Uma Conferência para entrar na história do PCdoB

A Conferência Estadual realizada pelo PCdoB na Bahia no último final de semana (5 e 6) é destaque na história do Partido. Não apenas pelo grande número de participantes e pessoas mobilizadas nas etapas preparatórias ou pela presença de lideranças de outros partidos, mas pelo fato de ser o primeiro evento partidário transmitido ao vivo pela internet. Isso não é pouco, levando-se em conta que o PCdoB passou a maior parte de seus 89 anos na clandestinidade, fazendo reuniões secretas.

Conferência Estadual

Engana-se quem acha que já se passou muito tempo desde que o partido ganhou a legalidade. Até 1985 o PCdoB era ilegal. “Até 1979 era clandestino e constituía crime contra a segurança nacional participar de partido proibido. O fato de uma pessoa ser flagrada ou se dizer membro do PCdoB durante a década de 70, significava, só por isso, uma penalidade “jurídica” de três anos de prisão. Quer dizer, se você se declarasse membro do PCdoB de cara já era três anos de prisão, por esse “crime” de ser organizado em um partido político. Só os partidos aceitos pela ditadura poderiam ter seus filiados”, explicou Péricles de Souza, um dos mais antigos integrantes do PCdoB na Bahia.

Souza lembra que era um período de atuação na clandestinidade sob cerco da repressão política, sob perseguição, fazendo reuniões numericamente pequenas, escondidas, com sistema de segurança para proteger o encontro, isso até a anistia. “Decretada a anistia, em 1979, o partido passa a funcionar, ainda ilegal, mas sem grande perseguição política. Já tava um processo de democratização em curso e o partido ia se sentindo mais a vontade. Então, as reuniões eram mais numerosas, nós fizemos aqui na Bahia uma campanha pela legalidade do PCdoB. O maior de todos os eventos aconteceu no ICEIA, no Barbalho, e contou com a presença de muita gente para época, o auditório com 1.200 lugares ficou lotado, com muitas delegações do interior e a presença de personalidades, dirigentes políticos, parlamentares, que foram apoiar a campanha pela legalização do PCdoB”.

A campanha durou até 1985, quando o partido foi legalizado. Daí em diante as reuniões eram abertas, legais, as vezes com a presença de representantes do Tribunal Eleitoral. Para ser ter a ideia do pouco tempo que se passou desde a legalização basta lembrar que em 2009 o PCdoB realizou o seu 12º Congresso Nacional com a mobilização de milhares de pessoas, mas que o 6º Congresso, em 1982, foi na ilegalidade. “O 6º Congresso foi uma reunião em uma residência, em São Paulo, com a presença de cerca de 30 pessoas. Com representantes de quase todos os estados, mas uma reunião pequenininha. Naquela época, nós devemos ter movimentado, no esforço de mobilização do Congresso, nada mais que mil pessoas em reuniões clandestinas”, diz Péricles de Souza.

Militantes baianos

“Na Bahia, até 1985, as conferências eram em locais discretos, com poucas pessoas participando, com segurança montada e cuidados, com os locais não sendo do conhecimento das pessoas que iam. As pessoas eram levadas para os locais de cabeça baixa ou de olhos fechados para não saber o local, ou queimava o local, como se dizia na época. Uma dessas conferências foi feita no apartamento de uma pessoa amiga no bairro da Vitória, outra em um convento de freiras, sempre locais assim, o que despistava bastante”, destacou Souza.

Haroldo Lima, que ingressou no PCdoB na mesma época que Péricles de Souza, também lembra de como era difícil ser comunista. “O PCdoB da década de 70, era o PCdoB da clandestinidade, da Guerrilha do Araguaia, que custou a vida de muitos militantes. Em 1976, o partido levou outro duro golpe, com o assassinato de três dirigentes e a prisão e perseguição de muitos outros, como foi o meu caso, o de Wladimir Pomar e Aldo Arantes”, destaca.

“A partir de 1979, com a anistia, começa o processo de ascensão lenta do PCdoB, que vem transcorrendo durante até o momento em que a gente passa a legalidade, em 1985. É o momento em que a gente passa a eleger deputados na própria legenda do PCdoB e começa a crescer o partido, embora lentamente. Quando chega o governo de Lula, em 2002, a partir daí a gente começa a ter um crescimento mais ascendente. Passamos a eleger um número maior de deputados, prefeitos e vereadores e chegamos hoje a cerca de 100 candidatos a prefeitos apenas na Bahia”, comemora o dirigente do PCdoB.

Assim como Péricles e Haroldo, muitos outros comunistas presentes à Conferência da Bahia devem ter se lembrado dos tempos difíceis da clandestinidade e comemorado o fato de estarem participado também do crescimento do partido. “Hoje tudo é feito em locais abertos, com muita gente, com a participação aberta e cobertura de imprensa. Antes eram encontros perseguidos, escondidos e tensos. Não passava pela nossa cabeça que agora estaríamos anunciando os encontros na imprensa, com ampla divulgação e transmissão pela internet para o mundo inteiro”, concluiu Péricles de Souza.

De Salvador,
Eliane Costa.