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Kotscho: os homens da lei que se achavam acima da lei

Alguns togados ainda se mostram surpresos e inconformados com o que está acontecendo. E reagem com ira a cada nova denúncia sobre as suas atividades pouco republicanas, agora tornadas públicas, ameaçando processar jornais e jornalistas.

Por Ricardo Kotscho, no blog Balaio do Kotscho

Habituados a julgar os outros, certos da impunidade eterna de seres superiores, simplesmente não aceitam também ser investigados e julgados, a partir das iniciativas da ministra Eliana Calmon, que simplesmente colocou para funcionar a corregedoria do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e fazer o que sempre deveria ter feito.

Ao levantar o véu (ou as togas) da magistratura, Calmon mexeu num vespeiro. A cada dia surgem novas notícias de abusos, privilégios, benefícios pagos indevidamente, obrigando os próprios tribunais estaduais a tomar providências.

Esta semana, por exemplo, o Tribunal de Justiça de São Paulo mandou suspender o pagamento de verbas ilegais pagas a desembargadores a título de licença-prêmio.

Juízes indicados pela OAB na cota do quinto constitucional para compor as cortes estavam contando o tempo de exercício da advocacia para calcular o valor das licenças-prêmio a que os magistrados têm direito.

Só que tem um pequeno detalhe: na mesma decisão, o TJ-SP isentou os magistrados da obrigação de devolverem o dinheiro recebido ilegalmente durante anos -o nosso dinheiro, é bom lembrar- alegando que eles agiram de "boa-fé".

Como assim? Se por acaso a Receita Federal me pagar um valor de devolução de imposto de renda superior ao que teria direito, posso simplesmente embolsar a grana? Ou devo comunicar o erro e reembolsar o Tesouro Nacional?

Da mesma forma, o leitor acha justo que os homens da lei que recebem o teto salarial do funcionalismo público, algo em torno de R$ 26 mil por mês, tenham agora também direito a receber vale-refeição – e ainda por cima com efeito retroativo?

Este vale, assim como o vale-transporte, foi criado para complementar a remuneração de trabalhadores de baixa renda, assim como o auxílio-moradia é pago para o funcionário público deslocado da sua cidade de origem.

No caso dos 300 e tantos desembargadores de São Paulo, que trabalham no Tribunal de Justiça de São Paulo e moram em São Paulo, que sentido faz o pagamento de auxílio-moradia?

Para que eles precisam de vales disso e daquilo com o salário que recebem? Chegam a ser humilhantes estes penduricalhos que aumentam a renda de quem já está no topo da pirâmide social.

A cada enxadada que dá a corregedora-geral Eliana Calmon, aparecem mais minhocas que estavam postas em sossego sob o solo dos tribunais, colocando em risco a imagem do nosso Judiciário, que deveria dar o exemplo do cumprimento da lei, teoricamente igual para todos, e do zelo com o dinheiro público.

Fonte: Adital