Cláudio Ferreira Lima: Como vai a dívida pública federal?
Quanto custa a dívida pública federal? Neste ano, serão R$ 954 bilhões, dos quais R$ 784 bilhões de amortizações e R$ 170 bilhões de juros. Quase R$ 1 trilhão! Como pagar?
Publicado 10/04/2011 01:23 | Editado 04/03/2020 16:31
A maior parte – R$ 678,5 bilhões – será “rolagem”, sem desembolso, apenas troca de títulos emitidos anteriormente por outros com vencimento para frente. O resto virá de nova emissão de títulos – R$ 143 bilhões – e do superávit primário – R$ 50 bilhões -, que, se não oferece o suficiente para fechar a conta, é o esforço possível para não prejudicar os setores econômico e social.
A conta é salgada (doce para apenas 80 mil brasileiros) mesmo para um estoque da dívida, em fevereiro último, de R$ 1,672 trilhão: R$ 1,586 trilhão de dívida interna e R$ 86 bilhões de externa. Pelo menos, esta última encolheu, diminuindo a vulnerabilidade do País às crises internacionais.
A questão passa pelo crivo do Senado Federal, que tem competência privativa para definir limites de endividamento e condições para contratação de operações de crédito dos entes federativos.
Essa dívida é sustentável? Em 2010, a relação dívida interna/PIB girou em torno de 50%, enquanto dívida externa total/exportações era de 0,97. Segundo Delfim Netto, esses números, para um país virtuoso, seriam, respectivamente, 30% e 1.
Na prática, há uma renegociação contínua em busca de juros menores e prazos mais longos. Porém, antes de fazer a dívida, caberia avaliar o retorno dela em termos socioeconômicos e de receitas públicas futuras. Um empréstimo para saneamento, ao evitar doenças, reduz despesas. Um outro para ampliar um porto, ao criar novos negócios, melhora a arrecadação.
Para John Kenneth Galbraith, há três tipos de gastos do governo: os sem nenhum propósito útil ou necessário; os relativos às operações atuais, diárias do governo; e os que têm por objetivo melhorar o futuro bem-estar e crescimento econômico ou que sirvam a esses fins. Apenas no terceiro deve-se recorrer ao endividamento. Daí, a regra de ouro, que veda cobrir despesas correntes com operações de crédito (Art. 167, III, da Constituição Federal), regulamentada pela Lei de Responsabilidade Fiscal (art. 32, § 3º).
Mas não é fácil avaliar os múltiplos e variados componentes da dívida federal. Como os programas de saneamento financeiro de Estados e Municípios e de fortalecimento dos bancos públicos federais. Ou como o carregamento das reservas e os aportes do Tesouro ao BNDES. São custos que trazem benefícios. Diferente da subida de uma taxa Selic já absurdamente elevada.
Estou com Amir Khair: “Baixando a Selic, caem rapidamente a despesa pública e o custo de carregamento das reservas e a apreciação do real deixa de ser tão agravada (…) pela atração dos capitais externos especulativos. Está na hora de fechar as portas do cassino financeiro e concentrar recursos para o desenvolvimento econômico e social”. A papa é quente: o “mercado” faz campanha pela alta da Selic; mas, com outros remédios contra a inflação, como a redução do crédito, o governo começa a comê-la pelas beiradas.
Cláudio Ferreira Lima é economista