Daniel Almeida: proibição de coligações é inaceitável

Em discurso na Câmara Federal nesta terça-feira (28/6), o deputado federal Daniel Almeida (PCdoB-BA) voltou a defender a manutenção das coligações proporcionais, a votação em lista fechada com pré-ordenamento e o financiamento público de campanha como questões fundamentais para que a reforma política, em tramitação no Congresso, garanta a ampliação da democracia no Brasil. Almeida integra a Comissão Especial da Reforma Política e tem participado da discussão do tema em vários estados.

A Reforma Política consiste em um conjunto de medidas e revisão da legislação eleitoral, com o objetivo de melhorar o sistema nacional de eleições e assim estabelecer maior correspondência entre a vontade do eleitor e o resultado final das urnas. “O tema, que vem atravessando legislaturas sem o devido equacionamento, consegue obter unanimidade entre os deputados e senadores como matéria a ser tratada com prioridade na pauta do Legislativo. No entanto, no decorrer dos anos e das sucessivas legislaturas, mudanças pontuais não chegaram a afetar o quadro de modo significativo”, lembrou.

Para o parlamentar baiano, o principal motivo para a demora do Legislativo na discussão da questão está na dificuldade em alcançar consenso nos pontos principais da matéria. “As divergências dizem respeito às coligações partidárias, financiamento público, voto universal, distrital ou distrital misto, fidelidade partidária, cláusula de barreira, quociente eleitoral, reeleição, lista fechada, candidatura avulsa, propaganda eleitoral, cotas, voto facultativo, suplência, coincidência na realização das eleições gerais para todos os cargos. Ou seja, existem mais divergências que consensos em torno do tema”, acrescentou.

“Desde meados de 1990, a articulação de uma ampla reforma política tem constado da agenda nacional. Contudo, em termos de mudanças significativas, podemos citar apenas duas: a aprovação, em 1997, da reeleição e a definição, em 2010, da fidelidade partidária pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), decisão ratificada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), estabelecendo que o mandato pertence à agremiação partidária e não ao político. São de citar ainda a tentativa de instituição da cláusula de barreira — e que entraria em vigor em 2007, mas foi declarada inconstitucional — e a aprovação da Lei da Ficha Limpa em 2010, cuja aplicação só ocorrerá a partir das eleições de 2012, em decorrência do julgamento no STF”, disse o comunista.

Coligações partidárias

Daniel Almeida lamentou ainda o fato da Câmara e o Senado terem criado comissões separadas para elaboração das propostas de reforma. “Essa postura, a meu ver, é contraproducente, pois divide o debate e, posteriormente, implicará a busca de meio termo entre os dois resultados. Por evidente, uma única Comissão Mista venceria mais etapas em menos tempo, assim agilizando os trabalhos”.

O parlamentar defendeu a necessidade de uma reforma política séria, abrangente e equilibrada e que não configure um ataque à democracia. “ Muitas das discussões empreendidas em torno dessa importante reforma se ativeram aos interesses dos partidos majoritários, como, por exemplo, a cláusula de barreira e o voto distrital. Neste, a justificativa de solução para a representatividade no Poder Legislativo; naquela, a limitação imposta aos partidos pequenos, responsabilizados pela deformação do sistema político brasileiro. Em ambos os casos, o substrato da força do poder econômico se disfarçava em torno do tema. Atualmente, discute-se o fim das coligações partidárias, o que constitui verdadeiro absurdo, especialmente se for mantido o cálculo do quociente eleitoral, principal obstáculo à constituição de representação de pequenos partidos”.

“Embora o instituto da coligação possa representar a possibilidade de unidade entre grupos políticos com afinidades – como é o caso do PCdoB e do PT, que desde 1989 tem aliança nacional -, o quociente eleitoral pode forçar os partidos políticos pequenos e médios a se unirem apenas por uma questão de sobrevivência. De fato, foi a faculdade de se coligarem que abriu espaço na cena política nacional a esses partidos, solapando a hegemonia de três ou quatro grandes legendas no Congresso Nacional. Sem as coligações proporcionais, em pelo menos 19 Estados, as pequenas agremiações partidárias não conseguiriam eleger Deputados, uma vez que a exigência, em 2010, revelou-se maior que a própria cláusula de barreira de 5% anteriormente prevista em lei”, informou Almeida.

Em sendo assim, continuou o parlamentar baiano, “o PCdoB perderia um terço de sua bancada atual, enquanto o PMDB ganharia mais 31 deputados e o PT mais 20 deputados. Nesse caso, esses dois partidos alcançariam 215 cadeiras na Câmara (42,3% do total) da composição desta Casa, enquanto seis dos 22 partidos com representação na Casa não sobreviveriam. Essa possibilidade, em vez de aperfeiçoar a democracia, significa excluir do debate político nacional as correntes de pensamento minoritárias, deixando sobreviver apenas os grandes partidos que, apesar de legítimos, não representam todos os segmentos da sociedade brasileira”.

Retrocesso inaceitável

“Impor o fim da possibilidade de coligações é, maneira transversa, recuperar a cláusula de
barreira, já derrotada no Supremo Tribunal Federal. Seria como encontrar o velho “jeitinho”, para chegar ao fim errado por uma maneira torta. E isso não é correto de forma alguma, sendo ainda mais grave em um Parlamento que é o espaço diverso e da democracia”, ressaltou, acrescentando que o fim das coligações não afeta só os partidos pequenos. “Há muitos estados que têm nesta Casa uma representação de 8 deputados, nós necessitaríamos de mais de 12% para alcançar o quociente eleitoral, e isso deixaria de fora, em muitos estados, partidos como o PMDB, o PR, o PSDB, o DEM e tantos outros partidos considerados grandes”.

Para Almeida, ao fim e ao cabo, quanto ao fortalecimento dos partidos menores, o pano de fundo da proposta de eliminação da coligação proporcional é a tentativa de congelar a situação atual dos maiores partidos, permitindo-lhes a reconquista das vagas perdidas nos últimos anos e impedindo os demais de crescer. “Tais debates enviesados acabam impedindo o avanço da reforma, ainda que, nos dias atuais, aparentemente haja interesse em promovê-la”.

“O PCdoB, partido ao qual tenho a honra de participar, tem real compromisso com o país e com a esperada reforma política, empenhando seus representantes na Câmara e no Senado em gerar uma proposta que se traduza em maior grau de democracia, mais liberdade partidária, mais opções para o eleitorado e mais controle sobre o sistema eleitoral. Para o partido, uma reforma política eficiente não pode prescindir de abrir as portas da política para todos os setores da sociedade, garantindo a representação das minorias e a igualdade de oportunidades para todos os partidos. Ao mesmo tempo, essa reforma deve oferecer mais opções ao livre voto dos eleitores e também fortalecer os partidos políticos como atores fundamentais no processo de democracia e de disputa política”, disse Almeida.

De modo geral, acrescenta, “defendemos alguns pontos considerados fundamentais, como o financiamento público exclusivo das campanhas eleitorais, que inibe o processo de manipulação do poder econômico, que tem interferido nesse ambiente. Lado a lado, defendemos a lista preordenada como um mecanismo eficiente para o fortalecimento dos partidos e para facilitar o controle da fiscalização, evitando, assim, a manipulação do poder econômico associado à manutenção e à ampliação da fidelidade partidária. O PCdoB permanece na luta contra a proposta de fatiamento da votação da reforma, uma vez que, sob a justificativa de imprimir celeridade ao votar os pontos de consenso, corre-se o risco de incluir pontos de não tão consenso assim e comprometer todo o processo da reforma política”.

“O país não suporta mais esperar por uma reforma política que, de fato, amplie a democracia, acabe com a judicialização das eleições, hoje regidas por normas dos tribunais e não por regras previstas e definidas no Poder Legislativo, e que garanta ao eleitor o direito de votar sem as amarras do poder econômico e da mídia, que tenta nos impor certos comportamentos. Claramente posicionado contra a cláusula de barreira, o voto distrital e o fim das coligações partidárias — instrumentos a serviço dos grandes partidos, para o encolhimento do número de legendas no Congresso e consequente imposição da hegemonia —, o PCdoB não pode concordar com a instituição de regras que venham limitar a livre manifestação, organização e funcionamento dos partidos, bem como interferir na vontade do cidadão, no exercício de seu direito de escolher seus representantes”, concluiu.

De Salvador,
Eliane Costa