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Operários nos canteiros de obras exigem contrato coletivo

Alavancado por políticas públicas como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o Minha Casa, Minha Vida e as sucessivas desonerações de impostos, o ramo da construção cresceu aproximadamente 12% em 2011 e tem sido o carro-chefe na criação de empregos – 2,8 milhões até outubro. As empresas vêm nadando de braçada e registram altíssimas taxas de produtividade, que se reproduzem em resultados mais do que positivos nos seus lucros.

Por Leonardo Wexell Severo, de Curtiba (PR)

Com a proximidade da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas em 2016, sindicalistas têm se mobilizado para garantir a sua fatia do bolo, a fim de que não se repitam no país os abusos praticados na Copa da África do Sul, onde 26 greves precisaram ser realizadas para garantir empregos e salários dignos. Para tanto, a Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção e da Madeira (Conticom/ CUT) defende a organização no local de trabalho, o combate às práticas antissindicais e iniciativas como a do compromisso nacional da construção, que vincula a participação em licitações públicas a um selo obrigatório.

Os operários brasileiros lembram que embora a maior parte dos investimentos esteja sendo financiada com o seu próprio dinheiro – do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) –, isso não tem se traduzido em melhorias concretas nas suas condições de vida e trabalho. Longe disso, muitas empreiteiras contratadas para gerir obras públicas como a do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), maior obra já realizada pela Petrobrás – que é parte do PAC – têm abusado. No Comperj, o “consórcio da picaretagem” passou por cima do acordo firmado no Tribunal Regional do Trabalho e demitiu, de forma arbitrária e discriminatória, 37 trabalhadores, incluindo todos os nove integrantes da Comissão de Negociação.

Na mesma toada truculenta, em Volta Redonda (RJ), a Odebrecht radicaliza. Confiando na impunidade, a empresa anunciou no final de outubro a demissão de 80 operários que trabalhavam na ampliação da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), entre eles 10 integrantes da Comissão de Negociação.

Em Minas Gerais, no município de Divinópolis, a Cotemil, empresa reincidente nas transgressões, mantinha num motel abandonado 56 operários em condições análogas à escravidão. A obra em que trabalhavam era do Minha Casa Minha Vida, onde “alguns chegavam a usar tijolos como travesseiros”, conforme revelou o auditor fiscal Vicente Fidélis, coordenador da ação.

Diante de tantos e tão flagrantes achincalhes à legislação social e trabalhista, patrocinados com recursos públicos – o que só agrava o problema –, a Conticom/CUT lidera mobilização pelo estabelecimento de um Contrato Coletivo Nacional para o setor.

Audiência

No dia 29 de novembro, com a presença de dezenas de lideranças sindicais, a Audiência Pública Copa 2014 e os trabalhadores, realizada na Câmara Municipal de Curitiba, defendeu o Contrato como forma de assegurar “condições equânimes de salários e benefícios”.

Entre os pontos da Carta de Curitiba, ressaltou o vice-presidente da Conticom/CUT, Luiz Carlos de Queiroz, encontram-se as seguintes reivindicações: pisos salariais unificados; cesta básica de R$ 300; Participação nos Lucros e Resultados (PLR) de dois salários-base; plano de saúde extensivo a seus familiares; hora-extra de 80% de segunda a sexta-feira; 100% aos sábados; e 150% aos domingos e feriados; garantia de organização por local de trabalho; adicional noturno de 50%; folga familiar de 5 dias úteis a cada 60 dias trabalhados; implantação de melhores condições de saúde e trabalho nas frentes de serviço; e contrato de experiência de 30 dias. A pauta pode ser encarada até como modesta diante do tamanho dos benefícios ofertados pelo governo às empresas do setor.

Ao mesmo tempo em que o presidente estadual da Central Única dos Trabalhadores (CUT-PR), o petroleiro Roni Barbosa, lia o documento, enfatizando que “as maiores dificuldades são as condições precárias de trabalho, envolvendo principalmente a segurança”, o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil de Curitiba (Sintracon) era informado de mais um acidente. O mestre de obras Nelson de Jesus Freitas, de 48 anos, operário da empreiteira G. Ferdinandi Construção e Incorporação Ltda, a serviço da empresa Casa Alta, foi atingido na cabeça por um bloco de sete quilos que despencou do alto do prédio em construção.

De acordo com o vereador Pedro Paulo (PT), presidente da Comissão que trata das obras da Copa na capital paranaense, a realização da audiência, com a participação da Secretaria Municipal Extraordinária da Copa 2014, representou uma excelente oportunidade para “enfrentar os desafios colocados pela conjuntura, onde a participação da sociedade é essencial para tornar mais efetivos e produtivos estes investimentos públicos, feitos com o dinheiro do trabalhador”. Ao todo, explicou, Curitiba receberá cerca de R$ 232 milhões do governo federal para tocar cinco projetos que dotarão a cidade das condições necessárias à realização dos jogos.

Fiscalização

O secretário-geral do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Pesada do Paraná (Sintrapav), Raimundo Ribeiro Santos Filho (Bahia) lembrou que mesmo antes dos megaempreendimentos, “em Curitiba nós já estamos enfrentando problemas com alojamentos em condições desumanas, barracões precários, sem alimentação e estrutura sanitária”. “Temos inúmeros casos de empresas que atrasam o pagamento e descumprem os instrumentos normativos. Agora que vai haver esta injeção de recursos públicos, nada mais justo do que assegurar contrapartidas sociais, pois as obras estão sendo feitas com o nosso dinheiro”, acrescentou Bahia.

Para o presidente do Sintracon, Domingos Oliveira Davide, “a fiscalização é fundamental para dar um basta na superexploração”. “Temos tido o apoio dos auditores fiscais do trabalho, mas é necessário que os governos federal, estadual e municipal ampliem as contratações e ajam com mais rigor no combate à impunidade. Um dia desses tivemos um problema e quando o auditor chegou na obra, ela já havia sido concluída. É dinheiro público do FGTS o que está sendo investido e não é justo que ele não retorne como salário digno e emprego decente”, enfatizou.

Na avaliação de Antonio Lemos do Prado, presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Montagem Industrial do Paraná (Sindimont), que congrega soldadores, encanadores e montadores de andaime, entre outros, é preciso fechar espaço para a terceirização e a quarteirização que são sinônimos de precarização. “São empresas rotatórias, onde o trabalhador está sempre sendo penalizado com a perda de direitos, pois quando a fiscalização chega, a empresa picareta já foi”, explicou.

Fonte: Brasil de Fato