Amigos de estudante assassinado pedem retratação de jornal

Os amigos do estudante Itamar Ferreira, assassinado no último dia 13, em Salvador, criaram uma abaixo-assinado online para pedir uma retratação ao jornal impresso baiano *Correio, que acompanhou o caso e é acusado de fazer uma cobertura preconceituosa. Na edição do dia 15, uma manchete do periódico destacou: “Sexo Grupal atraiu aluno da UFBA para emboscada”.

A versão apresentada pelo jornal foi dada pela delegada que cuida das investigações, Simone Coutinho, titular da 3ª Delegacia de Homicídios da capital baiana. A conclusão da polícia foi feita apenas com as declarações dos acusados, que já estavam presos, e sem antes ouvir o amigo de Itamar, Edmilson Oliveira, que sobreviveu à tentativa de homicídio.

“O título sintetizou o ápice da irresponsabilidade construída por uma série de reportagens publicadas por esse veículo após o homicídio praticado contra nosso amigo Itamar Ferreira. Irresponsabilidade que teve como saldo a construção de um discurso que transformou a vítima em algoz, ofendendo sua honra e memória e corroborando para que novos homossexuais sejam assassinados no país”, diz o abaixo-assinado, que já conta com 750 assinaturas.

Os professores de Itamar, que era aluno do curso de Produção Cultural da Universidade Federal da Bahia (UFBA), também criticaram a maneira com que os jornais buscam “soluções” para os casos. Através da sua página no facebook, o professor Wilson Gomes escreveu:

“Delegados de polícia, jornalistas, e comentaristas dos fatos da vida nos jornais e em mídias sociais estão especializados em estabelecer e descartar causas de crimes. (…) Causas são coisas tão complicadas em Filosofia, que a Física de Aristóteles inventou uma teoria das quatro causas (material, eficiente, formal e final) que nos quebra a cabeça até hoje”, destacou.

Ele ainda completa:

“Podemos brincar de achar e descartar causas (“causas” são de tantos tipos mesmos, não é Aristóteles?), principalmente as causas que não nos incomodem e impliquem, aquelas que afetem apenas vítima e assassino e os isolem de nós. (…) A vítima foi quem assumiu o comportamento de risco e o assassino é um louco que não tem nada a ver comigo”.

Delegada denunciada

Por conta das declarações dadas ao jornal, a delegada Simone Coutinho foi denunciada à Corregedoria Geral da Secretaria de Segurança Pública do Estado (SSPB-BA) e da Polícia Civil (PC-BA), pelo Grupo Gay da Bahia (GGB). Em nota, a entidade disse que quer que sejam apuradas as responsabilidades pelas informações prestadas ao *Correio.

“O GGB acredita que a delegada foi muito infeliz em suas declarações e a divulgação ampla das mesmas constitui uma nódoa à honra do estudante assassinado, à sua família e à honra da vitima sobrevivente ao ataque”, diz a nota.

O Caso

O corpo de Itamar foi encontrado boiando em uma fonte da Praça do Campo Grande, no Centro de Salvador, com a bermuda abaixada até o joelho. No momento do assassinato, ele estava acompanhado de Edmilson, que conseguiu sobreviver e foi levado ao Hospital Geral do Estado (HGE).

Segundo os familiares, o estudante levava equipamentos eletrônicos na mochila que não foram encontrados. Por conta disso, a polícia acredita que o caso se trata de um latrocínio (roubo seguido de morte), descartando que a motivação seja homofobia, o que é contestado pelos parentes e ativistas da causa LBGT.

O jornal

O *Correio, antigo Correio da Bahia, faz parte da Rede Bahia de Comunicação, que é de propriedade da família Magalhães, do ex-senador Antônio Carlos Magalhães, morto em 2007, e do atual prefeito de Salvador, ACM Neto. O jornal passou por uma reformulação em 2008 e, no ano passado, se tornou o impresso mais vendido em toda a região Nordeste.

De Salvador,
Erikson Walla