no século XIX para escoar o café produzido nas fazendas do interior de São Paulo para o Porto de Santos é um traçado que percorre vários bairros de São Paulo que hoje pertencem ao centro expandido e encontram-se num processo de degradação do espaço urbano, mas, que inclui uma grande vitalidade de pequenas indústrias disseminadas em espaços residenciais de forma clandestina muitas vezes, e que atendem a um comércio de grande dinâmica na área central.

Além disso, estes bairros concentram os edifícios da primeira faze da industrialização de São Paulo que se localizam vizinhos à ferrovia e às inúmeras vilas operárias construídas no final do século dezenove e início do século XX para atender a demanda de moradia da emergente classe operária de São Paulo.

Atualmente o uso desses bairros se modificou um pouco. As indústrias foram saindo em parte para outros municípios e o ABC passou a ter mais importância como área industrial paulista com a vinda da indústria automobilística para o Brasil e entrada do capital externo na década de 50. As vilas operárias deixaram de ser suficientes como moradias da classe operária que se deslocou para a periferia e para outros municípios, muitas delas hoje são escritórios, oficinas mecânicas e se transformaram em cortiços da área central. O trabalhador que nelas habita passou a ser em sua maioria o trabalhador do setor de serviços.

A ferrovia durante décadas foi “abandonada” como meio de transporte prioritário com a construção de rodovias e grandes vias urbanas que fortaleceram o transporte pelo meio rodoviário. Recentemente há um esforço de mudar esta lógica, pois a cidade não suporta mais o transporte sobre pneus devido aos grandes congestionamentos.

Esta região concentra um número significativo de edifícios do período da industrialização e que se constituem como patrimônio histórico a ser preservado como parte da história urbana de São Paulo com relação à sua importância como cidade industrial.

Este grande pedaço da cidade perdeu população moradora nas duas últimas décadas apesar de possuir infra-estrutura urbana já instalada. As distâncias entre as principais zonas de emprego da cidade e a periferia urbana onde se localizam os bairros populares aumentaram com os congestionamentos gigantescos que imobilizam a cidade. E nesse espaço da cidade encontramos infra-estrutura instalada e com grande potencial de transformação.

Portanto, está mais do que na hora de reocupar o “centro” de São Paulo que envolve um conjunto de bairros ao longo das duas margens da ferrovia e do Rio Tamanduateí, como a Mooca e o Cambuci, o Ipiranga, a Liberdade e o Brás, o Pari e a Luz, o Bom Retiro, a Barra Funda e a Santa Cecília, a Lapa de baixo.

A convivência de um projeto de renovação urbana dessa área deve estar baseada em quatro pilares: preservação das vilas operárias do início do século XX, dos edifícios industriais desse mesmo período com a sua reciclagem para outros usos, a remodelação do espaço urbano com a produção de equipamentos sociais e habitação em larga escala para diferentes faixas de renda, mas, prioritariamente habitação de interesse social e por último a recuperação do Rio Tamanduateí. A recuperação do centro passa pela recuperação do Rio Tamanduateí.

Algumas operações urbanas encontram-se em curso na Prefeitura de São Paulo, mas há um descompasso entre as ações dos órgãos governamentais que atuam na cidade. Falta uma integração das ações no campo da habitação, do patrimônio histórico, no planejamento urbano e de infra-estrutura e equipamentos públicos. Os setores ainda trabalham atomizados e desenvolvem seus projetos setorizadamente, desperdiçando energia e capacidade criativa e dificultando o desenvolvimento de projetos.

É necessária a unificação das equipes de projeto da Prefeitura para racionalizar os recursos técnicos disponíveis e fomentar a troca e entrosamentos das propostas em andamento e a unificação dos recursos públicos numa perspectiva de um esforço concentrado nas ações de caráter urbanístico. A experiência de Curitiba demonstrou que sucessivas gestões não conseguiram desmontar o acúmulo de conhecimento ao longo dos anos a partir do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba – IPPUC, criado na década de sessenta.

O envolvimento da juventude nos projetos de renovação e preservação do patrimônio seria de grande importância para reforçar o sentimento de pertencimento à cidade e seria um campo fértil para a geração de empregos e formação profissional na área de restauro e turismo, com a criação do programa “Oficina do jovem historiador”.

O conjunto de distritos que compõem estes bairros do centro expandido deveria formar o “perímetro de preservação do patrimônio da cidade de São Paulo” e de “renovação e desenvolvimento urbanos controlados”. A modificação da orla ferroviária é apenas um dos projetos inserido neste contexto.

*Arquiteta Rosana Helena Miranda
Profa. Dra. da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP.
Professora de Projetos de Edificações.