Perpétua Almeida: Reconhecendo Chávez 

Como presidenta da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, integrei o grupo de autoridades brasileiras que participou das homenagens ao presidente Hugo Chávez, em Caracas, junto à presidenta Dilma Roussef, o ex-presidente Lula, ministros e governadores.

Por Perpétua Almeida*

O presidente Chávez construiu, ao longo de 14 anos de poder, laços emocionais com líderes políticos em todo o mundo. Destacou-se como comandante de uma revolução que priorizou a inclusão social e voltou-se aos mais pobres, mais humildes. A dor de todos os venezuelanos dá a verdadeira dimensão do significado do presidente Chávez para a Venezuela e sua importância para a América Latina, especialmente a nossa região.

Antes do presidente Hugo Chávez e da sua revolução bolivariana, a Venezuela oscilava de ilustre desconhecida a estereotipado país produtor de petróleo e criadouro de ditadores de direita, com uma minoria economicamente dominante e uma massa miserável e sem perspectiva.

Trezentas famílias se locupletavam com os lucros da exploração privatizada do petróleo, enquanto o restante da população se equilibrava na corda bamba da falta de empregos, habitações, saúde e educação, agravada por uma inflação de 40% ao mês.

O presidente Chávez mudou tudo! Sua celebre frase, "Por ahora’’, proferida logo ao assumir seu primeiro mandato, já mostrava a urgência das ações que iniciou logo ao assumir, para se contrapor aos séculos de exploração a que estava submetido o povo venezuelano.

Erradicou o analfabetismo, executou um importante programa de habitação popular, levou saúde e dignidade aos pobres. Programas semelhantes aos adotados no Brasil permitiram o acesso das camadas mais carentes aos serviços públicos e à aquisição de bens de consumo. Atualmente, o salário mínimo no país equivale a R$ 1.500. A Venezuela – pasmem (a grande mídia não divulga isso) – é hoje o país menos desigual da América do Sul. A inflação está 16 pontos percentuais abaixo do índice registrado quando o presidente Chávez assumiu e implementou diversas medidas de controle da economia.

Isso tudo explica a adoração do povo pelo seu líder. Isto, talvez, também explique porque uma enfermeira esperou 24 horas na fila para ver o corpo do seu presidente. Isso tudo explica também a frase da presidenta Dilma, ao receber a notícia da morte de seu amigo: "é uma perda irreparável".

Nem sei dizer o que mais me tocou, se a população nas ruas que chorava inconformada, ou se a multidão que formava filas quilométricas na tentativa de se aproximar do caixão. Emocionada, deixei minhas lágrimas se misturarem às das pessoas simples, que choravam a morte de seu líder. À frente do caixão, registrei na memória cenas de amor incondicional, como a continência dos homens, civis e militares. O sinal da cruz, das mulheres que buscavam na religiosidade um meio de encaminhar o presidente morto a um destino superior. O guarda que, incansável, erguia as crianças para que pudessem visualizar a face do presidente e a conversa das idosas ao lado do caixão. Era como se ele continuasse a se comunicar com o seu povo.

Finalmente entendi o motivo da frase dita em uníssono por garçons, arrumadeiras do hotel, taxistas, estudantes e todo o tipo de gente: "Vamos dar continuidade ao projeto de Chávez’’, e da frase escrita nas janelas das casas e nos carros: "Agora é quando sou Chávez’’.

O grande legado do presidente Chávez pode ser o despertar da América do Sul para a possibilidade de um novo jeito de caminhar, baseado na coletivização das riquezas e no intercâmbio com os países vizinhos. Chávez foi uma bússola que desafiou o império e deixou de apontar para o Norte, marcando um caminho de independência e solidariedade.

Como lembrou a presidenta da Argentina, Cristina Kirchner: "Bolívar, o ídolo de Chávez, foi um libertador de povos. Hugo Chávez foi um libertador de mentes”.

O Brasil precisa continuar irmanado à Venezuela. Parceiro, para que possamos levar em frente o que o Chávez desejava – "Adelante América del Sur’’.

*Deputada federal pelo PCdoB do Acre e presidenta da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados.